Disparada de homicídios em 2020 precisa de um diagnóstico completo

Fica muito evidente que é uma guerra que só será vencida com a mobilização do aparato de inteligência, que se antecipe às movimentações dessas organizações criminosas que disputam poder na Grande Vitória

Publicado em 05/10/2020 às 05h00
Quatro homens foram assassinados na Ilha do Américo, em Santo Antônio
Chacina na Ilha do Américo. Crédito: Fernando Madeira

Há uma semana, quatro jovens foram brutalmente assassinados em uma emboscada na  na ilha Doutor Américo de Oliveira, localizada entre Vitória e Cariacica. Mas o terror daquela chacina lamentavelmente não foi um evento isolado neste difícil ano para a segurança pública capixaba. Neste domingo (04), à luz do dia, um carro com cinco ocupantes foi atingido por dezenas de tiros, no Centro de Vitória, deixando dois mortos e dois baleados. Com a assustadora estatística de setembro, com 95 mortes violentas até o dia 28, a expectativa das próprias autoridades é de que 2020 se encerre com mais de mil homicídios, abandonando, assim, a marca histórica de 2019.

No ano passado foram 978 mortes violentas no Espírito Santo. Até o último dia 28, os registros já davam conta de 828 homicídios.  

Tentar entender o que mudou em 2020 não é tarefa simples. A troca de comando na Secretaria de Segurança Pública do Espírito Santo, efetivada em 6 de abril, deu-se justamente pela disparada no homicídios em março, ainda no início da fase em que o isolamento social foi mais rigoroso na pandemia. Naquele mês, foram 143 assassinatos, número 66,27% maior do que o mesmo período de 2019.  No domingo anterior à demissão de Roberto Sá, foram 13 mortes violentas, configurando-se no dia com maior número de registros desde a greve da PM de 2017.

O coronel da PM Alexandre Ofranti Ramalho  assumiu imediatamente o posto. Já no dia 13 de abril, uma operação da Polícia Militar em todo o Espírito Santo para combater os homicídios e o tráfico de drogas durante o feriado conduziu 299 pessoas a delegacias. As operações policiais não cessaram, e nos meses seguintes conseguiu-se frear a escalada dos homicídios. Mas a tendência não se manteve no segundo semestre.

Na segunda quinzena de julho, foram registrados quatro ataques a ônibus na Grande Vitória. Dois deles em menos de 24 horas. Em uma das ações incendiárias, os criminosos deixaram um bilhete, escrito à mão, no qual avisavam que se tratava de uma represália ao Estado em função da suspensão das visitas nos presídios desde março, medida tomada para conter a disseminação da Covid-19 entre os presos. E ainda uma resposta pelas condições das prisões.  

Mesmo que o nível de orquestração desses atos violentos possam ser questionados, o episódio pode dar algumas pistas para entender o crescimento no número de homicídios, na forma de reação ao aparelho repressivo do Estado. De janeiro a agosto de 2020 foram realizadas 700 operações policiais somente na região do Bairro da Penha, em Vitória, considerado atualmente o epicentro da criminalidade, com 48 delas resultando em confrontos armados. No Espírito Santo, até agosto, 1.140 homicidas tinham sido presos, com 2.603 armas  apreendidas.

Fica muito evidente que é uma guerra que só será vencida com a mobilização do aparato de inteligência, que se antecipe às movimentações dessas organizações criminosas que disputam poder na Grande Vitória. O maior desafio, em meio a esse número considerável de prisões, e impedir a reorganização das cúpulas criminosas, com sucessões rápidas. Lideranças encarceradas precisam ser encaminhadas para presídios federais, para cortar o vínculo com os comandados nos bairros.

2020 não deve terminar com boas notícias, ao que tudo indica. Mas deve ser um ano estudado, desde já, meticulosamente pelas autoridades  de segurança pública estaduais. É um diagnóstico necessário para se reverter esse quadro e continuar na trajetória de redução de homicídios que se testemunhou nesta década. Um marco que tirou um estigma do Espírito Santo.

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