Publicado em 3 de março de 2022 às 18:42
- Atualizado há 4 anos
No dia em que a guerra na Ucrânia completou uma semana, o presidente da Rússia, Valdimir Putin, foi à TV para dizer que a invasão do país vizinho está ocorrendo "de acordo com o plano" e prometeu compensar financeiramente família dos seus soldados mortos, a quem chamou de heróis.>
O presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, por sua vez afirmou em entrevista que o único modo de "frear a guerra" é se encontrar diretamente com Putin. A fala ocorreu enquanto uma delegação de seu país se reunia com uma do rival em Belarus, a ditadura que está apoiando a ação russa.>
O pronunciamento de Putin foi o mais extenso do tipo desde o começo da guerra. Nele, o presidente enfim trouxe a "operação militar especial" para a sala de estar dos russos ordinários. "Nossos soldados estão se sacrificando", disse, os chamando de heróis da Rússia.>
Até aqui, Moscou só admitiu 498 mortes, enquanto Kiev diz ter matado mais de 9.000, ambas figuras certamente distorcidas. Putin disse que cada família de militar morto ganhará 7 milhões de rublos (R$ 330 mil nesta quinta) e uma ajuda mensal. Ele fez uma homenagem aos caídos.>
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Em resposta ao fato de que sua ação não conquistou a capital, Kiev, Putin passou recibo e disse que a "operação especial está ocorrendo de acordo com o plano". Para os que preveem um recrudescimento da ação, não pareceu um bom sinal. "Vamos destruir essa anti-Rússia [a Ucrânia] criada pelo Ocidente.">
Repetiu a cantilena de que a Ucrânia está infiltrada por neonazistas e tentou colocar o aliado Xi Jinping na discussão, afirmando que estudantes chineses haviam sido impedidos de deixar o país.>
Zelenski, do seu lado, repetiu o que vem dizendo: que se o Ocidente não enfrentar o risco de uma guerra com a Rússia estabelecendo uma zona de exclusão aérea sobre seu país, nações como os ex-soviéticos Estados Bálticos serão os próximos da fila. Com efeito, nesta quinta outro país do clube, a Moldova, se inscreveu para entrar na União Europeia.>
O ucraniano também trouxe relatos que parecem fantasiosos. No caso, de um forno crematório móvel trazido pelos russos para incinerar seus mortos, evitando ter prova de suas baixas o que seria dito às famílias na Rússia ele não elaborou.>
As falas ocorreram depois da quarta-feira (2), considerada o dia mais violento do conflito até aqui. Nesta quinta, contudo, os combates seguiram em ritmo menos intenso. A madrugada foi quase sem incidentes na capital, Kiev. Houve, contudo, ataques a áreas civis em outros pontos do país.>
Não houve relato da aproximação da temida coluna blindada que está a nordeste de Kiev. Alguns analistas especulam se há problemas logísticos, como a falta de combustível que atingiu alguns blindados em outros pontos do país, e outros sugerem uma pausa tática antes do cerco final da cidade.>
Também houve uma consolidação da situação na estratégica cidade de Kherson, tomada na quarta pelos russos. Ela estabelece uma cabeça de ponte ao norte da Crimeia, a península ucraniana anexada por Putin em 2014 na crise que deu origem à guerra atual.>
A partir dali, rumo a leste, os russos deverão tentar conquistar Mariupol e, assim, estabelecer uma conexão por terra entre a Crimeia e o Donbass, a área do leste do país que também desde 2014 estava em mãos de rebeldes separatistas pró-Kremlin. A cidade está sob cerco, e a prefeitura local afirma que a tática russa é de bloquear a cidade para forçá-la a se render.>
Este é um aparente objetivo estratégico secundário da campanha, que visa anular qualquer chance de a Ucrânia entrar na Otan, a aliança militar ocidental, ou na União Europeia, embora só o objetivo militar seja explicitado por Putin. A meta política implicaria evitar fazer do vizinho uma vitrine democrática para a oposição em seu próprio país.>
Imagens da guerra na Ucrânia
Seja qual for a resposta sobre o ritmo da ofensiva, ela obedece à lógica política do dia. Uma delegação ucraniana foi de helicóptero para a Belarus para se encontrar com um grupo russo que chegou na véspera.>
Na segunda (28), a conversa entre eles não deu em nada. Havia uma expectativa vazada pelo Ministério das Relações Exteriores russo de que um cessar-fogo pudesse ser negociado, mas o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, já disse que as demandas russas de rendição são inaceitáveis.>
Um dos negociadores ucranianos, David Arajamia, postou no Facebook que no cardápio da conversa está o estabelecimento de "corredores humanitários" para a retirada segura de civis de áreas de conflito. "No mais, serão circunstâncias [que ditarão o rumo da reunião]", disse.>
Em sua fala na TV, Putin disse que tais corredores já foram implantados por seus militares, o que não é aferível a esta altura.>
O líder russo havia falado mais cedo com o presidente Emmanuel Macron, da França, que vem adotando uma retórica aguda depois de ter tentado evitar a guerra em visitas a Moscou e Kiev que resultaram em trapalhadas diplomáticas para Paris. O francês também conversou ao telefone com Zelenski.>
Segundo o governo francês, o russo disse a Macron que seguiria na ofensiva e ouviu de volta que isso prejudicaria de forma permanente seu país.>
Cresce na Europa o temor de que a guerra ultrapasse as fronteiras ucranianas. Dia sim, dia sim alguma autoridade russa ou ocidental fala do temor de um conflito mundial, nuclear. O fato de que o líder russo tem usado essa ameaça desde o dia em que decretou a invasão e, no domingo (27), colocou suas forças estratégicas em alerta máximo só piorou o clima.>
Nesta quinta, o chanceler russo, Serguei Lavrov, voltou a falar sobre o tema. "O pensamento sobre [guerra] nuclear está constantemente na cabeça dos políticos ocidentais, mas não na dos russos", disse ele, ignorando o que seu chefe tem feito desde o começo do conflito.>
Uma das formas com que a situação poderia escalar é a interpretação do Kremlin da ajuda militar de países da Otan à Ucrânia. Milhares de mísseis antitanque e antiaéreos estão sendo prometidos, e é incerto quantos já chegaram não parece ter havido ainda um impacto decisivo na capacidade de deter os russos, mas isso pode mudar ou instigar mais violência.>
Os EUA repetem insistentemente que a Otan não irá lutar contra os russos. Mas se houver leitura de que armas ocidentais estão matando mais soldados de Putin, há o risco de Moscou achar que está sendo alvo de um ataque direto, para não falar nas brutais sanções econômicas a que vem sido submetida.>
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