“Se você não sabe para onde quer ir, qualquer caminho serve”, escreveu Lewis Carroll, professor de Oxford, em "Alice no País das Maravilhas". Embora pertencente ao universo de um clássico infantil, a frase captura bem um dilema do desenvolvimento regional: comunidades que não definem para onde querem ir acabam aceitando qualquer caminho — e raramente chegam aonde desejam. Em economias locais, a ausência de direção não é apenas um risco conceitual. É um problema prático, cotidiano, que pode resultar em décadas de estagnação.
O Espírito Santo conhece bem esse desafio. Somos o quinto estado no IDH nacional, referência em gestão fiscal há mais de uma década, com bons indicadores de educação e infraestrutura. Mas esses números médios escondem um mosaico de realidades que pouco dialogam entre si.
Vitória alcança níveis de desenvolvimento comparáveis aos de Portugal; outros municípios permanecem em patamares próximos aos de economias africanas de renda média. E mesmo dentro das cidades, bairros e distritos reproduzem essas distâncias de forma ainda mais aguda. A prosperidade capixaba, vista de perto, revela-se fragmentada.
Um caso recente ajuda a pensar caminhos possíveis. No último fim de semana, em Guaraná, distrito de Aracruz, moradores, lideranças comunitárias, empresários e representantes públicos se reuniram na secretaria paroquial para discutir o futuro do território. Antes de esperar por ações do poder público, escolheram refletir sobre que potencialidades já possuem, que oportunidades enxergam para o futuro e como poderiam estruturar um plano de desenvolvimento para avançar.
A experiência ensina algumas coisas. Um plano de desenvolvimento local funciona menos como documento técnico e mais como espaço de construção de consensos mínimos sobre vocações, limites e prioridades do território. Além disso, cria uma plataforma objetiva para dialogar com investidores, que precisam de previsibilidade, e com gestores públicos, que lidam com múltiplas demandas simultâneas. Comunidades organizadas facilitam esse diálogo e ampliam sua capacidade de influenciar a agenda.
Todo plano, porém, enfrenta dois riscos. O primeiro é a tentação de listar todas as necessidades — estrada, escola, posto de saúde, saneamento — transformando o documento em catálogo de intenções sem hierarquia. O segundo é a ausência de governança: sem definir quem acompanha, executa e financia, até boas ideias se dissolvem no tempo. Foco e simplicidade não são virtudes acessórias; são condições de sobrevivência da iniciativa.
O caso de Guaraná sugere que desenvolvimento local não começa com grandes obras ou anúncios de investimento, mas com a decisão coletiva de organizar a conversa certa. Lewis Carroll, que ensinou Alice a pensar antes de avançar, talvez acrescentasse que o mais difícil não é caminhar, mas escolher a direção — e dar o primeiro passo. Para os distritos capixabas que desejam crescer, a lição segue atual: planejar é importante, mas só transforma quando alguém assume a responsabilidade de começar.
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