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Venda da Codesa: empresas e Ministério Público questionam modelo de privatização

Venda da Codesa: empresas e Ministério Público questionam modelo de privatização

Em parecer enviado ao TCU, procurador Júlio Marcelo disse ver falta de transparência no processo e pediu que sejam realizadas novas audiências públicas. TCU informou que o processo está pautado para sessão desta quarta (8). Entenda

Publicado em 8 de dezembro de 2021 às 08:15

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Prevista para março ou abril de 2022, a desestatização da Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa) ainda gera uma série de questionamentos. Para que o edital seja publicado e o leilão possa ocorrer, é preciso que Tribunal de Contas da União (TCU) aprove o edital. Entretanto, o Ministério Público  de Contas da União e outras instituições têm apontado inconsistências no processo de privatização.

A manifestação do MP é a última etapa antes de o processo ser levado a plenário, o que está previsto para acontecer na tarde desta quarta-feira, 8 de dezembro.

Em parecer enviado ao TCU na semana passada, o procurador Júlio Marcelo disse ver falta de transparência no processo e pediu que sejam realizadas novas audiências públicas.

Armazéns da Codesa no Cais Comercial do Porto de Vitória
Armazéns da Codesa no Cais Comercial do Porto de Vitória. (Codesa/Divulgação)

Não é a primeira vez que a desestatização da companhia é questionada. Em outubro, o TCU afirmou ter encontrado erros nas planilhas enviadas ao órgão referente ao processo de privatização da Codesa.

Uma equipe de auditoria constatou que o valor econômico do contrato (direito de outorga), após as diversas modificações realizadas na versão final da avaliação econômico-financeira, passou por alterações de aproximadamente 1/3 de seu valor original, passando de R$ 719,5 milhões para R$ 471,6 milhões. A análise do processo chegou a ser suspensa temporariamente diante da situação, conforme noticiou A Gazeta.

A Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes) também encaminhou ao TCU documento em que questiona uma subestimativa de demanda nos estudos oficiais, que pouco consideram os eventuais resultados de alocação de cargas no corredor logístico Centro-Leste e a influência do sistema ferroviário no processo de desestatização da Codesa, sobretudo pela possibilidade de prorrogação antecipada da Ferrovia Centro-Atlântica (FCA).

Para o procurador do Ministério Público, são duas as irregularidades que, se não forem sanadas, tornam “inadmissível” o andamento da concessão. Uma delas está relacionada à falta de transparência e a necessidade de novas audiências públicas. Outra seria a suposta falta de fundamentação para o modelo adotado nas privatizações dos portos.

A Codesa administra os Portos de Vitória e de Barra do Riacho, em Aracruz. A desestatização, prevista para o próximo semestre, será o primeiro leilão de uma estatal do setor portuário e servirá como um tipo de “teste” para outras companhias de docas pelo Brasil. Ele seguirá um modelo híbrido de administração portuária, até então pioneiro no país, que é adotado atualmente em países como Austrália e Inglaterra.

PROVIDÊNCIAS PARA CORRIGIR MODELO

O procurador Julio Marcelo ressalta em seu parecer que, na Austrália, “está ocorrendo crescente repasse de custos para o setor de transporte de contêineres local e o aluguel de espaços na orla marítima continua aumentando durante esta nova era de propriedade do 'porto privado'”, o que tem comprometido a capacidade dos arrendatários de fechar novos contratos e impactado os preços dos produtos aos consumidores finais. As informações foram divulgadas pelo Estadão.

Julio Marcelo pontua que o governo federal não está adotando providências para corrigir o modelo australiano. “A opção, ao contrário, talvez em função da evidente pressa dos agentes governamentais, cuja causa o MP de Contas desconhece, está sendo a de copiar algo que, notoriamente, apresenta sérias falhas na Austrália”, disse.

