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Mulher de prefeito do ES recebe auxílio emergencial. Marido tem salário de R$ 12,9 mil

Mulher de prefeito do ES recebe auxílio emergencial. Marido tem salário de R$ 12,9 mil

Regra do governo diz que beneficiário precisa ter renda familiar de até três salários mínimos (R$ 3.135). Entenda

Publicado em 21 de julho de 2020 às 11:20

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Luciene Trevizani Dalmonte e o marido dela, o prefeito Pedro Amarildo Dalmonte, conhecido como Pedro Pão. (Reprodução/ Redes Sociais )

O auxílio emergencial de R$ 600 foi criado para ajudar desempregados, informais que perderam renda e que passam dificuldades durante a pandemia do novo coronavírus. Mas, em São Domingos do Norte, no Noroeste do Espírito Santo, a primeira-dama, Luciene Trevizani Dalmonte, teve acesso ao recurso, criado para atender famílias em vulnerabilidade social.

Ela confirma ter sido contemplada pelo pagamento por ser microempreendedora individual, mas alega ter usado o dinheiro para doações. Na tarde desta terça, ela divulgou uma nota pedindo desculpas e disse que devolveu o dinheiro ao governo federal.

Apesar do MEI ser um dos públicos-alvo do programa de renda mínima emergencial, regras do governo federal também estabelecem critérios de remuneração mensal para definir quem tem ou não direito.  O marido dela, o prefeito Pedro Amarildo Dalmonte (PMN), conhecido como Pedro Pão, tem um salário-base de R$ 12,9 mil, segundo o Portal da Transparência.

Site da Caixa mostra quem não tem direito ao auxílio emergencial. (Site da Caixa/Reprodução)

Em abril, mês de pagamento da primeira parcela dos R$ 600, o político teve um vencimento de R$ 14.077,84, de acordo com dados públicos. O site da prefeitura ainda mostra que o representante da cidade tem pagamentos líquidos superiores a R$ 9 mil.

Os dados do auxílio emergencial constam no Portal da Transparência do governo federal, mantido pela Controladoria-Geral da União (CGU). O sistema disponibiliza a lista de beneficiários e as parcelas pagas. 

Portal da Transparência mostra nome da primeira-dama de São Domingos do Norte como beneficiária do auxílio emergencial. (Portal da Transparência/Reprodução)

Embora o Portal da Transparência do governo federal traga apenas uma parcela paga à primeira-dama, procurada pela reportagem de A Gazeta, Luciene confirmou que recebeu duas parcelas do benefício, totalizando R$ 1.200, e afirmou que, na sua visão, se enquadra nos critérios para receber o benefício já que é MEI.

Ela afirmou que trabalha com vendas no setor de frios e laticínios e comercializa vestuário e semijoias. “Eu sou microempreendedora, pago meus impostos mensalmente e declaro Imposto de Renda todo ano”, afirmou a primeira-dama.

Primeira-dama anuncia venda de roupas nas redes sociais . (Reprodução/ Redes Sociais )

Questionada se achava justo receber o auxílio, a primeira-dama afirmou que não enxerga nenhum problema já que o cadastro dela foi aprovado pelo governo federal.

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Eu sou microempreendedora, passei por uma análise, se eu passei por essa análise eu acho justo ter recebido. Eu pago meu imposto e faço minha declaração de renda. Se o governo tem essas informações e mesmo assim eu passei pela análise, eu acho que não estou usando o dinheiro para má coisa não

Luciene Trevizani Dalmonte
Primeira-dama de São Domingos do Norte 
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PRIMEIRA-DAMA AFIRMA QUE FEZ DOAÇÃO COM OS VALORES RECEBIDOS DO AUXÍLIO EMERGENCIAL

Luciene afirmou que usou os valores recebidos no auxílio emergencial, segundo ela, duas parcelas de R$ 600, para comprar donativos para famílias em risco social do município.

Luciene Trevizani Dalmonte e o marido, prefeito de São Domingos do Norte, Pedro Pão
Luciene Trevizani Dalmonte e o marido, prefeito de São Domingos do Norte, Pedro Pão . (Reprodução/ Redes Sociais)
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Eu comprei cestas básicas, roupas de cama, leite e fraldas para doar para famílias. Nós temos um grupo de oração aqui, e como é pedido nesse grupo, eu peguei esse valor e comprei essas coisas que precisava

Luciene Trevizani Dalmonte
Primeira-dama de São Domingos do Norte
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ESPECIALISTA DIZ QUE RENDA FAMILIAR TEM QUE SER RESPEITADA

O advogado especialista em Direito Material, Trabalhista, Processual, Tributário e Constitucional, Henrique Fraga explicou que os empresários inscritos no MEI estão elegíveis para ter acesso ao do auxílio emergencial. Mas apenas isso não é um critério válido para receber o benefício. É preciso ainda se enquadrar em outros pré-requisitos. Entre eles, o advogado também cita a questão da renda familiar mensal. 

