Decreto de Lula não é bala de prata para o controle de armas no país

O governo faz bem ao endurecer as regras. Mas é preciso ter em mente que o decreto não resolve sozinho o problema, sobretudo porque pode abrir brechas para que o comércio ilegal siga prosperando

Publicado em 26/07/2023 às 01h00
Decreto de armas do governo federal
Decreto de armas do governo federal. Crédito: Stockphotos

esquema de venda de armas descortinado nesta terça-feira (25) pela Operação Crypta, da Polícia Civil, em quatro municípios capixabas mostrou como os avanços tecnológicos também facilitam o crime. Aplicativos de mensagem populares como o WhatsApp e o Telegram acabam se tornando canais eficientes para reunir quem procura uma arma e quem faz esse comércio ilegal. E o armamento é entregue em casa como em qualquer aplicativo de delivery.

Mas o que facilita de fato que uma arma passe de mão em mão é a falta de controle sobre a sua circulação. O governo Jair Bolsonaro promoveu um afrouxamento das regras que resultou numa explosão de registros: no Brasil, a variação foi de 260% entre 2017 (com 637.972 registros) e 2022 (com 2.300.178), de acordo com dados do Sistema Nacional da Polícia Federal organizados no 17º Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

O Espírito Santo, no mesmo período, ficou atrás apenas do Distrito Federal no ranking dos estados que tiveram o maior crescimento de registros: um aumento de 381,7%, saindo de 14.044 em 2017 para 64.651 em 2022. 

Com Lula, já no primeiro dia de governo, foi promovido um revogaço dos decretos de Bolsonaro. E, na última sexta-feira (21), um novo decreto de armas foi divulgado pelo ministro da Justiça, Flávio Dino, no caminho oposto ao que vinha sendo praticado, com redução no número de armas e munições permitidos, tanto para defesa pessoal (que volta a exigir comprovação de efetiva necessidade) quanto para atiradores, colecionadores e caçadores.

O acesso quase irrestrito às armas no governo Bolsonaro, para muitos especialistas, pode ter contribuído para abastecer o mercado ilegal, como o esquema desbaratado pela Operação Crypta. No ano passado, o jornal O Estado de S. Paulo apurou que o PCC utilizou a política  de Bolsonaro para comprar armas legalmente através de laranjas que se registraram como CACs (caçadores, atiradores e colecionadores). Mas as armas também podem chegar às mãos de criminosos no comércio paralelo.

Lula faz bem ao endurecer as regras. Mas é preciso ter em mente que o decreto não será uma bala de prata para o controle armamentista no país, sobretudo porque pode abrir brechas para que o comércio ilegal siga prosperando, uma vez que vai restringir armas que até então estavam liberadas,  as calibres 9mm e .40 e.45. 

Um programa de recompra foi anunciado pelo governo federal para resolver essa questão, mas especialistas, como os ouvidos pelo colunista Marcelo Godoy do Estadão, temem que os valores oferecidos pelo governo fiquem muito abaixo dos oferecidos no mercado ilegal. O resultado pode ser o aumento do arsenal que circula entre os criminosos, com o desestímulo à manutenção das armas por quem as adquiriu dentro das regras antigas.

E o governo federal, através da Polícia Federal, não pode fechar os olhos para as fronteiras, o caminho de armas ilegais que inflam desde sempre os arsenais de organizações criminosas. Fiscalizações vão continuar sendo essenciais para reduzir a circulação de armamento, um desafio colossal diante da extensão do território brasileiro.

Quando se defende menos armas em circulação, é pela defesa de uma sociedade menos bélica. Quanto mais armada, mais a criminalidade se fortalece. O maior controle de armas combate a violência não somente no que diz respeito à formação dos arsenais do crime. Diariamente, o noticiário policial mostra que o acesso descontrolado a armas contribui para a cultura da violência nas próprias relações sociais, que se reflete em feminicídios, crimes de proximidade, agressões no trânsito. Definitivamente, não é o melhor cenário para se viver.

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