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É economista, mestre pela Universidade de Oxford, professor na Fucape Business School e auditor de Finanças na Sefaz/ES

Como nasce o desenvolvimento local? O caso de Guaraná, em Aracruz

A experiência ensina algumas coisas. Um plano de desenvolvimento local funciona menos como documento técnico e mais como espaço de construção de consensos mínimos sobre vocações, limites e prioridades do território

  • Eduardo Araújo É economista, mestre pela Universidade de Oxford, professor na Fucape Business School e auditor de Finanças na Sefaz/ES
Publicado em 03/12/2025 às 15h00

“Se você não sabe para onde quer ir, qualquer caminho serve”, escreveu Lewis Carroll, professor de Oxford, em "Alice no País das Maravilhas". Embora pertencente ao universo de um clássico infantil, a frase captura bem um dilema do desenvolvimento regional: comunidades que não definem para onde querem ir acabam aceitando qualquer caminho — e raramente chegam aonde desejam. Em economias locais, a ausência de direção não é apenas um risco conceitual. É um problema prático, cotidiano, que pode resultar em décadas de estagnação.

O Espírito Santo conhece bem esse desafio. Somos o quinto estado no IDH nacional, referência em gestão fiscal há mais de uma década, com bons indicadores de educação e infraestrutura. Mas esses números médios escondem um mosaico de realidades que pouco dialogam entre si.

Vitória alcança níveis de desenvolvimento comparáveis aos de Portugal; outros municípios permanecem em patamares próximos aos de economias africanas de renda média. E mesmo dentro das cidades, bairros e distritos reproduzem essas distâncias de forma ainda mais aguda. A prosperidade capixaba, vista de perto, revela-se fragmentada.

Um caso recente ajuda a pensar caminhos possíveis. No último fim de semana, em Guaraná, distrito de Aracruz, moradores, lideranças comunitárias, empresários e representantes públicos se reuniram na secretaria paroquial para discutir o futuro do território. Antes de esperar por ações do poder público, escolheram refletir sobre que potencialidades já possuem, que oportunidades enxergam para o futuro e como poderiam estruturar um plano de desenvolvimento para avançar.

A experiência ensina algumas coisas. Um plano de desenvolvimento local funciona menos como documento técnico e mais como espaço de construção de consensos mínimos sobre vocações, limites e prioridades do território. Além disso, cria uma plataforma objetiva para dialogar com investidores, que precisam de previsibilidade, e com gestores públicos, que lidam com múltiplas demandas simultâneas. Comunidades organizadas facilitam esse diálogo e ampliam sua capacidade de influenciar a agenda.

Paróquia Coração Eucarístico de Jesus, em Guaraná, distrito de Aracruz
Paróquia Coração Eucarístico de Jesus, em Guaraná, distrito de Aracruz. Crédito: Google Street View

Todo plano, porém, enfrenta dois riscos. O primeiro é a tentação de listar todas as necessidades — estrada, escola, posto de saúde, saneamento — transformando o documento em catálogo de intenções sem hierarquia. O segundo é a ausência de governança: sem definir quem acompanha, executa e financia, até boas ideias se dissolvem no tempo. Foco e simplicidade não são virtudes acessórias; são condições de sobrevivência da iniciativa.

O caso de Guaraná sugere que desenvolvimento local não começa com grandes obras ou anúncios de investimento, mas com a decisão coletiva de organizar a conversa certa. Lewis Carroll, que ensinou Alice a pensar antes de avançar, talvez acrescentasse que o mais difícil não é caminhar, mas escolher a direção — e dar o primeiro passo. Para os distritos capixabas que desejam crescer, a lição segue atual: planejar é importante, mas só transforma quando alguém assume a responsabilidade de começar.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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