Publicado em 23 de abril de 2019 às 02:00
A retirada da censura sobre a revista digital Crusoé e o site O Antagonista por parte do ministro Alexandre de Moraes não foi suficiente para apagar o incêndio criado no Supremo Tribunal Federal (STF) após a polêmica decisão de abrir um inquérito para investigar, sem o aval da Procuradoria-Geral da República, fake news e ataques à Corte .
Esta semana, pela primeira vez após o episódio, os 11 ministros se reunirão em sessão e as apostas sobre como será o encontro estão abertas. Irá a Suprema Corte se pronunciar sobre o caso ou o assunto ficará adormecido no plenário?
O inquérito em questão foi aberto de ofício pelo presidente da Corte, Dias Toffoli, e gerou, fora o debate jurídico, uma discussão sobre liberdade de expressão.
A reportagem que chegou a ser censurada citava o próprio Toffoli, com o apelido de amigo do amigo do meu pai em delação da Odebrecht no âmbito da Lava Jato. Para que a matéria seja discutida pelo plenário do STF é preciso que o próprio presidente da Corte a coloque em pauta. Mas para Vitor Burgo, professor de Processo Civil da FDV, o silêncio é mais provável.
É possível que se paute um processo qualquer e que a sessão flua sem que o assunto desgaste agora um dos ministros. Isso já foi feito nas últimas crises, explica ele. No entanto, Burgo também pondera que o fato de o processo não estar em pauta não impede que os ministros troquem farpas entre si.
O assunto pode vir à tona porque os ministros não se furtam a provocações no curso das sessões e já vimos isso muitas vezes. O ministro Marco Aurélio Mello é um dos que nunca se furtam a falar, diz o professor. Marco Aurélio, inclusive, já criticou publicamente o inquérito aberto por Toffoli.
Para Burgo, no entanto, colocar um ponto final no assunto é fundamental para que a Corte contenha a crise interna que se alastra. Seria ótimo se o tribunal conseguisse dar fim a esse inquérito que persiste e que não é um inquérito na realidade. Só podemos chamar de inquérito aquilo que é enviado pelo Ministério Público ou por autoridade policial. A resposta adequada, correta e republicana seria essa. Mas é também um movimento delicado, pois exporia os dois ministros envolvidos.
Para o professor de Direito Constitucional da Ufes Ricardo Gueiros, o fato de o STF estar no centro das atenções é preocupante. Antes as decisões do Supremo eram notícia. Agora ele próprio passou a ser a notícia, pontua.
PASSIVO
Nesse sentido, Gueiros aponta que um certo recuo do Tribunal é importante para fortalecer a instituição. O STF precisa ser mais passivo, ser ativo somente quando a Constituição o permite. O Poder Judiciário deve ser provocado para atuar e, por isso, deve ser passivo. No momento em que ele se autoprovoca, gera-se um problema, justifica o professor, que também aposta no silêncio dos ministros na sessão vindoura: Como a censura foi revogada, a decisão deixou de ser urgente. Eles devem esperar, até mesmo para que essa celeuma criada seja reduzida, afirma.
MONOCRÁTICOS
Segundo o cientista político e pesquisador da FGV-SP Humberto Dantas, a quantidade de decisões monocráticas por apenas um ministro tomadas pelo Supremo acerca de assuntos importantes mostra uma dificuldade clara de se trabalhar em conjunto, em unidade.
Os ministros são muito vaidosos e têm pouco espírito de corpo. É por isso que eu acho que devemos sempre questionar a Suprema Corte por meio de todas as instâncias para que, talvez, consigamos tentar colocar o país nos eixos, argumenta.
Quanto ao futuro da relação entre o STF e o Ministério Público Federal, Vitor Burgo volta a dizer: tudo dependerá da reação do Supremo. Embora a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, tenha sido sempre cautelosa, essa relação pode se desgastar se o inquérito for mantido. As pessoas acham que o STF, por ser a mais alta Corte, não deveria obedecer ao MPF. Mas não é questão de obediência e sim de competência.
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