Publicado em 12 de maio de 2018 às 22:53
Destino bastante procurado no verão, a praia principal de Piúma, no Sul do Estado, está praticamente em ruínas por causa da erosão costeira. Calçadas e ciclovias foram destruídas. Em um trecho de aproximadamente 500 metros, parte do asfalto da avenida cedeu. O município decretou situação de emergência, mas ainda sem dinheiro em caixa, não tem previsão de iniciar obras de contenção do avanço do mar.>
Além de Piúma, A Gazeta percorreu as principais praias do Litoral Sul do Estado: Marataízes, Anchieta e Guarapari. Vila Velha também entrou no roteiro, no trajeto que passa pela rodovia ES 060. Em todos esses locais, o problema da erosão é um drama para motoristas, ciclistas, moradores com casas próximas à orla e comerciantes que dependem do turismo. Soluções definitivas também estão longe de acontecer, já que elas requerem dinheiro que as prefeituras alegam não possuir.>
Com a erosão atingindo a avenida principal de Piúma, pedestres e ciclistas dividem espaço com os carros. O comerciante e morador Silvano Santos, 43, já presenciou acidentes na orla e diz que a erosão se intensificou há 20 dias. Se a prefeitura não tomar uma providência, a tendência é piorar mais,diz.>
ANCHIETA>
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Em Ponta de Castelhanos, Anchieta, os moradores reclamam das soluções paliativas que não resolvem o problema. Em uma das ruas, os carros não passam mais e a tubulação de água e esgoto fica exposta.>
Alguns moradores colocaram os imóveis à venda. A água está chegando às casas. Já colocaram pedras há três anos e depois não foi feito nada. Sabemos que uma obra maior demora, mas algo tem que ser feito, diz Paulo Henrique Barbosa dos Santos, vice-presidente da associação de moradores da região.>
O oceanógrafo e pesquisador da Ufes Leonardo Azevedo Klumb Oliveira explica que a erosão é um processo de perda de sedimentos ou seja, pedaços de rochas nas áreas costeiras. Segundo ele, esses sedimentos se movem nas praias, já que são retirados e repostos pelas ondas de acordo com a intensidade em cada estação do ano.>
Em épocas em que as ondas são mais fortes, como outono e inverno, a tendência é que retirem sedimentos da praia emersa que não está coberta por água e depositem na região submersa, logo adjacente à praia. Parece que a praia está emagrecendo, mas quando essas ondas altas vão embora, as ondas normais pegam esses sedimentos da região submersa e depositam na região emersa, explicou.>
O pesquisador esclarece que a erosão acontece quando os sedimentos não são repostos. O problema é agravado onde ocupações habitacionais próximas à praia interrompem o processo natural de movimento de sedimentos. Com isso, a praia começa a ter perda gradativa de areia e o alcance das ondas do mar é maior.>
A erosão ocorre quando essas ondas ou outro processo associado retiram sedimentos na praia emersa e os depositam em profundidades muito grandes que não conseguem retornar quando o tempo fica bom, conclui o pesquisador.>
O que também agravou a erosão no litoral foi a incidência de eventos meteorológicos, como tempestades em dias de maré alta.>
SEM DINHEIRO>
Piúma decretou situação de emergência no dia 19 de abril para acelerar o recebimento de recursos do governo estadual para realizar obras. Diz ter projeto de recuperação da orla, mas ainda não tem dinheiro em caixa. Afirmou também que iniciou planejamento emergencial com a compra de material de sinalização da área destruída, para evitar acidentes.>
Já a Prefeitura de Anchieta informou que está empenhada para a construção de um muro de contenção na Ponta dos Castelhanos. Segundo a secretaria de Infraestrutura, o custo da obra é muito elevado, e por conta da crise financeira, não tem condições de arcar com o valor. E que o governo do Estado se comprometeu em liberar recursos para a obra.>
