Publicado em 10 de março de 2025 às 16:44
O professor de geografia Alastair Bonnett sabe que os mapas que iremos apresentar agora irão mudar sua forma de ver o mundo. Afinal, ele próprio sofreu um "choque de emoção" quando descobriu cada um deles.>
Esta emoção foi o critério adotado para selecionar os mapas do seu livro 40 Maps That Will Change How You See the World ("40 mapas que vão mudar como você vê o mundo", em tradução livre), publicado recentemente pelo professor da Universidade de Newcastle, no Reino Unido.>
"Cada um destes 40 mapas é revolucionário", escreve Bonnett na introdução do livro. >
"São mapas que desafiam nossa visão do mundo, às vezes a empurram mais para lá e às vezes a derrubam.">
>
>
Bonnett é o autor de inúmeros trabalhos que exploram a interligação entre a geografia e a sociedade. Eles já foram traduzidos para 19 idiomas.>
Seu livro mais recente inclui desde mapas antigos até outros criados com tecnologia de última geração, tanto do nosso planeta como do espaço.>
A BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, conversou com Bonnett sobre seis desses mapas. Eles ilustram parte da diversidade e da riqueza da obra.>
Em 2001, um historiador amador descobriu, em uma loja de antiguidades de Xangai, na China, algo que prometia mudar a história da humanidade: um mapa de 1418 que mostra o mundo inteiro, incluindo o continente americano – 70 anos antes da chegada de Cristóvão Colombo.>
O autor do mapa conseguiu desenhar todos os continentes de forma bastante precisa, incluindo a Antártida. E ainda acrescentou diversas observações.>
Sobre a África, por exemplo, ele diz que "a pele das pessoas aqui é como laca negra". E ele afirma que, na América do Sul, "os seres humanos são utilizados como vítimas de sacrifício e as pessoas prestam homenagens ao fogo".>
A notícia do chamado "mapa de 1418" percorreu o mundo.>
"A ideia de que os chineses descobriram a América com tamanho grau de detalhamento, antes dos europeus, era muito significativa", segundo Bonnett.>
E, como se não fosse o bastante, no comando da missão que percorreu o planeta estava o lendário explorador chinês Zheng He (1371-1433).>
Só havia um problema: o mapa era falso.>
Bonnett explica que o mapa inclui tamanho grau de detalhamento que seria impossível para os chineses deter tantas informações sobre o planeta, sem que as sucessivas expedições deixassem rastros nos locais registrados.>
"É o único mapa falso de todo o livro, mas acredito que ele é muito interessante, pois mostra como existe uma enorme sede pela diversificação da história", explica Bonnett.>
Na sua opinião, a China detém "a tradição cartográfica mais extraordinária de todos os países do mundo". E as titânicas expedições de Zheng He pelo sudeste asiático, a península arábica e o Chifre da África trouxeram descobertas que causaram enormes impactos pelo mundo.>
"Incluí este mapa para dizer que sim, os chineses descobriram o mundo e precisamos falar a respeito, mas não precisamos começar a inventar coisas para isso", ele conta. "Seus méritos se sustentam por si próprios.">
"Nossos mapas 'modernos' são todos de caminhos e cidades, mas muitos mapas 'pré-modernos' tinham espaço para a magia e a narrativa", escreve Bonnett sobre dois mapas astecas incluídos no seu livro: o Códice Quetzalecatzin e o Códice Nuttall.>
O primeiro data de 1593, ou seja, é posterior à chegada dos conquistadores. Já o outro é do século anterior, o que faz dele um raro sobrevivente. Os espanhóis consideraram a maioria dos mapas, livros e outros textos dos povos originários da América como demoníacos – e os queimaram.>
Bonnett admite que o Códice Nuttall "a princípio, não se parece em nada com um mapa", pois estamos acostumados a observar os mapas como uma versão em miniatura da realidade, vista de cima. Mas, neste caso, o que vemos são pessoas, animais e seres mitológicos, em uma mistura de perspectivas.>
A chave para entender o Códice Nuttall é decodificar os símbolos. Existe, por exemplo, uma criatura com a boca aberta, que indica a existência de uma caverna.>
"É um tipo de mapa que, de certa forma, nunca mais voltamos a ver", lamenta Bonnett.>
Já o Códice Quetzalecatzin é híbrido. Ele inclui simbologia asteca, mas também texto em espanhol ou no idioma originário náuatle, empregando o alfabeto latino.>
Ele foi criado por uma das famílias astecas mais poderosas da época, os Quetzalecatzin – ou León, que foi o nome adotado em espanhol.>
Seu objetivo era demonstrar seus direitos ancestrais sobre determinadas terras onde, hoje, ficam as regiões de Puebla e Oaxaca, no centro e sul do México. Por isso, o mapa inclui dados geográficos e uma árvore genealógica.>
"É um mapa do tempo, além do espaço", explica Bonnett.>
O livro também afirma que este mapa "é importante, não por ser um mapa indígena ou colonial. Ele é importante porque mostra a transição e o nascimento de uma sociedade mestiça ou 'mista'.">
Em uma época em que a sociedade japonesa vivia sob forte isolamento, este "mapa universal" procurava mostrar que "os países são diferentes e também as pessoas", como esclarece a parte superior.>
Ele foi elaborado em 1671 e está dividido em duas partes. Uma delas mostra um mapa-múndi e, na outra, há 40 casais, todos formados por um homem e uma mulher.>
