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Nova lei da bagagem deixou passagens aéreas mais caras no Espírito Santo

Nova lei da bagagem deixou passagens aéreas mais caras no Espírito Santo

Ao contrário do que a Anac prometeu em 2017, resolução que permite cobrança por malas não beneficiou passageiros

Publicado em 12 de dezembro de 2018 às 02:38

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Com a cobrança da bagagem despachada nas viagens aéreas, a promessa das companhias era baixar o preço das passagens. Mas a percepção do consumidor é o contrário do que as empresas garantiam. A sensação de que tudo ficou mais caro, aliás, pode ser comprovada por números da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).

O G.Dados, grupo de jornalismo de dados da Rede Gazeta, analisou informações abertas disponibilizadas pelo órgão regulador para ver se houve aumento no custo médio para os passageiros dos voos com origem em Vitória, e descobriu que, de acordo com o levantamento, o serviço ficou 8% mais caro entre julho de 2017 e agosto de 2018. Para se ter ideia do aumento, a inflação para o período foi de 4,64%.

A polêmica tarifação da bagagem passou a valer em junho do ano passado mesmo com protestos dos institutos de defesa do consumidor, que temiam uma disparada nos preços. A preocupação tinha certa razão. Após a regra entrar em vigor, o valor médio das viagens com embarque na Capital capixaba saltou de R$ 430,22 para R$ 477,61 em julho de 2017, um avanço de 11%.

Em dezembro do ano passado, as passagens atingiram o ápice nos preços, chegando a custar R$ 568,40, serviço 26,87% mais caro que no mesmo mês de 2016, quando a passagem era vendida em média por R$ 447,99.

Neste ano, as diferenças nos preços continuaram. O último dado sobre as passagens fornecido pela Anac é referente a agosto deste ano e mostra que nesse mês pagava-se em média R$ 517,26 pela viagem, 8,3% a mais que no mesmo período de 2016 (R$ 477,61).

Soraya Almeida (de branco) e a família perceberam alta dos preços das passagens. (Carlos Alberto Silva)

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PROMESSA

Quando a cobrança da bagagem ainda estava em discussão, o presidente da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), Eduardo Sanovicz, afirmou que a liberação das cobranças ia resultar em viagens mais baratas para os consumidores. Ele explicou, na época, que a mudança seguiria uma tendência mundial, que beneficiaria o usuário.

Mas, para a médica Soraya de Paula de Almeida Rezende, de 38 anos, o reflexo da medida no bolso não agradou. “Além da passagem ter ficado mais cara, nossos gastos aumentaram ao pagar para despachar a bagagem. Achei a mudança um abuso. Sem contar que o compartimento da bagagem de mão não cabe nem uma mochila de tão cheio que passou a ficar”, critica.

Gustavo Valani acreditava que preços fossem cair, mas ele não viu mudança. (Carlos Alberto Silva)

ÓRGÃOS PEDEM ANAC PARA REVISAR REGRAS

A Associação do Ministério Público do Consumidor (MTPCON) pediu a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) para revisar a Resolução 400, que permite a cobrança da bagagem. A verificação das regras já está prevista para 2021, mas a MPCON quer antecipar esse trabalho.

Apurações da instituição encontraram indícios de que o preço das passagens não baixou e que faltam critérios claros sobre o tamanho da bagagem de mão que pode ser levada pelo passageiro sem pagar a mais por isso. Conseguir acomodar uma mala no avião, muitas vezes, depende da companhia ou mesmo do modelo da aeronave.

Há ainda a preocupação com novas tarifas que têm sido embutidas nos serviços, como a cobrança por marcação do assento. Alguns consumidores, para conseguir embarcar, de acordo com a MPCON, foram obrigados a pagar pelo assento no guichê de atendimento, durante o check-in.

O órgão ainda verifica se as aéreas que atuam no Brasil têm adotado comportamento semelhante a de empresas da Europa que separam de propósito famílias que compram passagens como mesmo localizador, para obrigá-las a pagar pela marcação do assento.

