Publicado em 11 de julho de 2025 às 09:39
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deu longas entrevistas ao Jornal Nacional, da Globo, e ao Jornal da Record na noite de quinta-feira (10/7) nas quais comentou a decisão do presidente dos EUA, Donald Trump, de impôr tarifas de 50% sobre produtos exportados pelo Brasil ao país.>
Entre as justificativas para a medida, o presidente americano mencionou o processo judicial que investiga o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022.>
Numa carta endereçada a Lula compartilhada nas redes sociais, Trump escreveu, em letras garrafais, que o julgamento contra seu aliado político deveria ser interrompido imediatamente.>
E esse, inclusive, foi um dos primeiros pontos abordados por Lula na entrevista ao Jornal Nacional (JN).>
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Ele disse que "não pode admitir" a "ingerência de um país na soberania de outro".>
"E mais grave: a intromissão de um presidente de um país no Poder Judiciário do meu país. É inaceitável que o presidente Trump mande uma carta pelo site dele e comece dizendo que é preciso acabar com a caça às bruxas. Isso é inadmissível", declarou Lula.>
O presidente brasileiro reforçou que "quem cometeu um erro vai ser punido" e chegou a insinuar que algo similar poderia acontecer com Trump, caso a invasão do Capitólio, em Washington, nos EUA, logo após ele perder a eleição para Joe Biden, tivesse acontecido no Brasil.>
"O que o presidente Trump tem que saber é que se aqui no Brasil ele tivesse feito o que ele fez nos Estados Unidos com as eleições, ele também estaria sendo processado, estaria sendo julgado. E, se fosse culpado, ele seria preso", disse Lula.>
"É assim que funciona a lei para todo mundo. Ou seja, nós precisamos aprender a respeitar. Você nunca viu me meter em uma decisão de Justiça americana. Nunca viu. E o que eu espero é reciprocidade, que ele também não se meta nos problemas brasileiros.">
Para Lula, Trump "não pode pensar que foi eleito para ser xerife do mundo".>
"Ele foi eleito para ser presidente dos Estados Unidos. Ele pode fazer o que ele quiser dentro dos Estados Unidos. Aqui no Brasil, quem manda somos nós, brasileiros", destacou ele, no Jornal da Record.>
O presidente brasileiro ainda insinuou que "se Trump conhecesse um pouquinho" o Brasil, "ele teria mais respeito". >
Ao ser questionado pela jornalista Delis Ortiz, da Globo, se a recente visita dele à ex-presidenta da Argentina, Cristina Kirchner, poderia ser interpretada como uma intervenção na soberania de outro país, Lula defendeu que trata-se de uma situação distinta.>
"Eu fui visitar a presidenta Cristina com autorização da Justiça argentina. Eu só fui lá porque a Justiça argentina decidiu que eu fosse visitar, atendendo um pedido da própria Cristina. Eu fui fazer uma visita humanitária.">
"Eu nunca me preocupei com que o Trump recebesse o Bolsonaro ou qualquer pessoa. É direito de cada presidente fazer o que quiser. O que não é direito é um presidente querer dar palpite na decisão de Justiça de um país. Aqui no Brasil, a nossa Justiça tem autonomia. O Poder Judiciário é um poder autônomo, como é o Legislativo. Aqui a gente obedece regras", complementou o presidente brasileiro. >
Perguntado sobre como pretende responder às taxas anunciadas por Trump, Lula pregou calma.>
"Eu não tomo decisão com 39 ºC de febre. O Brasil utilizará a Lei da Reciprocidade quando necessário e o Brasil vai tentar, junto com a OMC [Organização Mundial do Comércio] e outros países, fazer com que a OMC tome uma posição para saber quem é que está certo ou que está errado", disse ele. >
"A partir daí, se não houver solução, nós vamos entrar com a reciprocidade já a partir de 1º de agosto, quando ele [Trump] começa a taxar o Brasil.">
Segundo Lula, "o Brasil é um país que não quer brigar com ninguém". >
"Nós queremos negociar e o que nós queremos é que sejam respeitadas as decisões brasileiras." >
Para o presidente brasileiro, se Trump continuar a "brincar" com taxação, isso se tornará algo "infinito".>
"Se ele vai cobrar 50 de nós, nós vamos cobrar 50 deles", ameaçou ele no Jornal da Record.>
