Publicado em 30 de agosto de 2025 às 21:25
A cidade de Pequim se transformará em palco de um grande espetáculo de demonstração do poderio militar chinês na próxima quarta-feira (3/9).>
Tanques e mísseis nucleares desfilarão pela Praça da Paz Celestial, na capital chinesa, enquanto jatos de combate de quinta geração passarão riscando o céu.>
No desfile chinês do "Dia da Vitória", muitos olhares não estarão, contudo, atentos apenas à tecnologia de combate sendo exibida. >
Eles também deve se dirigir ao líder norte-coreano Kim Jong Un e ao presidente russo, Vladimir Putin, que comparecerão ao evento como convidados do presidente chinês, Xi Jinping.>
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Kim e Putin raramente têm viajado ao exterior nos últimos anos. O que o seu comparecimento ao evento — que marca o 80° aniversário do fim da Segunda Guerra Mundial — nos diz sobre o relacionamento entre as três nações e seus planos para o futuro?>
Para explicar melhor, reunimos especialistas dos serviços coreano, russo e chinês da BBC, que compartilharam suas visões sobre o desfile.>
"O encontro entre Kim e Xi será o primeiro em cerca de seis anos", diz Juna Moon, da BBC News Coreia.>
"Kim visitou a China pela última vez antes de viajar para a cúpula de Hanói [no Vietnã] em 2019, para se encontrar com Donald Trump durante o primeiro mandato [do presidente americano]", relembra ela. >
"E Xi visitou Pyongyang posteriormente, no mesmo ano.">
O evento atual é inédito em vários sentidos. Esta será a primeira vez em que os líderes da Coreia do Norte, da China e da Rússia serão vistos juntos, por exemplo.>
É um encontro incomum para os líderes norte-coreanos. Afinal, tanto Kim Jong Un quanto seu pai e predecessor, Kim Jong Il (1941-2011), se restringiram a manter reuniões diplomáticas com apenas um governante de cada vez.>
Além disso, esta é a primeira vez em que um líder norte-coreano comparece a um desfile militar chinês desde 1959.>
"A visita ocorre em um momento em que a Coreia do Norte enfrenta sérias dificuldades econômicas e se prepara para aniversários políticos importantes, o que torna fundamental o auxílio chinês", explica Moon. Ela destaca os preços do arroz, que dispararam no país.>
Kim Jong Un certamente deseja garantir que a ajuda chinesa faça com que o 80° aniversário de fundação do Partido dos Trabalhadores da Coreia do Norte, em outubro, e o nono congresso do partido, esperado para o ano que vem, sejam marcados pela grandiosidade, não pela austeridade.>
A participação da Coreia do Norte possivelmente envolve também uma dimensão econômica que se beneficiaria de ajuda chinesa.>
"Pyongyang espera atrair grandes quantidades de turistas chineses para a recém-inaugurada Zona Turística Costeira de Wonsan Kalma, o que precisaria da bênção do Partido Comunista Chinês", destaca Moon.>
Mas a viagem do líder norte-coreano para Pequim envolverá muito mais do que apenas dinheiro.>
Kim geralmente gosta de equilibrar seu relacionamento entre Pequim e Moscou. Por isso, ele não deposita excessiva confiança em nenhum dos dois.>
Este evento fornecerá a ele uma rara oportunidade de ser visto com os dois presidentes.>
"Ao se alinhar com Xi e Putin, Kim tenta se apresentar como parceiro das superpotências e sinalizar a posição central da Coreia do Norte em um possível eixo China-Coreia do Norte-Rússia", explica Moon.>
Kim Jong Un pode até esperar que o presidente Xi compareça às comemorações do Partido dos Trabalhadores da Coreia do Norte em outubro, o que aumentaria sua importância dentro e fora do país.>
Mas o que isso significa para o país vizinho, a Coreia do Sul?>
"A visita de Kim também é amplamente interpretada como uma reação estratégica à crescente cooperação entre os Estados Unidos, a Coreia do Sul e o Japão", afirma Moon, "e um sinal de que Pyongyang está pronta para aprofundar seu alinhamento tripartite com a China e a Rússia.">
"Se a visita de Kim no Dia da Vitória fortalecer a cooperação entre a Coreia do Norte, a Rússia e a China, pode haver graves consequências para a segurança da Coreia do Sul", segundo ela.>
"O risco de uma cooperação mais profunda, mesmo que não oficial, entre Pyongyang, Pequim e Moscou, em termos de sistemas de armas, tecnologia militar, inteligência e logística, vem crescendo progressivamente.">