Por sua vez, a secretaria Estadual de Saneamento, Habitação e Desenvolvimento Urbano (Sedurb) informou que está em fase de análise técnica do projeto da Prefeitura de Anchieta para construção do muro e que, assim que for finalizado, um convênio será firmado para o repasse do recurso.>
GUARAPARI: MAR ALCANÇOU MURO DE PRÉDIO>
Em Praia do Riacho , em Guarapari, a erosão destruiu uma rua, e água do mar chega perto do muro de um prédio de 12 andares. A prefeitura informou que começou a construção de um muro de arrimo de 140 metros para resolver o problema no local.>
Em Ponta da Fruta, Vila Velha, a erosão destruiu muros e danificou residências que precisaram ser interditadas pela Defesa Civil. Questionada pela reportagem, a prefeitura informou que iniciou levantamentos necessários para melhorar a infraestrutura do local.>
Marataízes: aterro de pedras não resolve o problema>
Em Marataízes, o problema histórico de erosão continua a causar preocupação. Na Praia da Barra, parte de uma rua foi destruída e postes de iluminação foram retirados. Em Lagoa Funda, assim como em diversos locais da cidade, a prefeitura colocou pedras para conter o avanço do mar, e as faixas de areia desapareceram. Especialistas afirmam que a ação não resolve a erosão que pode se intensificar.>
Morador da Praia da Barra, o pedreiro José Rosa Neto, 62, diz que a erosão começou em dezembro do ano passado. Aqui é uma curva e quase houve uma batida por causa do buraco. Se tiver outra chuva forte vai cair mais, reclamou o pedreiro.>
Em fevereiro, os moradores de Lagoa Funda fizeram protestos por causa da erosão. Um quiosque foi destruído e algumas pessoas deixaram suas casas com medo.>
Em 2011, o governo do Estado construiu um píer na Praia Central que conseguiu conter a erosão. Mas moradores apontam que isso provocou o problema em outros bairros. Em frente à minha pousada tinha uma rua, depois uma faixa de restinga de sete metros e mais a faixa de areia. Hoje, não tem nada, conta Tânia Fontoura, dona de uma pousada que não recebe mais clientes no bairro.>
Tânia afirma que a Prefeitura de Marataízes foi omissa pois deveria ter acompanhado o processo do avanço do mar nos demais bairros, já que a construção do píer na Praia Central afetaria o movimento de sedimentos próximo a seu bairro.>
PESQUISA>
Segundo o oceanógrafo e pesquisador da Ufes, Leonardo Azevedo Klumb Oliveira, a intervenção na Praia Central pode estar relacionada com a erosão no bairro de Tânia. Entretanto, é preciso ter certeza do sentido da corrente marítima que predomina. A gente está falando de uma construção ao norte e uma erosão ao sul. Tem dois eventos meteorológicos que induzem e é preciso saber qual ganha: a que acontece o ano inteiro, por corrente marítima do norte para o nordeste, ou das tempestades de outono e inverno de maior força.>
PEDRAS>
Para a coordenadora do curso de Oceanografia da Ufes, Jacqueline Albino, as pedras e estruturas duras, como muros feitos para conter as ondas não são soluções. Elas podem ainda fazer com que as praias desapareçam, pois a onda bate e não tem mais espaço para se dissipar e volta com mais força, tomando mais areia.>
A pedra vai receber a onda, mas ela não só bate, ela vem por baixo junto com o lençol freático. A areia sai de baixo e as pedras caem. A condição da praia fica pior, porque elas estão em cima de areia que está se mobilizando.>
A Prefeitura de Marataízes informou que o serviço de contenção da erosão na Praia da Barra com pedras foi realizado pela gestão anterior. Na atual, foi feito um trabalho de calçamento e reconstrução do calçadão. O setor estuda ações que devolvam a balneabilidade no local, porem esbarra na falta de orçamento. A administração municipal não comentou as declarações da moradora de Lagoa Funda.>
AREIA PODE SER REPOSTA>
Pesquisadores do laboratório de Oceanografia Geológica da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) afirmam que existem soluções para os problemas de erosão que atingem o Litoral Sul. Porém, são necessários estudos aprofundados para depois propor ações. Uma delas é o engordamento artificial das praias, com a reposição da faixa de areia que protege a costa.>
