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Publicado em 5 de junho de 2025 às 20:50
O Ministério Público do Espírito Santo (MPES) ajuizou Ação Civil Pública, na 1ª Vara de Castelo, em que pede o afastamento de Leia Ringuier Nali do cargo de secretária municipal em duas pastas da cidade do Sul do Espírito Santo. Esposa do prefeito João Paulo Silva (Republicanos), Leia acumula, atualmente, a chefia das secretarias de Turismo e de Esportes no município. >
Um dos principais motivos da representação do MPES, protocolada no último dia 26, é o fato de, conforme o órgão ministerial, a nomeação e manutenção de Leia nos cargos que ocupa na Prefeitura de Castelo "viola os princípios constitucionais da moralidade e da probidade administrativa".>
O MPES frisa na ação que não questiona somente a relação conjugal entre o prefeito e a secretária, mas, sim, a nomeação feita sem considerar que Leia não poderia assumir as secretarias, em função da existência de condenação por crime contra o patrimônio e pela existência de outro processo penal em que ela foi acusada da prática de furto qualificado.>
O retrospecto processual da primeira-dama e também secretária municipal em Castelo, segundo o que aponta o MPES, "compromete gravemente a idoneidade moral da nomeada, configurando abuso do poder discricionário do chefe do Executivo e transgressão aos deveres de probidade que devem nortear a administração pública.">
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Um dos processos a que o MPES se refere começou a tramitar na 2ª Vara de Castelo em dezembro de 2015. Nele, Leia Ringuier foi condenada a um ano e sete meses de reclusão, em 2018, por ter se apropriado indevidamente de valores repassados à empresa em que trabalhava à época. O total desviado chegou aos R$ 24 mil. Os autos transitaram em julgado em janeiro de 2019, sendo arquivados em novembro do mesmo ano.>
O segundo processo citado pelo órgão ministerial no pedido à Justiça é referente a suposto crime de furto qualificado. Uma pessoa com quem Leia Ringuier mantinha relação conjugal a denunciou, em 2016, por supostamente ter usado seu cartão de crédito para se apropriar de valores que chegavam a quase R$ 30 mil. Ela foi absolvida na ação, em setembro de 2018, após o juiz da 2ª Vara de Castelo entender que a então acusada e a vítima mantinham relação matrimonial e dividiam o mesmo teto, o que desconfigurou o furto qualificado alegado. A ação, nesse caso, transitou em julgado em outubro de 2018 e foi arquivada em dezembro do mesmo ano.>
"A moralidade administrativa, como norma jurídica de conteúdo ético-jurídico, exige que o agente público atue não apenas conforme a legalidade estrita, mas também segundo padrões de decência, lealdade institucional e respeito ao interesse público. Já o princípio da probidade impõe conduta íntegra e honesta, sendo incompatível com o exercício de função pública por pessoa condenada por crime contra o patrimônio, especialmente em cargos que envolvem a gestão de recursos públicos e a representação institucional do município", destaca o MPES na ação.
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Na ação, o MPES ainda destaca que, em função do histórico processual, a secretária estaria inelegível, caso pretendesse concorrer a cargo eletivo, nos termos da Lei da Ficha Limpa. >
A norma citada pelo MPES é a Lei Complementar nº 64/90, alterada pela Lei Complementar nº 135/2010. Ela estabelece casos de inelegibilidade para cargos públicos eletivos, prevendo que certas condenações criminais ou irregularidades administrativas podem tornar uma pessoa inelegível por determinado período. Isso visa garantir a probidade e moralidade na gestão pública.>
Inclusive, a Lei Orgânica de Castelo traz dispositivo que diz que as funções de confiança, os cargos públicos comissionados e os empregos públicos de livre nomeação nos Poderes Executivo e Legislativo, bem como nas autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista do município não poderão ser exercidos, nomeados ou designados por aqueles considerados inelegíveis, nos termos do artigo 1º da Lei da Ficha Limpa.>
Ao falar com a reportagem de A Gazeta na noite desta quinta-feira (5), o advogado constitucionalista Flávio Fabiano pontuou não enxergar, nesse caso, fatos que coloquem a nomeação de Leia Ringuier como passível de restrições com base na Lei da Ficha Limpa. Conforme o especialista, no caso da secretária de Castelo, as ações penais de que foi alvo são relacionados a crimes supostamente praticados na esfera privada.>
"Não há implicação de improbidade nesse caso. Os fatos são da esfera privada. No entanto, entra na questão da moralidade, uma vez que a atuação da secretária envolve administração de recursos públicos e seu passado processual pode gerar desconfiança nos moradores", afirmou.>
Para Henrique Zumak, advogado e mestre em Direito Processual, a nomeação da secretária não tem elementos de improbidade administrativa por parte do Executivo. O jurista afirma que o passado processual da secretária não pode ser usado para apontar sua nomeação como ilegal.>
"Eu até concordo que possa existir um desconforto em relação ao passado da secretária e aos atos por ela praticados. Mas, entre o desconforto e a ilegalidade, existe um caminho muito, muito extenso", avalia Zumak.>
Em conversa com a reportagem no início da noite desta quinta-feira (5), o prefeito João Paulo Nali afirmou que a ação ajuizada pelo MPES mira fatos do passado relacionados a sua mulher. O mandatário afirma, inclusive, que as ações penais contra Leia Ringuier já transitaram em julgado e que ela, segundo ele, não possuía restrições para ser nomeada.>
"O Ministério Público está trazendo fatos que fazem parte do passado de alguém que pode ter cometido algum erro, mas que hoje segue sua vida normalmente. Não pretendo exonerar e nem afastar uma pessoa que tem feito um trabalho brilhante na cidade", disse João Paulo Nali.>
Sobre o que afirma o prefeito acerca do tempo e dos efeitos das condenações aplicadas à mulher, o MPES, na ação, afirma:>
"O prefeito também sustenta que já se passaram mais de nove anos desde a condenação criminal de sua esposa, razão pela qual ela não poderia suportar indefinidamente os efeitos de erro cometido no passado. Tal alegação, contudo, não corresponde à realidade processual. A sentença condenatória foi proferida em 28/09/2018, conforme documento juntado aos autos, ou seja, há menos de sete anos", assevera o órgão ministerial. >
O MPES ainda chama a atenção para o fato de a secretária, atualmente, ser a gestora do Fundo Municipal de Cultura da cidade, ficando responsável por gerir valores destinados aos desenvolvimento cultural do município. O órgão ministerial diz enxergar risco de mau uso dos recursos, tendo em vista o histórico processual de Leia Ringuier.>
A respeito desse ponto, o prefeito sustenta que a alegação do MPES não procede, uma vez que, segundo ele, a secretária atua como fiscal do Fundo de Cultura, sem ter qualquer autonomia para movimentar os recursos aplicados nele.>
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