Publicado em 13 de janeiro de 2024 às 09:43
Apagar 100 velinhas no bolo de aniversário está deixando de ser um evento excepcional.>
Dados da Divisão de População das Nações Unidas indicam que 621 mil pessoas haviam atingido os três dígitos de idade em 2021. Em 1990, eram apenas 92 mil.>
A Espanha, palco das nossas pesquisas sobre o tema, é um dos países com maior número de centenários do planeta: são 19.639, segundo os últimos dados do Instituto Nacional de Estatísticas do país. Destes, 77% são mulheres.>
No Brasil, o número de pessoas com 100 anos de idade ou mais subiu de quase 24 mil pessoas no censo de 2010 para 37.814 em 2022, segundo dados do IBGE – 72% são mulheres. >
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Dentro dessa população, nossa equipe de pesquisas estudou as características das pessoas que atingiram os 100 anos de idade com saúde – ou seja, sem manifestar sinais de deterioração cognitiva e gozando de razoável autonomia física.>
Afinal, é este grupo privilegiado que pode oferecer certas chaves para o envelhecimento saudável.>
É claro que os fatores genéticos e de estilo de vida são muito importantes para atingir a longevidade extrema em bom estado de saúde. Mas qual é o papel dos fatores psicológicos?>
As pesquisas indicam que as pessoas que experimentam mais emoções positivas e estão mais satisfeitas com suas vidas têm maior probabilidade de viver por mais tempo.>
Além disso, os recursos psicológicos (como o otimismo, a resiliência, a autoestima etc.) não são apenas os ingredientes que alimentam nosso bem-estar psicológico. Eles também colaboram para a saúde física e mental.>
Em uma pesquisa recente, questionamos se os centenários saudáveis realmente possuem recursos psicológicos ou características positivas de personalidade que possam tê-los ajudado a enfrentar com mais sucesso as situações traumáticas, dificuldades e desafios impostos por uma vida tão longa.>
Para responder a esta pergunta, realizamos entrevistas detalhadas com 19 pessoas com boa saúde entre 100 e 107 anos de idade (16 delas eram mulheres).>
Concluímos que os centenários compartilham 19 recursos psicológicos, que agrupamos em oito categorias. Aqui estão elas, acompanhadas de alguns testemunhos representativos dos idosos. >
Os centenários entrevistados são pessoas ativas e participativas. Elas têm comprometimento com a vida e clara vontade de continuar vivendo.>
Alguns deles trabalharam até idade bastante avançada e, atualmente, continuam ativos, física e intelectualmente.>
"Costurei até os 98 anos. Agora, gosto muito de fazer palavras cruzadas e tento resolver sudokus. Desço os andares de elevador, mas subo pela escada, para exercitar as pernas" (mulher, 100 anos).>
"Às 6 horas, é a festa dos avós e eu vou. Afinal, tem bingo e não quero perder" (homem, 100 anos).>
A sociabilidade é sua característica. Eles se sentem amados pelos que os rodeiam e ajudaram os outros sempre que puderam, ao longo da vida.>
"Nunca tive dificuldades para fazer amigos; para isso, sou muito simpática. Tive muitas amizades" (mulher, 104 anos).>
"Aqui, gostam muito de mim. Cada vez que encontro uma freira, ela me faz carinho e me diz algo bonito, elas não fazem isso com todos" (homem, 100 anos).>
"Um casal de idosos com poucos recursos vinha comer na minha casa todos os dias" (mulher, 102 anos).>
Os centenários pesquisados foram pessoas responsáveis, competentes, trabalhadoras, valorizadas, queridas e honestas. Eles perseveraram para conseguir seus objetivos.>
"Meus patrões gostavam muito de mim. Fiquei sete anos com eles e, no dia em que me casei, a senhora chorava como se fosse minha mãe" (mulher, 103 anos).>
"Faz quatro anos que quebrei o quadril e, com cerca de um mês, já estava andando, sem muletas e sem andador, sem nada. Sou muito perseverante" (mulher, 101 anos).>
Os idosos entrevistados tomaram as rédeas de suas próprias vidas. Eles demonstraram autonomia para decisões e souberam encontrar as oportunidades.>
"Quando meu marido ficou doente, precisei enfrentar tudo. Assumi os negócios do meu marido, cuidei das contas e dos bancos, mandei nos homens, tudo" (mulher, 102 anos). >
São pessoas curiosas, que valorizam a cultura e têm motivação para aprender. Em muitos casos, são leitores incansáveis.>
"Muitas vezes, quando estava com os animais, cometia o erro de ler e as ovelhas invadiam a plantação. Chegava então o guarda e dizia: 'você não vê onde se meteram as ovelhas, que estão comendo a plantação' (...) Li tudo o que pude e também escrevi muito" (homem, 100 anos).>
Os centenários demonstram agradecimento e são capazes de ter prazer com as pequenas coisas do dia a dia.>
"A vida me deu tudo, graças a Deus. Ela me deu tristezas, como perder familiares, mas não passei mal por aquilo" (mulher, 100 anos).>
Apesar das dificuldades (problemas na infância, perda de entes queridos, eventos como a guerra civil espanhola e a covid-19...), os centenários pesquisados souberam seguir adiante com suas vidas e, em alguns casos, mudar de direção.>
Acima de tudo, sua experiência com as adversidades não causou danos psicológicos.>
"Eu era muito ligado à minha mulher. Quando ela morreu, eu tinha 97 anos e minha filha pensou que eu não fosse superar. No princípio, estive mal, mas depois pensei que só se vive uma vez e é preciso ser forte, porque a minha mulher não gostaria de me ver mal" (homem, 101 anos).>
Os centenários souberam assumir desafios para os quais não tinham formação concreta e os superaram com sucesso.>
Eles são curiosos e adoram aprender. Sua conversa é rápida, ágil e eles têm boa memória. Sabem ler e escrever – alguns, sem nunca terem frequentado a escola. Eles adaptaram e dirigiram suas vidas para os caminhos que os deixassem satisfeitos.>
"Por 20 anos, fui presidente da Câmara Agrária [nunca teve formação específica]" (homem, 100 anos).>
A análise da vida dos centenários saudáveis fornece algumas pistas para atingir uma velhice saudável:>
* María Dolores Merino Rivera é professora de psicologia diferencial, bem-estar psicológico e saúde do trabalho da Universidade Complutense de Madri, na Espanha.>
Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado sob licença Creative Commons. Leia aqui a versão original em espanhol.>
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