Essa “pressa” é questionada também pelo Sindicato dos Operadores Portuários do Estado do Espírito Santo (Sindiopes). O presidente da entidade, Roberto Garofalo, que também é um dos coordenadores do Fórum Permanente Portuário de Desestatização da Codesa, destaca que nunca houve um diálogo real com o governo e que os procedimentos envolvendo a privatização da Companhia Docas no Estado ainda estão pouco claros.

“Ficamos chateados com a forma que o processo de privatização foi conduzido, houve pouca transparência e ainda resta dúvida se o modelo apresentado é mesmo o melhor. Entendemos que nenhum empresário fará um investimento pouco vantajoso, mas aceleraram o processo, não nos ouviram com a atenção devida, e nem mesmo discutiram corretamente conosco.”

Questionado se há intenção de acolher os pedidos do Ministério Público, o TCU informou somente que o processo “está pautado para sessão plenária desta quarta-feira (8), com início às 14h30”. A transmissão, que é pública, poderá ser acompanhada pelo canal do TCU no YouTube.

Caso Dantas acolha os pedidos, o governo terá de realizar novas audiências públicas para o projeto e entregar documentos que embasem suas decisões. O procedimento pode atingir o cronograma da privatização.

Questionada sobre o caso, a Codesa esclareceu que a resposta cabe ao Ministério da Infraestrutura. A pasta, por sua vez, ressaltou, em nota, que a entrega do parecer do procurador junto ao TCU encerra mais uma etapa do processo, permitindo que a desestatização da Codesa entre em discussão pelo plenário.

“Destacamos que ocorreram diversas reuniões entre as equipes técnicas do Ministério da Infraestrutura, da Codesa, do BNDES, da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) e do TCU desde agosto de 2021, quando o projeto foi entregue à corte de contas. O objetivo foi auxiliar os técnicos do Tribunal a compreender melhor o modelo proposto e suas regras, bem como no esclarecimento de eventuais dúvidas.”

O Ministério informou ainda que a equipe do TCU realizou diligências específicas para esclarecimento da proposta de desestatização, tendo sido identificadas oportunidades de melhoria da modelagem. “Essas melhorias foram gradativamente incorporadas ao modelo e apresentadas aos técnicos do tribunal conforme evolução das discussões sobre o tema.”

RELEMBRE DETALHES DA PRIVATIZAÇÃO DA CODESA

Em agosto, o governo federal publicou o edital de concessão da Codesa, prevendo que o leilão ocorresse ainda em novembro deste ano. Contudo, o prazo foi estendido e, atualmente, a previsão é o primeiro trimestre do ano que vem, segundo o Ministério da Infraestrutura.

Desde o início das discussões, o processo de desestatização da Codesa definiu um modelo híbrido, com a privatização da empresa em conjunto com a concessão do Porto de Vitória e do Terminal de Barra do Riacho, em Aracruz. No mesmo leilão, o investidor vai arrematar os dois ativos, diferentemente do que aconteceu com os aeroportos em que apenas as concessões foram tratadas nos processos. No caso da Codesa, foi uma opção do governo incluir a venda da companhia no processo em vez de extingui-la.

Manobra de navio carregado com containers no Porto de Vitória
Manobra de navio carregado com containers no Porto de Vitória. (Vitor Jubini)

Além da cifra desembolsada no processo de aquisição da companhia e de autorização para exploração dos portos, a concessionária deverá arcar com um investimento obrigatório no porto, estimado em aproximadamente R$ 800 milhões, que incluem serviços de dragagem de manutenção, reforma dos berços 206 e 905, reforma dos acessos ferroviários e operação e manutenção de VTMIS e sistema de sinalização náutica.

Estudos preveem que, com a desestatização, as receitas dos portos quadrupliquem durante o período de concessão. O BNDES estima que a receita líquida da Codesa deve saltar de cerca de R$ 170 milhões no primeiro ano, para R$ 710 milhões ao final de 35 anos.

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