Crítico de cinema e colunista de cultura de A Gazeta

O rock está morto (parte 2), ao menos o rock como você conhece

Ok, talvez o rock não esteja morto, mas você está pronto para gostar do futuro do rock?

Publicado em 08/08/2020 às 14h00
Atualizado em 08/08/2020 às 14h55
 Yungblud e Machine Gun Kelly
Yungblud e Machine Gun Kelly. Crédito: Interscope/Divulgação

Semana passada escrevi, neste mesmo espaço, como o rock se mostra ultrapassado, sem inovações e pouco atrativo para as novas gerações. Sim, o rock está morto, caro leitor, pelo menos da forma como você provavelmente o conhece. É claro que talvez um gênero definitivamente não morra, que os clássicos serão clássicos, seja lá o que isso signifique para você, mas sabe quem vai morrer? Quem ouve rock e quem o faz há muito tempo! E se o gênero não se reinventar e se tornar novamente atrativo para os jovens, a falta de renovação do público o deixará relegado ao limbo da nostalgia.

Essa mudança de costumes, vale ressaltar, vai muito além da música, ela é cultural. O rock deixou de significar um sinônimo de rebeldia ou uma subversão de costumes e se tornou música de “tiozão” que acredita ser parte de uma elite cultural que desconsidera outros estilos. A geração pós-millennial, hoje entre os 20 e 30 anos, pouco se interessa pelas novas bandas e, se o faz, circula também por outras cenas.

Por aqui, a galera no final da adolescência ou na casa dos vinte e poucos anos se interessa muito mais por nomes como os ótimos BK, Djonga, Coruja BC1, Froid, Cynthia Luz, Drik Barbosa e Sant do que por qualquer coisa recentemente surgida no rock nacional. E quem pode culpá-los? Qual foi a última banda de destaque no rock brasileiro? Heróis locais, o Dead Fish completa 30 anos em 2021 e não há muitas bandas seguindo seus passos por aqui.

O mais próximo de termos um destaque novo no rock é com o excelente André Prando, que ironicamente não é considerado rock o suficiente pela já citada elite cultural roqueira - é verdade, quando merecidamente venceu um festival de rock por aqui, apresentando um trabalho bem superior aos concorrentes, uma banda finalista achou um absurdo e foi xingar muito nas redes sociais.

Pré-pandemia, bastava comparar o público das Batalhas do Atlântica, em Jardim Camburi, ao de qualquer show de rock autoral pela região metropolitana para perceber essa nova onda de interesses. O rap no Brasil ainda está muito mais ligado à cultura do hip hop e à realidade de periferia, enquanto nos EUA o rapper de shopping já é uma realidade estabelecida.

Por lá, ironicamente, os artistas desse novo rap estão agora se voltando para… (rufem os tambores durante a pausa dramática)… o rock. Nomes como DC The Don, Lil Aaron, Fish Narc e Horse Head têm colocado elementos de rock em suas músicas mesmo que não sejam considerados artistas do gênero.

É curioso notar como os artistas do “emo (t)rap” são caras que se estivéssemos em 2005 estariam pegando em guitarras para montar bandas influenciadas por Blink 182 - o que eles fazem acaba sendo colocar melodias e letras influenciadas pelo pop punk em cima de batidas computadorizadas e muito autotune.

Talvez seja justo, então, repensar a frase de abertura deste texto: o rock talvez não esteja morto, mas tenha se transformado em outra coisa, em algo diferente e novo que muita gente não está preparada para entender. Os novos astros do rock têm posturas de rockstars, mas sonoridade muito mais próxima da música pop e do rap do que do aquela considerada rock pelos roqueiros - basta ouvir Machine Gun Kelly (um rapper) e Yungblud para entender isso. E talvez o que você, fã de Ramones, Sex Pistols e Nirvana, sinta hoje seja algo parecido com o que uma geração anterior à sua sentiu com as explosões do punk para acabar primeiro com o rock progressivo setentista e, depois, com o hard rock farofa dos anos 1980. Mas se o rock é mesmo um estilo de vida, como adoram dizer, a preocupação com a sonoridade deveria ser o menos importante.

A cultura vive de ciclos, transformações e adaptações - o drum’n’bass também já foi um “novo rock”. Talvez seja questão de tempo até um novo boom roqueiro suprimir o que bomba hoje, mas isso pouco importa, estamos diante de novidades proporcionadas por novas meios e tecnologias. Entender a produção artística é entender o mundo e suas novas configurações, a arte, afinal, é um espelho da sociedade em que ela é produzida.

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