Crítico de cinema e apaixonado por cultura pop, Rafael Braz é Jornalista de A Gazeta desde 2008. Além disso é colunista de cultura, comentarista da Rádio CBN Vitória e comanda semanalmente o quadro Em Cartaz

"Recruta": Série de espionagem da Netflix é apenas razoável

Noah Centineo vive advogado da CIA em "Recruta", série da Netflix que mistura espionagem, humor e romance, dando ao ator um veículo para brilhar

Vitória
Publicado em 17/12/2022 às 00h34
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Série "Recruta", com Noah Centineo, lançada pela Netflix. Crédito: PHILIPPE BOSSÉ/NETFLIX

É difícil escrever sobre uma obra sem tentar entender a ideia por trás dela. “Recruta”, nova série da Netflix, provavelmente preenche todos os requisitos que seus produtores imaginaram como uma fórmula para o sucesso: uma trama de detetive, algumas trapaças, pessoas bonitas, romance, encontros e desencontros e, principalmente, Noah Centineo.

O jovem astro ganhou relevância nas comédias românticas da Netflix, filmes como “Para Todos os Garotos que já Amei” (2018) e “Sierra Burgess é uma Loser” (2018), e se tornou uma estrela para o público-alvo da plataforma. Sua popularidade o credenciou para um papel de certo destaque no blockbuster “Adão Negro” (2022) ao lado de Dwayne “The Rock” Johnson, e para uma série própria, “Recruta”, o motivo da existência deste texto.

Em oito episódios de cerca de 50 minutos, “Recruta” acompanha Owen (Centineo), um jovem advogado recrutado pela CIA, em seus primeiros dias de novo emprego. Em um serviço lhe passado quase como um trote por dois colegas veteranos, Owen descobre uma possível ameaça à segurança nacional. Max (Laura Haddock, de “White Lines”), uma ex-colaboradora da agência, ameaça expor segredos se não a tirarem da prisão onde se encontra. Quando menos percebe, Owen está envolvido em uma grande trama internacional de espiões na qual ele não sabe ao certo como se meteu e muito menos como sair dela. Afinal, ele é um advogado.

Esteticamente, “Recruta” lembra muito séries de TV aberta nos EUA, histórias como “Alias”, com o protagonista tentando se equilibrar entre a vida de espião e a vida pessoa, mas sem o aspecto procedural de um caso por semana. A série criada por Alexi Hawley, produtor de séries como “Castle” e “The Following", é corretíssima do início ao fim, como se preenchesse uma cartela de bingo. Owen divide o apartamento com a coreana americana Hannah (Fival Stewart, de “Atypical”) e com Terence (Daniel Quincy Annoh), um jovem negro e gay, personagens que o texto insiste em destacar, mas que seriam facilmente descartáveis se não fosse o fato de darem representatividade à narrativa.

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Série "Recruta", com Noah Centineo, lançada pela Netflix. Crédito: PHILIPPE BOSSÉ/NETFLIX

As cenas de luta até têm certa violência, principalmente no início, mas nunca ultrapassam limite algum. É interessante como essas sequências perdem peso no decorrer da trama - em determinada cena, Max elimina inimigos em um banheiro com certo peso, mas essa característica se esvai no decorrer da série. “Recruta” exige do espectador uma certa suspensão da descrença, pois tudo acontece de maneira irreal na jornada de Owen, dos colegas de trabalho querendo sabotá-lo ao romance com Amelia (Kaylah Zander), passando, obviamente, por todas as aventuras das quais um advogado da CIA não deveria nem chegar perto.

A série, no entanto, é divertida e cumpre seu papel de ser um veículo para potencializar o carisma de Centineo, levando-o a um público além das comédias românticas adolescentes. O ator se sai melhor nas cenas de tom mais cômico e nos romances, mas isso não chega a ser um problema, pois a inabilidade de Owen para a ação faz parte do personagem. A relação de amor e ódio entre o protagonista e Max funciona bem, mas em função de outros arcos - na ânsia de criar vários interesses românticos para Owen, a série faz com que não nos envolvamos com nenhum deles.

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Série "Recruta", com Noah Centineo, lançada pela Netflix. Crédito: PHILIPPE BOSSÉ/NETFLIX

O texto até se esforça, em algumas poucas cenas, para reforçar o vínculo entre Owen e Hannah, mas os flashbacks com os personagens na universidade são muito rápidos e pouco acrescentam, o que é uma pena, por Centineo e Stewart se saem bem no pouco tempo que têm juntos em tela, antes que alguma missão da CIA os interrompa. A grande força motriz da série é Max, uma personagem complexa, cheia de camadas, que funciona tanto como uma anti-heroína quanto uma vilã; ao final da temporada (ou da série, se não for renovada), nos afeiçoamos a ela devido ao esforço do roteiro para que isso aconteça.

Há um problema com alguns arcos introduzidos apenas para serem sumariamente abandonados, como o de Kelly (Alexandra Petrachuk), descartada sem desfecho após cumprir o que o texto espera dela. “Recruta” sofre também com o imediatismo da todas as soluções - os conflitos são resolvidos quase de imediato, já colocando a série em outra direção. O recurso não seria de todo ruim e até funcionaria em outras narrativas, colocando-as em movimento, mas aqui ele elimina o peso necessário para o bom funcionamento de uma história de espiões. Em praticamente todo o resto da série, toda cena de ação é embalada por música pop, conferindo um ar de entretenimento que não casa com o que se vê em tela.

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Série "Recruta", com Noah Centineo, lançada pela Netflix. Crédito: PHILIPPE BOSSÉ/NETFLIX

“Recruta” é a típica série que coloca uma pessoa comum em uma situação extraordinária. O resultado é razoável, com algumas boas cenas de ação e gente bonita se pegando, mas é o suficiente? Se a ideia é explorar Noah Centineo ao máximo, a missão foi cumprida com maestria, pois o ator está quase o tempo todo em tela, e, quando não está, estão falando de seu personagem. A série, porém, nunca ultrapassa o limite do correto, da reprodução de tudo o que já foi visto em outras séries ou em outros filmes. Ao final, o gancho e uma revelação um pouco óbvia deixam o espectador ansioso por uma segunda temporada, mas, conhecendo o modelo seguido, é bem possível que seja apenas uma enganação.

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