Publicado em 8 de agosto de 2018 às 01:22
Separados por mais de 3 mil quilômetros, os moradores de Espigão do Oeste (RO) e de Vila Pavão, Noroeste do Estado, compartilham cultura, raízes e pessoas. Esse trânsito intenso entre as duas cidades pode ter contribuído para a propagação de malária no município capixaba e em sua vizinhança.>
A suspeita ainda não foi confirmada, mas governo e especialistas citam o frequente movimento de pessoas entre Rondônia, onde a malária é endêmica, e a região Noroeste do Espírito Santo como uma das prováveis formas de introdução da doença. Aqui isso é comum. Há esse fluxo de pessoas que visitam parentes. A grande suspeita é de que de fato tenha vindo daquela região, até porque aqui não havia casos há anos, afirmou o prefeito de Vila Pavão, Irineu Wutke.>
É na cidade pavoense que se concentra a maior parte dos doentes de malária, 62. Os outros 18 foram identificados em Barra de São Francisco, município vizinho. Uma pessoa morreu.>
Cidades-irmãs por decreto, Espigão do Oeste e Vila Pavão separam famílias e amigos que, frequentemente, se visitam. A comerciante Iracy Foerste, 51, perdeu a conta de quantas vezes viajou. Quando era mais nova, ia todo ano. Era nossa viagem de férias. A família dos meus pais mora toda lá.>
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Como Iracy, boa parte dos moradores da cidade têm parentes na região Norte do país. Com a crise do café no final dos anos 1970, cerca de mil famílias deixaram Vila Pavão e foram se instalar no Norte do país, principalmente em Espigão do Oeste. Na época, três paus-de-arara por semana passavam levando o pessoal para lá. As pessoas se despediam nas ruas, era uma choradeira danada, relata o sociólogo Jorge Kuster Jacob, que estuda a relação cultural entre as duas cidades. Por conta da imigração, Espigão do Oeste, em Rondônia, segue várias tradições pomeranas, como cerimônias, danças e festas.>
Jorge, que também tem a família separada entre os dois estados, afirma que já foi para Rondônia seis vezes. Pouca gente que foi naquela época, voltou. Hoje em dia o que acontece é mais de as pessoas visitarem os parentes, diz.>
A viagem, ofertada semanalmente em ônibus, custa cerca de R$ 1,2 mil e dura três dias. Iracy conta que, quando estava por lá, soube de um tio com malária e não foi visita-lo. Estava grávida e fiquei com medo. Lá era normal a gente ver as pessoas com malária. Quando apareceu aqui fiquei até com medo, relatou.>
Como a mãe dela, de 71 anos, voltou de Espigão do Oeste há 20 dias, foi direto para o posto de saúde fazer o teste. Antigamente, tinha uma pessoa que vinha na casa da gente testar o sangue quando alguém voltava do Norte. Depois nunca mais vi, lembra Iracy.>
Conhecido como malaieiro, o personagem descrito por Iracy era um funcionário federal da extinta Sucam (Superintendência de Campanhas de Saúde Pública) , que trabalhava como um vigilante da malária, evitando que a doença se espalhasse. Eles passavam de tempos em tempos onde havia transmissão da malária. Mas isso parou de fazer sentido porque não havia mais casos, esclarece o infectologista Crispim Cerutti Junior.>
O prefeito de Vila Pavão admite que, com a guarda baixa, a cidade ficou vulnerável ao surto de malária. Essas figuras que eram comuns, que iam atrás das pessoas, não existem mais. Talvez isso possa ter facilitado esse retorno, afirma.>
Demandada pela reportagem, a Secretaria de Estado da Saúde afirmou que não há recomendação da Anvisa para controle de circulação de pessoas entre os Estados do país.>
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