Crítico de cinema e apaixonado por cultura pop, Rafael Braz é Jornalista de A Gazeta desde 2008. Além disso é colunista de cultura, comentarista da Rádio CBN Vitória e comanda semanalmente o quadro Em Cartaz

"Ele Acredita em Papai Noel", da Netflix, é horroroso

Com personagem infantilizado e fórmula batida, "Ele Acredita em Papai Noel" subestima inteligência e boa vontade do espectador

Vitória
Publicado em 15/12/2022 às 16h33
Filme
Filme "Ele Acredita em Papai Noel", da Netflix. Crédito: Netflix/Divulgação

Se tem algo que quase todos os filmes natalinos têm em comum é o fato de “passarem pano” para o aspecto capitalista da data - e isso não é necessariamente uma crítica ao Natal ou ao capitalismo em si, apenas uma constatação. As histórias normalmente envolvem alguém que se deixou levar pelo capital ou por outro aspecto “mundano” e se esqueceu do verdadeiro espírito natalino, de sua mensagem de amor, paz e união, em contraponto a uma pessoa que a faz enxergar a magia natalina novamente. Em “Ele Acredita em Papai Noel”, da Netflix, a mensagem é clara.

O filme acompanha Lisa (Christina Moore), uma jornalista que detesta o Natal, em sua jornada de “redenção”. Lisa é mãe de Ella (Violet McGraw) e conhece o advogado Tom (John Ducey) em um evento do Dia da Independência dos EUA, o famoso 4 de julho. Após aquele estranhamento inicial padrão, ambos iniciam um relacionamento saudável e assim seguem até chegar a temporada de Natal, quando Lisa “descobre” que Tom, de fato, acredita em Papai Noel. Como ela, uma jornalista conhecida por não gostar de Natal, poderia namorar alguém que acredita no bom velhinho? 

Dirigido por Alex Ranarivelo, diretor com forte pegada novelesca e que nesta temporada já lançou outros dois filmes de Natal (“Um Mistério de Natal” e “Um Natal em Hollywood”, ambos na HBO Max), o filme segue a fórmula das comédias românticas e até ensaia uma pegada mais contemporânea. Os dois protagonistas são a típica representação do americano padrão (ao menos como eles gostam de se representar), ou seja, brancos e loiros, mas o texto, quase para cumprir uma cota, busca a representatividade nos amigos do casal; Sharon (Lateefah Holder), inseparável amiga de Lisa, é negra, enquanto Assan (Sachin Bhatt), melhor amigo de Tom, é gay, muçulmano e de ascendência árabe.

O roteiro chega ao absurdo de equiparar as crenças religiosas de Assan com a crença de Tom em Papai Noel, e é na permissividade da infantilização do personagem de John Ducey que o filme tem problemas. Ele realmente acredita na existência de Papai Noel, de gnomos que produzem os presentes e na mágica que possibilita a distribuição de presentes para todas as crianças do mundo a partir de um trenó puxado por renas voadoras - essa construção, vale dizer, é extremamente classista, mas não vou entrar na problematização. Na verdade, o Papai Noel da cabeça de Tom é uma espécie de Doctor Who capaz de viajar pelo espaço-tempo, mas esse conceito é pouco explorado, só surgindo quando ele precisa se “justificar”.

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Filme "Ele Acredita em Papai Noel", da Netflix. Crédito: Netflix/Divulgação

“Ele Acredita em Papai Noel” pode ser consumido como raso filme de Natal que é, mas também oferece um olhar conservador americano. Amargurada, Lisa é inicialmente o retrato de uma mulher progressista, dirige um carro japonês e tem um trabalho que pouco importa para a sociedade. Já Tom é a figura do americano modelo, com crença nas instituições (até demais) e com um trabalho no qual pode “fazer a diferença”. Ele também tem poder de transformação na vida de uma mãe divorciada e uma criança com o pai ausente, se oferecendo para ocupar esse espaço quase de forma mágica - a construção do personagem é de uma figura perfeita cujo único “problema” é acreditar em Papai Noel.

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Filme "Ele Acredita em Papai Noel", da Netflix. Crédito: Netflix/Divulgação

Ao fim, em sua vontade de oferecer “magia”, “Ele Acredita em Papai Noel” se torna um filme infantilizado até mesmo em comparação a outras obras natalinas recentes. O filme busca pede uma inocência do espectador, mas acaba mesmo é subestimando e a boa vontade do público que, em busca de uma história de Natal, encontra uma narrativa que ignora sua inteligência.

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