Publicado em 9 de outubro de 2025 às 06:32
"Você são africanos, vocês pertencem à África. Você assassinam nossas crianças, nossa juventude, nossa vida. Vocês têm que ir embora. Nós não queremos vocês no nosso país". >
Essas foram as palavras que um grupo de brasileiros ouviu de uma mulher em Dublin, na Irlanda. A cena aconteceu em julho deste ano e foi registrada em vídeo (veja abaixo). >
Entre as vítimas estava a cabeleireira Lays Mendes, que mora no país há oito anos. >
Segundo ela, os ataques acontecem toda semana, quando essa mesma mulher passa em frente ao salão de beleza que a brasileira trabalha.>
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"É corriqueiro pra mim...ela sempre fala essas agressividades comigo e com outras pessoas pretas também. Teve um episódio em que eu estava com meus filhos. E aí dói muito mais", afirma.>
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Lays lembra que no dia do ocorrido, a mulher estava eufórica. Por isso, a brasileira abriu a porta e foi ver se ela precisava de alguma coisa. >
"E aí ela falou um monte de coisa. Mandou eu 'voltar para a África'. Eu fiquei desacreditada porque quando a gente sofre o racismo, as pessoas não são tão diretas assim para falar. Elas não são tão agressivas como essa senhora foi", destacou. >
Mas não foram apenas as palavras da mulher que assustaram a brasileira, mas a forma como ela olhava para o grupo. >
"África pra mim é sinônimo de força, de poder...mas o olhar dela, de desprezo, de ódio, de raiva. Isso é muito pesado para a gente que sofre o racismo", destaca.>
Após o ocorrido, Lays prestou queixa na delegacia. >
Segundo ela, os policiais foram prestativos, ofereceram apoio psicológico, e fizeram contato via e-mail e por ligação algumas vezes. Mas disseram que não tinha muito o que fazer. >
Caso a mulher repetisse a atitude, eles tomariam uma medida. >
"A gente fica sem saber o que esperar de uma pessoa racista, elas podem fazer qualquer coisa, podem atirar fogo, podem matar, eu não sei o tamanho do ódio que essa senhora sente", afirmou a cabeleireira.>
Procurado pela BBC News Brasil, o Departamento de Justiça, Assuntos Internos e Imigração da Irlanda disse que o governo está "determinado a erradicar crimes motivados pelo ódio e a proteger comunidades vulneráveis".>
Segundo o órgão, uma lei criada em 2024, e que entrou em vigor este ano, prevê penas de prisão mais severas para certos crimes, quando comprovadamente motivados por ódio, ou quando o ódio for demonstrado com base na identidade das vítimas.>
O departamento também citou a existência do Plano Nacional de Ação Contra o Racismo na Irlanda como exemplo de ações públicas para lidar com casos como o da Lays.>
A BBC News Brasil também tentou entrar em contato com a mulher que aparece no vídeo, mas não teve sucesso até a publicação deste texto. >
Nos oito anos que vive na Irlanda, Lays percebeu uma piora na forma como imigrantes são tratados. Além de racismo, há casos de xenofobia. >
"O que aconteceu comigo não é um caso isolado. Isso vem acontecendo com outras pessoas, com outras nacionalidades também", afirma. >
Os dados da polícia irlandesa reforçam a percepção da brasileira.>
Nos últimos quatro anos houve um aumento de mais de 50% nos registros de crime de ódio no país. Em 2021 foram registrados 389 ocorrências do tipo. Já em 2024, foram 592. >
Entre os principais motivos de discriminação no último ano estão raça e nacionalidade.>
O brasileiro Rafael Santos também tem percebido essa mudança de tratamento. Ele mora na Irlanda desde 2019 e faz parte de vários movimentos negros locais.>
"O racismo é real. Ele aparece tanto em pequenos atos cotidianos, olhares, comentários, exclusão, quanto em situações graves, como a da Lays. E é importante destacar, assim, que isso não é um caso isolado. É parte de um padrão, que já vem sendo mapeado", destacou ele, que integra a comunidade Black and Irish.>
Apesar da situação, Lays chama atenção para os gestos de solidariedade e carinho que recebeu após o episódio, inclusive de irlandeses.>
"É um sentimento de muita dor, mas paralelo a ele, veio um sentimento de muito amor, de proteção que eu senti das outras pessoas também. Recebi muito apoio da comunidade brasileira e de muitos irlandeses [...] Muitos me mandaram flores, vieram até o salão para dizer que essa senhora não os representa", lembra emocionada.>
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