Crítico de cinema e apaixonado por cultura pop, Rafael Braz é Jornalista de A Gazeta desde 2008. Além disso é colunista de cultura, comentarista da Rádio CBN Vitória e comanda semanalmente o quadro Em Cartaz

"Isolados: Medo Invisível": filme sobre pandemia é horroroso

Produzido pelo cineasta Michael Bay, "Isolados: Medo Invisível" ("Songbird") chega ao Amazon Prime Video com uma espetacularização da pandemia de Covid-19

Vitória
Publicado em 19/08/2021 às 00h20
Filme
"Isolados: Medo Invisível" mostra um mundo devastado pelas variantes da Covid. Crédito: Amazon Prime Video/Divulgação

Em maio de 2020, antes mesmo do auge da pandemia de Covid-19, Michael Bay anunciou que lançaria um filme inspirado na situação mundial. Foram muitas as críticas da mídia especializada, da própria indústria de cinema, que chegou a ensaiar um boicote ao filme, e também nas redes sociais acerca da falta de sensibilidade de Bay e seus parceiros de produção, mas isso não impediu que o projeto fosse tocado adiante - o diretor, afinal, nunca foi conhecido por sua sensibilidade.

Lançado nos EUA no final de 2020, quando equivocadamente se tinha a impressão de que a pandemia estava chegando ao fim, “Isolados: Medo Invisível” (“Songbird”, no original) foi muito mal recebido não apenas por ser considerado um filme “equivocado” para o momento, mas também por não aproveitar bem o tema com um roteiro superficial. O longa chega ao Amazon Prime Video nesta quinta (19), às 21h.

O filme dirigido pelo desconhecido Adam Mason (Bay assina a produção) se passa em 2024 em uma sociedade há quatro anos mergulhada na pandemia e em um lockdown que já dura 213 semanas. Novas variantes do vírus, ainda mais contagiosas e letais, se espalharam pelo ar. O resultado é um mundo abandonado, com pessoas trancadas em casa e obrigadas a fazer exames diários no smartphone para saber se estão ou não doentes - caso o aplicativo indique a presença do vírus, não demora para uma “equipe de limpeza” chegar ao local. Todos os infectados são levados para zonas de isolamento de onde ninguém volta. Pelas ruas, apenas alguns poucos imunes, que assumiram papéis de entregadores, pois “os ricos precisam de suas encomendas”.

Acompanhamos Nico (KJ Apa, de “Riverdale”), um desses entregadores que vagam pelas desertas ruas de Los Angeles fazendo entregas para os milionários. Conhecemos também Sara (Sofia Carson), a namorada de Nico, uma jovem que mora isolada com a avó e que nunca se encontrou pessoalmente com o namorado. Além deles, somos apresentados aos coadjuvantes e suas subtramas; primeiro um rico casal formado pelos personagens de Demi Moore e Bradley Whitford (“The Handmaid’s Tale”), mas  depois também somos apresentados a Dozer (Paul Walter Hauser), um veterano de guerra que comanda um drone pela cidade e assiste aos vídeos da jovem cantora May (Alexandra Daddario), que foi para Los Angeles tentar a fama, mas acabou trancada em um quarto de hotel.

É curioso como o texto ensaia uma profundidade ao sugerir que os imunes acabam sendo mais solitários do que as pessoas isoladas, mas esse conceito é logo abandonado e posteriormente até maltratado com a fala de um vilão. O roteiro também ensaia abordar a desigualdade, com os ricos vivendo isolados em suas lindas mansões, com empregados isolados de suas famílias para não comprometer a saúde de seus chefes, mas essa ideia também é esquecida.

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"Isolados: Medo Invisível" mostra um mundo devastado pelas variantes da Covid. Crédito: Amazon Prime Video/Divulgação

Aos poucos, “Isolados: Medo Invisível” perde seu fiapo de premissa e se esquece de algumas boas ideias em função de uma trama batida e em que pouca coisa faz sentido. Por exemplo: Nico busca uma pulseira de imune para que Sara pudesse sair de casa - mesmo com a pulseira, ela não estaria imunizada e provavelmente contrairia a doença.

Talvez para não passar uma imagem de um filme negativo apesar da temática, “Isolados: Medo do Invisível” justifica tudo com o amor. É cedendo ao discurso de Nico sobre seu amor que os personagens “escolhem o seu lado” e encontram sua possibilidade de redenção, algo que o roteiro deixa muito claro nos momentos finais do filme. O problema é que as histórias paralelas, mesmo quando se encontram com a principal, são desnecessárias e funcionam como episódios de uma antologia de curtas dentro daquele universo, mas é melhor não cogitar essa possibilidade, pois Michael Bay pode gostar da ideia.

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"Isolados: Medo Invisível" mostra um mundo devastado pelas variantes da Covid. Crédito: Amazon Prime Video/Divulgação

“Isolados: Medo Invisível” é um filme de mau gosto. A primeira metade do filme até aborda algumas possibilidades interessantes, mas a mão de Michael Bay pesa na segunda parte da narrativa com uma espetacularização que transforma a pandemia em um cenário de filme de ação de gosto duvidoso e incapaz de responder às perguntas que apresenta. Se as entregas são apenas para os muito ricos, como o resto sobrevive se as pessoas são proibidas de sair de casa? Como Lester (Craig Robinson) consegue seus produtos em uma cidade completamente abandonada na qual um imune pode “entrar em uma concessionária e sair com o carro que quiser” sem ser perturbado por isso?

O problema, vale ressaltar, não é fazer um filme sobre a pandemia. Matheus Souza fez o impecável “Me Sinto Bem Com Você”, também disponível na Amazon Prime Video, e não foi questionado por isso. A crítica a ser feita é a falta de sutileza dos produtores ao espetacularizar algo que ainda dizima famílias mundo afora. Ainda assim, a real observação talvez seja a de que “Isolados: Medo Invisível”, independente do tema, é um filme muito ruim (pelo menos ele é curto).

Não há no roteiro citação alguma sobre ciência ou vacinação - as cenas iniciais apenas trazem bravatas sobre o isolamento. O controle governamental, o grande vilão do filme, é retratado quase como a Gestapo em busca de judeus na Alemanha Nazista, com soldados que levam para os campos de concentração qualquer um que tenha contato com um doente, infectado ou não. Michael Bay, que tanto insiste em dizer que faz filmes “apolíticos”, se rende a um texto negacionista.

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