O oceanógrafo e pesquisador da Ufes Leonardo Azevedo Klumb Oliveira explica que a pesquisa é necessária para programar esse possível processo nas praias da região. Tem que investigar as jazidas. Verificar qual areia é compatível com a energia local. Se coloca uma areia mais fina, ela não vai ficar. O engordamento talvez seja uma ação mais eficiente. Você volta a ter praia que protege a costa. O mar vai retrabalhar a areia que for colocada ali e aos poucos a coisa vai entrar em equilíbrio.>
Os pesquisadores explicam que a região possui áreas que naturalmente têm poucos sedimentos, praias planas e muitas ocupações habitacionais. Situações que contribuem para o processo erosivo.>
As praias do Litoral Sul, são diferentes da região do Rio Doce, têm menos sedimentos. Você tem litorais com falésias vivas (onde o mar bate diretamente). As falésias refletem poucos sedimentos para o sistema costeiro, explica a coordenadora do curso de Oceanografia da Ufes, Jacqueline Albino. >
A coordenadora destaca, ainda, que as praias planas do Sul contribuem para a formação de dunas frontais, e que ocupações habitacionais nesses locais aceleram o processo de erosão, como aconteceu em Ponta da Fruta, em Vila Velha, problema agravado em uma época de eventos mais frequentes de tempestades e chuvas.>
Muitas dessas ocupações se deram em cima das dunas frontais. Elas seriam protetores naturais para a variação de eventos de maior energia como as tempestades e frentes frias. O que temos no lugar são estruturas rígidas, que quando a onda bate, volta com mais força, ressalta.>
A coordenadora destaca que os eventos meteorológicos, como as tempestades aconteceram em dias de lua cheia e lua nova, períodos de maré alta. As piores erosões são de períodos de marés cheias, porque sobe o nível do mar. Aí você tem maré cheia com as tempestades, afirmou.>
Outro exemplo são ocupações próximas às falésias, como a rodovia ES 060, onde parte da ciclovia cedeu em um trecho, na localidade de Porto Grande, em Guarapari. Lá, as ondas batem diretamente nas pedras colocadas pelo Departamento de Estradas e Rodagem do Espírito Santo (DER) para conter a erosão. Ação que, segundo especialista, é paliativa, pois os sedimentos por baixo do paredão são retirados pelas ondas e as pedras caem.>
O DER informou que técnicos do órgão estão monitorando o local constantemente, que o trecho está sinalizado e que não há riscos para o tráfego de veículos na região. Disse ainda que está sendo estudada a melhor forma para recuperar o local.>
PESQUISAS>
Jacqueline coordena na Ufes dois projetos de pesquisa costeira no Espírito Santo: um sobre erosão, movimento de sedimentos e seus tipos, nas praias de Marataízes e Presidente Kennedy, e outro relacionado a mudanças climáticas, nas praias de Marataízes e Comboios, em Linhares, feito em parceria com o Instituto Geológico da Universidade de São Paulo (USP), e pesquisadores de Cantábria, na Espanha, com o objetivo de prever como esses locais responderão nos próximos 100 anos às alterações do clima.>
A pesquisa busca identificar locais com erosão, pontos mais suscetíveis, e como se dá a distribuição das ondas. Descobrindo isso fazemos o levantamento do tipo de areia que as praias têm, para apontar soluções. Fazemos ainda o levantamento de potenciais jazidas de areia, para futuramente recompor as praias afetadas, afirma Jacqueline sobre o trabalho realizado em Presidente Kennedy e Marataízes.>
A pesquisa sobre o movimento de sedimentos apresentou o primeiro resultado, que é a descoberta de buracos ao longo da costa de Marataízes. Leonardo afirma que os buracos podem aprisionar os sedimentos que voltariam para a costa.>
Esses buracos podem dificultar o retorno desse sedimento. Há um buraco de 19 metros e depois um banco de areia. Isso tem que ser avaliado para ver a contribuição para o processo erosivo, disse o pesquisador.>
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