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O convite para visitar Pequim, logo após a cúpula no Alasca com o presidente americano, Donald Trump, é "música para os ouvidos de Vladimir Putin", segundo Alexey Kalmykov, da BBC News Rússia.>
"A Rússia vem sendo cada vez mais isolada do mundo há anos, pelas sanções derivadas de sua invasão da Ucrânia", destaca ele.>
"Putin participava de igual para igual na mesa do G7, mas passou a ser um pária com uma ordem de prisão emitida contra ele pelo Tribunal Penal Internacional.">
Agora, em curto espaço de tempo duas importantes potências mundiais estendem o tapete vermelho para ele.>
"Até recentemente, as autoridades russas não conseguiriam sonhar com um sucesso tão grande no cenário internacional", segundo Kalmykov. "Hoje é uma realidade.">
Comparecer ao desfile em Pequim irá consolidar a posição de Putin no panorama global e também tranquilizar o povo russo em relação à posição internacional do país.>
"Numerosos apertos de mão, abraços cordiais e tapetes vermelhos devem mostrar ao público russo que Moscou não é um parceiro menor de Pequim, mas um igual", explica Kalmykov.>
Além dos relacionamentos pessoais, também haverá outro aspecto importante no desfile do "Dia da Vitória" na China, que marca os 80 anos da rendição japonesa e o fim da Segunda Guerra Mundial.>
"A demonstração de força na China enviará um sinal importante para o resto do mundo", segundo Kalmykov. "O Sul Global está unido em torno de Xi e Putin e é uma força que deve ser reconhecida.">
Outra mensagem importante também será enviada para a Casa Branca, sinalizando que qualquer tentativa de induzir a cisão entre Moscou e Pequim irá fracassar.>
"A 'amizade sem limites' entre a Rússia e a China está viva e muito bem", conclui Kalmykov.>
Durante o desfile, a China pretenderá demonstrar ao mundo que é uma moderna potência militar global.>
"Autoridades chinesas anunciaram que o desfile terá 70 minutos e apresentará a nova geração de armas do Exército de Libertação Popular", relata a BBC News China, "incluindo avançados sistemas hipersônicos, aéreos e de defesa antimísseis, além de mísseis estratégicos, todos selecionados dos atuais equipamentos chineses de combate.">
Antes do evento, um porta-voz do governo chinês declarou que uma quantidade significativa de equipamentos novos será exibida pela primeira vez.>
Isso certamente atrairá a atenção de todo o mundo, pois, segundo o Boletim dos Cientistas Atômicos, a China atualmente está expandindo e modernizando suas armas nucleares, com mais rapidez do que qualquer outro país.>
Já no campo diplomático, a China terá menos problemas com sua lista de convidados que em eventos anteriores.>
O Tribunal Penal Internacional (TPI) tem uma ordem de prisão ativa contra o presidente Putin e a China já foi condenada anteriormente por convidar pessoas procuradas pelo TPI para este tipo de evento.>
Mas a decisão do presidente Trump de convidar o líder russo para o Alasca, poucas semanas atrás, dificulta fazer críticas à China, avalia o serviço chinês da BBC, já que "soldados americanos estenderam o tapete vermelho para Putin".>
E o importante não são só as pessoas que estão comparecendo. Também é significativo observar quem ficará de fora.>
Dez anos atrás, um convidado importante para o mesmo desfile foi o ex-presidente do partido taiwanês KMT, que, na época, estava no governo do país. O convite ocorreu "durante o período de lua de mel nas relações no estreito de Taiwan", relembra a BBC News China.>
Mas, desde 2016, Taiwan é governado pelo Partido Democrático Progressista, que tipicamente mantém relações mais frias com Pequim.>
E devido, em parte, à repressão chinesa aos dissidentes em Hong Kong, "Taiwan proibiu as autoridades públicas de viajar a Pequim para o desfile militar", segundo informa o serviço chinês da BBC.>
Por isso, nenhum representante taiwanês estará ao lado dos 26 chefes de Estado esperados para assistir ao evento.>
A China defende que a ilha autogovernada de Taiwan faz parte do território chinês e prometeu, há muito tempo, a sua "reunificação".>
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