Publicado em 2 de junho de 2018 às 23:41
O setor siderúrgico do Espírito Santo, o terceiro maior do Brasil, voltava a viver o sonho americano quando o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, decidiu lançar a guerra do aço.>
A decisão do magnata de estabelecer cotas para a entrada desses produtos, além de reduzir as vendas capixabas para esse país em 10%, vai acirrar a disputa dos produtores por outros mercados. As medidas de restrição ao aço brasileiro começaram a ser aplicadas na última sexta-feira.>
Um consultor empresarial do setor metalmecânico, que preferiu não se identificar, explica que a China, maior produtora de aço do mundo e a maior prejudicada pela ação protecionista de Trump, será grande ameaça à siderurgia capixaba.>
A princípio, a mudança não afetaria tanto o Estado, temos um parque industrial competitivo em qualidade e preço, produzimos um dos melhores aços do mundo, o que dá certa tranquilidade. Temos um padrão de entrega, uma tradição que garante contratos no médio e longo prazo. No entanto, a China pode tentar roubar nosso espaço em outros países. Só temos que acreditar que nossos consumidores não vão se aventurar na compra de aço desconhecido.>
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EXPANSÃO>
Somente no ano passado, o envio de semiacabados capixabas para os Estados Unidos aumentou 10% em relação a 2016 mesmo após as vendas totais para o mercado externo apresentarem redução.>
Dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC) mostram que os EUA são o maior consumidor de placas fabricadas no Estado. Pelo menos 40% das chapas exportadas por aqui têm como destino a Califórnia e o Alabama. Foram enviadas principalmente para esses destinos 1,1 milhão das 2,6 milhões de placas exportadas em 2017, o que garantiu uma receita de 539 milhões de dólares. Ao todo, o setor faturou somente no ano passado 1,9 bilhão de dólares com a exportação.>
Pela regra imposta por Trump, o Brasil só poderá enviar para lá a partir de agora um volume que equivale à média dos últimos três anos. Em relação aos acabados será necessário aplicar ainda um redutor de 30%. Mas como a venda principal do Estado para o EUA é de semimanufaturados, as restrições vão provocar uma queda de 100 mil toneladas nas vendas.>
A presidente do Instituto Jones dos Santos Neves, Gabriela Lacerda, explica que o aço se tornou uma das principais commodities capixabas, representando quase um quarto de tudo que é exportado pelo Estado. É algo muito significativo para a nossa economia. As vendas de aço para os Estados Unidos representam 6,7% do total das nossas exportações, analisa.>
HISTÓRICO>
Em 1997, o Estado exportava apenas para os Estados Unidos 1,4 milhão de toneladas de aço. Depois de ter uma boa parcela de seu mercado abocanhado pelo dragão chinês, o Espírito Santo viu suas exportações encolherem ainda mais com a crise econômica mundial que começou em 2008 e perdurou por mais cinco anos. Em 2012, atingiu sua pior marca nas exportações, com apenas 70 mil toneladas enviadas para os EUA.>
Com o religamento do terceiro alto-forno da ArcelorMittal Tubarão, a principal siderúrgica e produtora de semiacabados, em 2014, as vendas para o mercado externo voltaram a crescer, dando um salto de 1.484% entre 2012 e 2017.>
COMPETITIVIDADE GARANTE PRODUÇÃO E EMPREGOS NO ES>
O custo mais baixo e a qualidade do aço fabricado no Estado são fatores cruciais para manter o Estado com o mesmo nível de produção em seu parque siderúrgico, preservando os empregos, segundo especialistas do setor metalmecânico. O grupo ArcelorMittal, para esses consultores, deve privilegiar a fabricação de chapas na planta de Tubarão ainda que tenha siderurgias nos EUA.>
É mais barato produzir no Espírito Santo do que exportar o minério de ferro para os Estados Unidos. Cerca de 40% do volume transportado seria apenas escória. Sem contar que a atividade metalúrgica exige mão de obra menos qualificada enquanto nos EUA o foco é no desenvolvimento de tecnologia, explica um consultor da área.>
Se houver uma perda de mercado por causa da mudança nas importações americanas, o presidente do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas e de Material Elétrico do Estado do Espírito Santo (Sindifer), Lucio Dalla Bernardina, acredita que o grupo ArcelorMittal deve reduzir a produção em outras siderurgias. A planta de Tubarão tem uma das melhores produtividades da corporação, tem o aço mais barato. É mais fácil reduzir de outra unidade do que mexer na nossa produção.>
Apesar da aparente tranquilidade do setor diante das medidas de Trump, o governo do Estado, por meio de nota, disse que acompanha, com preocupação, a medida adotada pelo governo norte americano de prever cotas para o aço e taxa para o alumínio brasileiro. Disse que está mantendo contato permanente com o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços solicitando prioridade máxima na busca de uma solução que preserve a indústria e os empregos gerados pelo setor no Espírito Santo e no país.>
PRODUÇÃO>
Para produzir o aço, as siderúrgicas usam minério de ferro, carbono e carvão metalúrgico. Este último importado, principalmente, dos Estados Unidos exerce duplo papel na fabricação. É usado como combustível e também para desprender o oxigênio do minério, deixando o ferro livre para o refino. O Espírito Santo fabricou no ano passado 7,4 milhões de toneladas de aço, segundo o Instituto Aço Brasil, cerca de 50% são chapas semiacabadas.>
Quase 100% do aço capixaba que entra nos Estados Unidos são semimanufaturados, voltados principalmente para a produção de automóveis. Os produtos acabados, como aços longos (barras, perfis, fio máquina e vergalhões) têm saída para outros mercados, como Vietnã, Turquia, Equador, Colômbia e Chile.>
Em nota o Instituto Aço Brasil explicou que o setor foi surpreendido com as mudanças impostas por Trump. Há complementariedade do aço brasileiro com a siderurgia americana, tendo em vista que 81% das exportações do Brasil são de produtos semiacabados encaminhados para produtores de aço locais para laminação e acabamento. O Conselho Diretor do Instituto Aço Brasil, tendo em vista a relevância das exportações brasileiras de aço para os EUA (um terço do total), não teve outra alternativa senão aceitar a imposição americana. Segundo o Instituto, caso não aceitassem, a atitude poderia comprometer ainda mais a siderúrgicas brasileiras que operam com apenas 68% de suas capacidades.>
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