Publicado em 7 de outubro de 2025 às 14:33
A Suprema Corte dos Estados Unidos iniciou nesta segunda-feira (6/10) seu novo mandato com uma pauta já repleta de casos significativos e que podem definir o alcance da autoridade presidencial de Donald Trump — com a perspectiva de que mais processos cheguem à Corte em breve.>
Nos oito meses desde que Trump retornou à Casa Branca, ele tem testado os limites do poder Executivo, implementando novas políticas de forma unilateral, reduzindo orçamentos e o quadro de funcionários federais e tentando trazer agências e instituições anteriormente independentes para sob seu controle direto.>
A mais recente disputa jurídica surge das tentativas do presidente de assumir o controle das unidades da Guarda Nacional dos Estados e enviá-las a cidades onde ele alega haver desordem pública e criminalidade desenfreada, contrariando autoridades locais e estaduais.>
Em Oregon, uma juíza federal emitiu ordens bloqueando o envio de tropas de Trump a Portland. Um tribunal de apelações deve revisar a medida nos próximos dias.>
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"Esta é uma nação de leis constitucionais, não de lei marcial", escreveu a juíza Karin Immergut, nomeada por Trump em seu primeiro mandato, em sua decisão publicada no sábado.>
"Os réus apresentaram uma série de argumentos que, se aceitos, correm o risco de confundir a linha que separa o poder civil do poder militar federal — em detrimento desta nação.">
Assim que o tribunal de apelações emitir sua decisão, a Suprema Corte poderá intervir por meio de seu chamado shadow docket [ou "processo sombra", em tradução livre, que descreve a prática da Corte de emitir decisões e ordens emergenciais de forma acelerada, sem o processo habitual de argumentação oral], publicando uma decisão que pode restringir a capacidade de Trump de usar o Exército em solo americano — ou conceder ao presidente liberdade total, ao menos temporariamente.>
Esse tipo de revisão se tornou mais frequente recentemente, já que a maioria dos juízes da Suprema Corte, ao responder a petições de emergência apresentadas pelo governo Trump, tem permitido que as ações do presidente avancem enquanto as disputas legais seguem tramitando.>
"Um cabo de guerra entre a Suprema Corte e os tribunais federais inferiores será uma força motriz no próximo mandato", afirmou Samuel Bray, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Chicago, em um pronunciamento no mês passado.>
O uso frequente desse shadow docket tem sido criticado por juristas e políticos de tendência progressista, que consideram a prática um uso indevido da autoridade do tribunal. As decisões costumam ser curtas, oferecendo pouca fundamentação jurídica e deixando juízes de instâncias inferiores sem orientação clara.>
"Todos os americanos deveriam estar alarmados com a crescente dependência da Suprema Corte de seu shadow docket para resolver casos controversos e de alto perfil sem transparência — sem explicações substantivas, sem argumentos orais, sem justificativas", afirmou o senador democrata Cory Booker, de Nova Jersey, no início deste ano.>
"Isso empurra ainda mais as deliberações e decisões da Corte para fora do escrutínio público, blindando-a contra a responsabilização.">
Nos próximos meses, contudo, a Suprema Corte deve enfrentar questões sobre o poder presidencial — e outras controvérsias de grande repercussão — ouvindo argumentos orais e emitindo decisões completas sobre o mérito dos casos.>
"Ela não vai poder se safar com ordens de uma página que não explicam o raciocínio", disse Maya Sen, professora da Escola Kennedy de Harvard, especialista em Suprema Corte e política dos EUA. "Se for conceder mais poder ao Executivo, terá que explicar por quê.">
A Corte já programou a análise de se leis federais que impedem o presidente de demitir membros de agências concebidas pelo Congresso para serem independentes violam a autoridade executiva.>
Os juízes também ouvirão argumentos em uma revisão acelerada da tentativa de Trump de demitir Lisa Cook de seu cargo como diretora do influente Conselho do Federal Reserve — um caso que pode ampliar dramaticamente o poder do presidente sobre a política econômica americana.>
A economia dos EUA — e a global — também estará no centro das atenções, já que os juízes da Suprema Corte terão a oportunidade de decidir se muitas das tarifas sobre importações estrangeiras impostas unilateralmente por Trump têm respaldo legal suficiente ou devem ser anuladas.>
Os magistrados também podem revisar as tentativas de Trump de reduzir unilateralmente os gastos federais e demitir funcionários públicos de escalões inferiores, assim como suas políticas agressivas de imigração e deportação.>
Embora a Corte ainda não tenha concordado em analisar a tentativa de Trump de acabar com a cidadania automática para pessoas nascidas em solo americano, isso pode acontecer nos próximos meses.>
"O alcance do poder executivo será o foco central deste mandato", afirmou a professora Jennifer Nou, da Faculdade de Direito da Universidade de Chicago, em e-mail à BBC.>
"Os casos que chegam à Corte testarão as prioridades políticas e econômicas mais altas do governo Trump — sejam as tarifas ou o direito à cidadania por nascimento.>
"Uma das questões será se os juízes aplicarão os mesmos princípios (como a doutrina das 'grandes questões') usados para derrubar iniciativas emblemáticas de Biden de forma politicamente equilibrada.">
A Corte utilizou recentemente essa "doutrina das grandes questões" para impedir os esforços de Biden na anistia de dívidas estudantis e na regulamentação ambiental, argumentando que o Congresso não lhe havia concedido autorização explícita para isso.>
O poder presidencial é o foco central do mandato da Suprema Corte neste ano, mas também estão agendados casos que envolvem várias polêmicas políticas e culturais de grande destaque.>
O tribunal analisará se uma proibição no Colorado da terapia de conversão — prática controversa que busca, por meio de aconselhamento, mudar a orientação sexual ou identidade de gênero de uma pessoa — viola as proteções constitucionais à liberdade de expressão.>
Também estão na pauta dois casos envolvendo proibições estaduais à participação de atletas transgêneros em competições esportivas escolares.>
Um deputado republicano de Illinois contesta uma lei estadual que permite contar votos enviados pelo correio até duas semanas após o dia da eleição.>
Um grupo de conservadores da Louisiana pediu à Corte que derrube uma disposição da lei dos direitos de voto que obriga os Estados a desenhar distritos eleitorais que garantam representação proporcional de eleitores negros.>
E o Partido Republicano tenta revogar uma lei de décadas que impede candidatos e partidos políticos de coordenar seus gastos de campanha.>
Nos últimos anos, esta Suprema Corte, de maioria conservadora, demonstrou disposição em emitir decisões históricas que alteraram profundamente o panorama jurídico dos Estados Unidos.>
Em temas como o direito ao aborto, a autoridade regulatória federal e a consideração de raça nos processos de admissão universitária, a Corte reverteu precedentes consolidados por décadas.>
Essas decisões contribuíram para uma percepção pública da Suprema Corte cada vez mais polarizada ao longo de linhas partidárias.>
Em uma pesquisa recente da Fundação Pew, as opiniões sobre a mais alta instância jurídica do país estavam quase igualmente divididas — com republicanos em geral favoráveis e democratas fortemente críticos.>
Até o momento em que a Corte emitir suas decisões finais neste mandato, previsto para o fim de junho do próximo ano, a maioria conservadora de 6 a 3 poderá ter aberto novos caminhos — e mais uma vez, transformado fundamentalmente o direito americano.>
Reportagem adicional de Kayla Epstein>
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