A Constituição de 1988 figura como um marco da redemocratização brasileira e da valorização de direitos e garantias essenciais à manutenção de uma vida digna. A Lei Fundamental trouxe, em seu escopo — que se ampara, sobretudo, na dignidade humana —, valores de liberdade, igualdade e fraternidade que se reverberam por todo o ordenamento jurídico e objetivam, em especial, regular as relações sociais e alcançar — por mais utópica que possa parecer a ideia — um Estado de bem-estar social.
O nascer de uma nova Constituição traz consigo marcas do povo (titular do Poder Constituinte originário) e traça um caminho para a sociedade que queremos ser. E é justamente dentro dessa perspectiva de renovação que não é possível ignorar os fatores culturais, artísticos, econômicos, políticos, religiosos e sociais como verdadeiras fontes do Direito originário, sobretudo porque menosprezar o DNA e a memória histórica do povo na construção de uma nova ordem constitucional é estabelecer um destino ineficiente ao Direito, que caminha em verdadeira simbiose com as transformações sociais.
No entanto, não obstante os valores previstos pela Constituição democrática e garantista, parece que, atualmente, parte da população e dos que exercem a atividade legiferante tende a ignorar o passado e as lutas que nos trouxeram até aqui, vendendo uma imagem de um Direito estático, imutável e que flerta com ideais e ações que, visivelmente, atentam contra o Estado Democrático de Direito.
Fecham os olhos para o passado e colaboram para a construção de um futuro temerário, que se alimenta da projeção de mentiras, discursos de ódio, exceções de direitos e tantos outros ideais repugnantes que, no passado, fizeram-nos bradar pela reconstrução da democracia.
Recentemente, o Brasil celebrou as conquistas do filme "Ainda Estou Aqui", que, por meio da arte, reconstruiu memórias de um país marcado pela violência, censura e violação de direitos fundamentais. Além da valorização cultural diante do cenário internacional, o longa-metragem nos faz rememorar tempos sombrios e refletir sobre os caminhos que não podemos — tampouco devemos — seguir. É como um sinal do futuro; afinal, um povo que ignora o seu passado fecha os olhos para as estradas alternativas de um amanhecer próspero.
Ao caminhar junto do povo, o Direito não deve se desprender de suas fontes e seus objetivos, visto que sua eficiência está intimamente atrelada àquilo de que se alimenta. E a nós, povo brasileiro, permanece a missão de lutar, incansavelmente, pela defesa do Estado Democrático de Direito que, mesmo com suas falhas, nos permite construir — ou, pelo menos, tentar — uma sociedade livre, justa e solidária, amparada na valorização e proteção da dignidade humana.
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