Segundo a promotora de Justiça de Vitória Sandra Lengruber, presidente da MPCON, a Resolução 400 permitiu que cada vez mais se cobre por serviços acessórios. “Já se falou até em ter taxa de combustível. Houve uma perda. A resolução primou pela liberdade tarifária, pela maior concorrência, livre iniciativa, mas temos que verificar se isso realmente foi benéfico para o consumidor. A cobrança de bagagem realmente barateou a passagem para o consumidor que não tem mala? Precisamos que tudo isso seja demonstrado”, explica.

Sandra ainda afirma que as empresas precisam esclarecer porque houveram tantos aumentos nos preços. “Elas podem alegar que o combustível de aviação ficou mais caro, mas queremos que isso seja também comprovado.”

Para evitar retrocessos e prejuízos, a promotora de Justiça disse ainda que será feito um trabalho para acompanhar de perto o setor de transporte aéreo. “Estamos num momento que existem várias demandas sobre o assunto e precisamos garantir que os direitos dos consumidores sejam mantidos.”

O estudante Gustavo Valani, de 25 anos, de São Mateus, passou a andar mais de avião desde que passou a viver em Curitiba para fazer faculdade.

Ele acreditou que a passagem ficaria mais barata após a mudança das normas, mas, na prática, para ele, o serviço ficou mais caro. Ele até conseguiu encontrar passagens um pouco mais em conta em algumas ocasiões, mas viu o custo para viajar aumentar, em relação ao que ele já pagava, por causa da taxa de bagagem. “Não adiantou muito fazer essa alteração, pois os preços não mudaram.”

VALOR DAS VIAGENS FICA ATÉ 80% MAIS CAROS

Quem sai de Vitória com destino, a Valença, na Bahia, ou a Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, deve ter percebido um aumento significativo no preço das passagens. Para essas cidades, entre janeiro e agosto de 2018, o preço aumentou mais de 80% em relação ao mesmo período de 2017.

Destinos muito comuns para quem mora no Espírito Santo também ficaram com os preços mais salgados. É o caso da passagem para Belo Horizonte (Confins), em Minas Gerais. O valor teve um salto de 35,17%.

Outro aumento expressivo foi o voo para Campinas (Viracopos) que ficou 25% mais caro. Os preços das passagens também aumentaram este ano 23% para quem viajou para o Rio de Janeiro e para Porto Seguro, na Bahia.

Segundo levantamento com base nos dados da Anac, os destinos mais caros para quem embarca no Aeroporto Eurico de Aguiar Salles é Tabatinga, no Amazonas, e Altamira, no Pará. Entre as rotas mais baratas estão São José do Calçado, em São Paulo, Ponta Grossa, no Paraná, e Belo Horizonte, em Minas Gerais.

CONCENTRAÇÃO

Para o advogado e consultor do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), Igor Britto, os preços são motivados pela alta concentração. “Quase 100% do mercado está nas mãos de quatro companhias. O pedido de recuperação judicial da Avianca mostra como as empresas menores têm dificuldade de competir com as maiores e de manter as contas em dia”, explica.

Segundo Britto, quando foram iniciadas as discussões da Resolução 400, todos previam aumento nos preços. “As companhias embolsaram o custo que elas tinham com as bagagens e transformaram em lucro, não repassando para os consumidores. Não há previsão de que haja uma reversão nos preços, de que eles diminuam com o tempo. Vale destacar que, além das passagens, as empresas tem aumentado as taxas para despachar a bagagem.”

ANÁLISE: DRAMA SEM FIM

Quando começaram as discussões sobre a cobrança das bagagens, não havia nenhum dado concreto de que as companhias aéreas iriam reduzir os preços das passagens. No mês seguinte à taxação da bagagem, os preços subiram. As empresas não baixaram de forma alguma as tarifas. O efeito foi totalmente contrário. E a situação tem só piorado para o consumidor. Além da questão da bagagem, outro drama que as pessoas enfrentam é pagar pela marcação do assento, uma prática ilegal e que ao meu ver é venda casada. Se não faço esse pagamento, corro risco, por exemplo, de ver meu filho de cinco anos viajando sozinho, ao lado de estranhos. Todas essas mudanças têm afetado o consumidor e o grande problema é que elas não devem acabar. Temos uma agência reguladora que não se preocupa com o consumidor, que só enxerga os interesses das companhias aéreas.

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Leonardo Garcia especialista em Defesa do Consumidor e diretor da Brasilcon

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