"Nós vamos chegar a milhões e milhões de milhões de por cento de taxa. O que o Brasil não aceita é intromissão nas coisas do Brasil.">
No JN, Lula também pontuou que o argumento de que a relação comercial de Brasil e EUA é prejudicial para os americanos não corresponde à realidade.>
"O presidente Trump deve estar muito mal informado [...] Não existe explicação a não ser uma falta de informação e depois uma tentativa de atrapalhar uma relação muito virtuosa que o Brasil tem com os Estados Unidos há 200 anos.">
"Ele tem o direito de tomar decisão em defesa do país dele, mas com base na verdade. Se alguém orientou ele com uma mentira de que os Estados Unidos é deficitário com o país, mentiu", apontou Lula.>
Ao Jornal da Record, o presidente detalhou os números da relação comercial entre os dois países.>
"Ele alega que os Estados Unidos têm déficit com o Brasil, mas isso não é verdade. Em 2023, exportamos US$ 40 bilhões e importamos US$ 47 bilhões dos EUA. Tivemos um déficit de US$ 7 bilhões. E, se somarmos os últimos 15 anos, o Brasil acumulou um déficit de US$ 410 bilhões com os americanos.">
"Será que ninguém do Tesouro explicou isso para ele antes de ele escrever aquela carta absurda?", questionou ele.>
O Brics é o bloco inicialmente formado pelas economias emergentes de Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul e que foi ampliado a partir de 2024, com a entrada de seis países — Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Indonésia e Irã.>
O grupo, que acaba de realizar uma cúpula no Rio de Janeiro, foi alvo de muitas críticas recentes de Trump. >
O presidente americano chegou a ameaçar as nações que negociassem com os Brics com uma sobretaxa de 10%.>
Questionado se o tom crítico adotado contra os EUA durante a cúpula do Rio de Janeiro pode ter influenciado a decisão de Trump sobre o Brasil, Lula mais uma vez descartou essa possibilidade.>
"Primeiro, o Brics é um fórum que representa hoje metade da população mundial e quase 30% do PIB mundial. E dentro do Brics há países que participam do G20 [o fórum das 20 maiores economias do planeta]", disse o presidente ao JN.>
"Nós cansamos de ser subordinados ao norte. Nós queremos ter independência nas nossas políticas, queremos fazer comércio mais livre. E as coisas estão acontecendo de forma maravilhosa", avaliou Lula.>
Ele ainda declarou que há discussões sobre uma moeda própria para o Brics, ou ao menos a possibilidade de fazer transações sem a necessidade de usar o dólar americano. >
"Nós não temos a máquina de rodar dólar, só os Estados Unidos que têm. Nós não precisamos disso para fazer comércio exterior", defendeu ele.>
"Achar que os Brics é a razão para o Trump ficar nervoso? O Brasil nunca ficou nervoso com a participação do G7, o Brasil nunca ficou nervoso com as coisas que os Estados Unidos fazem. Cada país tem a soberania de fazer aquilo que quer", disse Lula.>
"Então eu penso que o presidente Trump precisa se cercar de pessoas que o informem corretamente sobre como é virtuosa a relação Brasil-Estados Unidos", complementou ele.>
Por fim, Lula prometeu se reunir com todos os empresários que têm exportações para os EUA, especialmente aqueles com maior volume, como representantes dos setores do agro, do aço e da aviação.>
Segundo o presidente, a ideia é entender "qual é a situação deles".>
"Nós vamos tentar fazer todo o processo de negociação que for possível fazer. O Brasil gosta de negociar, o Brasil não gosta de contencioso." >
Depois que se esgotarem as negociações, Lula indica que o Brasil vai mesmo aplicar a Lei da Reciprocidade, aprovada recentemente por unanimidade pelo Congresso Nacional. >
"E espero que os empresários estejam aliados ao governo brasileiro", sugeriu Lula.>
"Porque se existe algum empresário que acha que o governo brasileiro tem que ceder e fazer tudo que o presidente do outro país quer, sinceramente, esse cidadão não tem nenhum orgulho de ser brasileiro.">
"Essa é a hora de a gente mostrar que o Brasil quer ser respeitado no mundo, que o Brasil é um país que não tem contencioso com nenhum país do mundo e que, portanto, a gente não aceita desaforos contra o Brasil", conclui ele no JN.>
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