“O  microempreendedor individual pode receber caso se enquadre em todas as condições de elegibilidade. Esses requisitos estão na lei e são de conhecimento público, foram divulgados amplamente pelo governo e por canais de imprensa. Caso a pessoa tenha algum impedimento, ela precisa ter consciência de que receber esse benefício é ilegal”, explicou o especialista.

O advogado explicou ainda que quem ganha indevidamente o valor está sujeito a devolver o dinheiro e pode ser enquadrado por práticas criminosas.

“Quem não tem direito a receber o auxílio já é barrado pelo próprio sistema, que identifica que a pessoa não se enquadra nos critérios determinados pelo governo. Mas tem gente tentando receber o dinheiro mentindo ou omitindo informações”, afirmou o advogado.

O QUE DIZ O GOVERNO FEDERAL

A reportagem de A Gazeta demandou o Ministério da Cidadania, responsável pelo auxílio emergencial, e a Controladoria-Geral da União, que tem investigado pagamentos indevidos do recurso. 

Em nota, a CGU disse que "os valores apresentados no Portal da Transparência do governo federal, na consulta ao auxílio emergencial, referem-se às parcelas disponibilizadas em conta aos beneficiários, não sendo possível afirmar que o recurso foi efetivamente sacado. A análise se o beneficiário cumpre ou não os requisitos previstos em lei, assim como a tomada de decisões em relação a eventual bloqueio ou suspensão, é de competência do Ministério da Cidadania."

O Ministério da Cidadania informou que o "processo de solicitação do auxílio emergencial segue regras claras e bem definidas na Lei 13.982/20 de 02 de abril de 2020, inclusive com a previsão de punição àqueles que tentam burlar o sistema para conseguir os recursos. 'Sem prejuízo das sanções civis e penais cabíveis, o trabalhador que prestar declarações falsas ou utilizar qualquer outro meio ilícito para indevidamente ingressar ou se manter como beneficiário do auxílio emergencial, será obrigado a ressarcir os valores recebidos de forma indevida' - art. 4º, da Portaria nº 351, de 7 de abril de 2020.

Segundo o órgão, "cabe ressaltar que o ministério disponibiliza o meio eletrônico para a devolução dos recursos do auxílio emergencial. É o endereço eletrônico: evolucaoauxilioemergencial.cidadania.gov.br . Basta inserir o CPF do beneficiário que deseja fazer o retorno do dinheiro aos cofres públicos e escolher a opção que for mais conveniente: gerar uma Guia de Recolhimento da União (GRU), que pode ser paga no Banco do Brasil, ou uma que pode ser recebida em toda a rede bancária."

QUASE 10 MIL RECEBERAM AUXÍLIO EMERGENCIAL DE FORMA IRREGULAR NO ES

Recentemente, A Gazeta mostrou que quase 10 mil pessoas no Estado podem ter recebido o auxílio emergencial do governo federal de forma irregular, segundo dados do Tribunal de Contas da União (TCU). Um levantamento encontrou, entre outras suspeitas de fraudes, benefícios pagos em nome de 244 pessoas mortas. Também foram identificadas 242 pessoas que recebiam auxílio reclusão.

Cálculos feitos pela corte de contas apontam que o prejuízo gerado por esses pagamentos indevidos ultrapassa R$ 6,3 milhões. A maior parte das irregularidades encontradas pelo TCU no Estado diz respeito às pessoas que acumularam benefícios, ou seja, receberam o auxílio emergencial ao mesmo tempo que aposentadoria do INSS, por exemplo. Mais de 4 mil pedidos se enquadraram nesse grupo.

Tribunal de Contas do Estado (TCES)
Tribunal de Contas do Estado (TCES). (Divulgação/TCES)

Ainda que o número de 10 mil pagamentos irregulares seja significativo, ele pode estar subestimado. Isso porque o levantamento do TCU aponta ter encontrado apenas quatro pagamentos a servidores estaduais e municipais.

Contudo, levantamento feito pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-ES) já demonstrou que no governo do Espírito Santo e nas prefeituras há mais de 2,6 mil servidores na lista dos beneficiários do auxílio.

Já um trabalho feito pelo G.Dados (grupo de jornalismo de dados de A Gazeta) demonstrou a partir de cruzamentos com a folha de pagamento do Executivo estadual que, entre ativos e inativos, mais de mil servidores do governo do ES receberam pelo menos a primeira parcela dos R$ 600.

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