Colunista de política / [email protected]
Publicado em 12 de julho de 2019 às 23:59
- Atualizado há 6 anos
O país já tem 33 partidos e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) registra: há outros 75 em formação. Se todos vão mesmo sair do papel é outra história, mas com tantas agremiações, por que criar mais legendas?>
Aliás, tem partido que já existiu e agora pode voltar à cena política. Entre os 75 está a União Democrática Nacional (UDN), cujo expoente maior foi o conservador Carlos Lacerda. A UDN, como demais siglas da época, foi extinta em 1965 pelo Ato Institucional nº 2, da ditadura militar. Ironicamente, Lacerda havia apoiado o golpe de 64.>
A Arena (Aliança Renovadora Nacional), que surgiu justamente em 1965 e deu suporte ao regime, é outra que está na lista.>
Mas há também o Animais que, como o nome sugere, quer atuar em defesa da causa animal, e outros mais curiosos, como o PNC (Partido Nacional Corinthiano) e o Piratas (Partido Pirata do Brasil). >
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Em resposta à pergunta feita no primeiro parágrafo, Alexandre Magno Andrade Gorga, presidente do Animais, diz que nenhum partido hoje representa a causa. Daí a necessidade de fundar a nova agremiação. “Há alguns deputados, prefeitos e vereadores que têm simpatia pela causa animal. Mas não tem um partido”, afirma.>
Questionado por que não apenas filiar-se a um deles para mudar esse quadro, ele rebate: “É muito difícil, é um jogo de cartas marcadas. Se entrássemos seríamos apenas para cumprir cota, não teríamos espaço”.>
Para criar um partido são necessárias cerca de 500 mil assinaturas de apoio distribuídas em ao menos nove Estados. O presidente do Animais diz que o grupo “colocou o pé no freio” recentemente, mas quer continuar o processo de coleta de apoio.>
UDN>
Bem mais acelerado está o processo da UDN, pelo menos é o que diz o capixaba Marcus Alves que, de acordo com o site do TSE, é o presidente nacional da legenda em formação.>
“Já temos as 500 mil assinaturas, queremos 600 mil”, conta. Ele diz que a UDN vem representar “o novo”, mas com os valores da velha UDN: “É liberalismo econômico, conservadorismo e combate à corrupção”.>
“E também vamos focar. Vai ter UDN Sindical, UDN Mulher, UDN Terceiro Setor”, elenca. O próprio Alves já esteve sob suspeita num caso de rachid envolvendo um funcionário da Assembleia Legislativa, mas o caso foi arquivado pela Polícia Civil por falta de provas. “Não vale nem a pena falar disso”, diz.>
O dirigente da UDN em formação também já integrou, por mais de uma década, o PRP no Espírito Santo. E conseguiu levar a legenda a alguma relevância no cenário local, com a eleição de até três deputados estaduais. Nacionalmente, no entanto, o partido não prosperou e acabou fundido ao Patriota. O PRP, tanto lá quanto cá, carecia de identidade programática e sucumbiu à cláusula de barreira.>
Alves avalia que poucos entre os 75 partidos em formação irão à frente, incluindo uma outra UDN, a União para a Defesa Nacional.>
Mas dentro da própria e incipiente União Democrática Nacional já há desunião. O advogado Marco Vicenzo também se diz presidente do partido em formação. A reportagem não conseguiu contato com ele, mas à revista “Veja”, Vicenzo reafirmou-se como presidente da legenda a ser criada, alegando que “o registro cartorial não garante a ninguém o comando da sigla”.>
O objetivo dele é filiar o presidente Jair Bolsonaro e outros integrantes do clã. Já Marcus Alves prefere não mencionar nomes. Vicenzo também pediu ao TSE a simples anulação dos atos administrativos decorrentes do AI-2 e o restabelecimento da resolução de 1945 que deferiu o registro da UDN.>
Enquanto isso, o Paco (Partido dos Conservadores) corre por fora. O vice-presidente Elton Bernardes diz que a sigla “é mais para a direita” e tem “um bocado de assinatura”. O Paco pode, no entanto, somar-se à UDN. “Eles estão atrasados em relação a nós, mas continuamos conversando”, diz Bernardes.>
"QUASE IMPOSSÍVEL">
Coletar assinaturas de apoio é apenas uma das etapas para se criar um partido no Brasil. E há um prazo de dois anos para que o processo burocrático seja concluído, incluindo a comprovação dos apoiamentos.>
Isso, além da exigência de que as assinaturas não sejam de pessoas já filiadas a algum partido, aumentou a dificuldade, avalia o advogado eleitoral Marcelo Nunes. Antes não havia limite de tempo.>
Essas regras estão estabelecidas em resolução de 2018 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e baseiam-se na minirreforma eleitoral, aprovada em 2015. As assinaturas também têm que ser validadas pelos cartórios eleitorais. E nem sempre passam pelo teste.>
“Atualmente é quase impossível você registrar um partido. Você tem que ter um apoio político muito grande, movimentar muitas pessoas, muitos recursos financeiros. A maioria dos partidos em formação já perdeu o prazo e não vai conseguir esses registros”, afirma.>
E tem outro aspecto. Até recentemente, as chamadas legendas de aluguel, partidos fisiológicos que têm como prática a negociação de tempo de propaganda de TV e rádio e recursos dos fundos partidário e eleitoral, tinham vida fácil. A cláusula de desempenho, que condicionou os repasses à proporção de votos obtidos pelos partidos na eleição para a Câmara dos Deputados, mudou esse quadro. Assim, o número de partidos diminuiu, de 35 para 33, com a realização de fusões. E deve diminuir ainda mais.>
“A criação de partidos hoje está na contramão. A tendência é diminuir e não aumentar”, complementa Nunes.>
Cientista político e presidente da Transparência Partidária, Marcelo Issa diz que ter um elevado número de partidos não é, em si, um problema. “Pouca gente sabe, mas nos Estados Unidos e na Europa existem centenas de partidos registrados formalmente. O problema não é a criação ou registro oficial de partidos. E sim a falta de incentivos para a constituição de partidos programáticos associada ao incentivo para constituição de partidos fisiológicos”, argumenta.>
“Nos últimos 15, 20 anos, o que se viu foi uma proliferação de partidos sem respaldo social, sem ressonância num grupo social significativo, em função dos incentivos postos, como o recebimento de recursos do fundo partidário mesmo sem representação no Congresso. Em boa hora veio a cláusula de desempenho para restringir o recebimento de recursos públicos”, diz, ainda, Marcelo Issa.>
“É importante que haja, ao mesmo tempo, mecanismos institucionais de estímulo à transparência, à equidade, à integridade e à democracia interna dos partidos. Isso de modo que eles sejam estimulados a serem mais programáticos e menos fisiológicos”, complementa.>
“Desses 75 que pedem registro, sobreviverão aqueles que efetivamente tenham projeto político e alguma capilaridade na sociedade”, acredita o cientista político.>
ASSINATURAS>
Quem acessa o site do TSE pode ver também a quantidade de assinaturas de apoiamento que o partido em formação já obteve. É comum a exibição do número zero. E mesmo a UDN de Marcus Alves apresenta números bem mais tímidos do que as mais de 500 mil assinaturas apregoadas.>
Não quer dizer, no entanto, que elas não existam. De acordo com o próprio TSE, os apoiamentos aparecem “zerados” em três situações: quando ainda não foram colhidas as assinaturas; quando as assinaturas foram colhidas e os apoios enviados pelo sistema, mas as fichas físicas não foram encaminhadas para os cartórios para análise; quando, após o envio das fichas para os cartórios, os apoios ainda não foram analisados.>
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