Sobre o mapa em si, Bonnett escreve: "A primeira coisa que observamos é que o mundo tem uma orientação incomum. As Américas se encontram no extremo 'norte' e a Ásia, no meio e na parte inferior. Com isso, o Japão fica mais ou menos no centro".>
Mas, sem dúvida, o que chama a atenção é a seleção de casais. Eles representam diferentes nações e etnias, com supostas roupas típicas e dados curiosos, nem todos verdadeiros.>
Existe, por exemplo, um casal de gigantes e outro com nanismo. Estes, segundo o mapa, teriam cerca de 36 centímetros de altura e "sempre caminham em grupo", para evitar que fossem capturados e devorados pelos grous.>
Sobre o casal brasileiro, o mapa diz: "Estas pessoas não moram em casas; eles gostam de morar em cavernas. Comem carne humana." E, "quando uma mulher está a ponto de dar a luz, o homem tem dor de estômago. As mulheres não sentem dor.">
"Parece que diversos destes casais estão ali porque são curiosos e até divertidos", opina Bonnett. "Este é um mapa sobre o outro exótico, visto pelo Japão da época.">
Para o professor, o mapa demonstra que, mesmo quando se tenta isolar um povo do resto do mundo, a curiosidade das pessoas permanece. "Apesar das fortes restrições, o desejo de conhecer o mundo, ampliar a imaginação sobre outros povos e outras terras é insaciável.">
Esta imagem talvez seja a mais simples e eficaz para mudar a forma de pensar das pessoas, como promete o livro.>
Trata-se de um mapa sobre a importância da água, que cobre nada menos que dois terços da superfície da Terra. Em vez de usar a projeção típica, os oceanos estão no centro e os continentes são relegados às bordas.>
"Não existe um oceano Atlântico, um oceano Índico e todos os outros corpos d'água com seus diferentes nomes, indicando implicitamente que estão separados", explica o professor. >
"Na verdade, existe apenas um oceano, mas nós o rotulamos para fazer parecer que ele tem fronteiras políticas.">
O mapa acrescenta outras informações, representando a água com diferentes tons de azul claro e escuro, para mostrar as diferentes profundidades.>
Ele foi criado por uma equipe internacional de especialistas, chamado Carta Batimétrica Geral dos Oceanos (Gebco, na sigla em inglês). Seu objetivo é criar um mapa do fundo do oceano de todo o planeta até 2030.>
Bonnett destaca a quantidade de "interessantes estatísticas neste pequeno capítulo". Elas indicam, por exemplo, que 78% da biomassa animal vive na água e 91% das espécies do oceano ainda não foram descritas pelo ser humano.>
Na sua opinião, "este mapa mostra como é enorme, espaçoso e fértil este ambiente.">
Bonnett afirma que, dos 40 mapas do livro, o que mais recebeu comentários foi o mapa do ruído na Cidade do México, causado pelo tráfego de veículos. "Sua influência foi incrível.">
Criado em 2011 pelos cientistas do Laboratório de Análise e Projeto Acústico da Universidade Autônoma Metropolitana do México, este mapa "passou a ser uma declaração fundamental no campo da acústica ambiental", afirma o professor no seu livro.>
Durante sua entrevista à BBC, Bonnett foi mais além. Ele destacou que o mapa "criou um movimento de resistência em favor da tranquilidade. É um mapa que diz 'chega!'">
De fato, desde a sua publicação, muitos municípios e instituições procuram saber por que sua região tem tantos ruídos.>
Para Bonnett, "qualquer mapa que deseje mudar o debate sobre um tema deve ser entendido de forma fácil e imediata. Este é o caso. Ele revela uma cidade doente.">
"Essas cores febris, essas veias gordas e palpitantes; é uma 'enxaqueca cartográfica'.">
Sua mensagem é que "o ruído arruína as vidas, deixa as pessoas doentes e está em toda parte", segundo o professor.>
Um exemplo: a exposição por oito horas diárias à categoria mais alta de ruídos – acima de 75 decibéis, representada no mapa pelos tons de azul e preto – traz como consequência a perda da audição.>
Este nível de decibéis equivale ao som de um liquidificador, um cortador de grama ou um trem de metrô. E estas máquinas são encontradas por toda a cidade.>
"Mais para o final do livro, existem vários mapas de astrogeografia", prossegue Bonnett. "Para os cientistas espaciais, não são apenas ilustrações, mas sim ferramentas de pesquisa fundamentais.">
O último mapa do livro (nº 40) é um dos favoritos do autor. Ele mostra o superaglomerado de Laniakea. Seu nome vem do idioma havaiano e significa "céu imenso" ou "incomensurável".>
Ele foi elaborado por uma equipe chefiada pelo Instituto de Astronomia da Universidade do Havaí. A imagem mostra as trajetórias migratórias das galáxias impulsionadas pelo Big Bang, formando o que Bonnett descreve como "uma espécie de rio de estrelas".>
Abaixo do pequeno ponto vermelho, ficam a Via Láctea e muitas outras galáxias.>
"É uma imagem extraordinariamente bela", que "define a forma como você pensa sobre tudo", afirma ele.>
Bonnett explica no livro que as galáxias "fazem parte de estruturas maiores. Estruturas como Laniakea. Para saber nosso lugar no universo, precisamos conhecer seus nomes e entender nossa relação com elas.">
Este mapa nos ajuda a entender, por exemplo, que a Via Láctea se desloca a 600 km/segundo, arrastada por outras galáxias do nosso superaglomerado.>
Bonnett reconhece que "se a Via Láctea é grande demais para podermos sequer imaginá-la, Laniakea é muito maior.">
"Algo emocionante surge quando tentamos expandir a imaginação até o horizonte mais distante possível.">
>
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta