Crítico de cinema e apaixonado por cultura pop, Rafael Braz é Jornalista de A Gazeta desde 2008. Além disso é colunista de cultura, comentarista da Rádio CBN Vitória e comanda semanalmente o quadro Em Cartaz

"Beckett", da Netflix, tem boas inspirações, mas texto fraco

Filme de ação estrelado por John David Washington aposta no estilo "cara errado na hora errada" para criar um thriller de conspiração com pano de fundo político

Vitória
Publicado em 17/08/2021 às 22h02
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John David Washington em "Beckett", filme da Netflix. Crédito: Yannis Drakoulidis/Divulgação

É fácil entender o apelo de “Beckett”, coprodução entre Itália, Brasil (pela RT Features) e Grécia lançada na última semana pela Netflix. “Beckett” é um thriller de ação estrelado por John David Washington, ator de filmes como “Infiltrado na Klan” (2018), “Malcolm & Marie” (2021) e principalmente “Tenet” (2020). Tendo trabalhado com diretores das grifes de Spike Lee e Christopher Nolan, o filho de Denzel Washington é um dos nomes em alta na indústria. O lançamento da Netflix ainda tem no italiano Ferdinando Cito Filomarino um diretor/roteirista em ascensão e, na oscarizada Alicia Vikander, uma coadjuvante de luxo.

O filme acompanha o personagem título, vivido por John David Washington, um turista americano em visita à Grécia ao lado da esposa, April (Vikander). Após um acidente automobilístico, Beckett passa a ser perseguido e descobre não poder confiar em ninguém. Cabe a ele descobrir a verdade sobre o que está acontecendo.

“Beckett” é um filme simples, sem grandes arroubos estilísticos e com uma linguagem dura - a câmera acompanha o protagonista durante praticamente todo o tempo, às vezes com aspecto quase jornalístico. Essa escolha passa também a impressão de um filme “menor” em comparação a algumas obras parecidas, como as recentemente estreladas por Liam Neeson.

Pouco sabemos sobre o personagem título, mas as cenas iniciais, antes do acidente, nos ajudam a entender pelo menos superficialmente a dinâmica de seu relacionamento com April e também criam uma identificação do público com o protagonista. A princípio, pouco entendemos também de tudo o que acontece além da trama principal; vamos gradualmente tendo contato com essas informações, nem sempre de forma muito natural, e descobrimos que “Beckett” é a típica história do cara errado na hora errada - essa situação é muito bem retratada na dificuldade de comunicação de Beckett, um americano em um país onde poucos falam inglês com fluência.

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John David Washington e Alicia Vikander em "Beckett", filme da Netflix. Crédito: Yannis Drakoulidis/Divulgação

O protagonista também não passa a impressão de ser um sujeito acostumado a brigas, ao contrário do que normalmente acontece em filmes de ação. Assim, surpreende a mudança dessa característica em uma sequência acrobática perto do fim, pois em momento algum o filme havia dado indícios dessa capacidade, muito pelo contrário. Durante a maior parte do tempo, o texto faz questão de ressaltar o aspecto “homem comum” de Beckett, um sujeito como eu ou você, mas em uma situação limítrofe.

A inspiração em clássicos como “Os 39 Degraus” (1935), de Alfred Hitchcock, e “O Fugitivo” (1993), de Andrew Davis, são claras, assim como a influência de “Busca Frenética” (1988), de Roman Polanski, outro filme sobre um americano “perdido” em um país estranho, mas o texto de “Beckett” nunca chega a esse nível de qualidade. O filme ganha contornos sobre a situação política da Grécia e uma trama cheia de conspiração, mas o espectador pouco entende o que está acontecendo ou as viradas do roteiro. Nem mesmo todo o didatismo de uma delas, no terceiro ato, ajuda na compreensão.

John David Washington se sai bem durante a maior parte do tempo, com uma atuação cheia de fisicalidade e dando valor à deterioração de seu personagem ao longo da trama. Com um texto raso, é difícil cobrar do ator uma profundidade dramática em seu papel, o que praticamente inexiste no filme além dos momentos iniciais. Sem a ajuda do roteiro, cabe à trilha sonora de Ryuchi Sakamoto, vencedor do Oscar por “O Último Imperador” (1987), a construção de tensão e o peso das cenas.

Originalmente feito para ser lançado nos cinemas, “Beckett” encontra na Netflix uma plataforma na qual será visto com mais tolerância. O filme de Ferdinando Cito Filomarino aposta demais no aspecto de “poderia ser com você”, mas deixa tudo de lado no ato final, fazendo com que o espectador abandone a identificação criada com o protagonista no início. Em um cinema, o público poderia sair decepcionado, como se o dinheiro investido não tivesse valido a pena, mas a dois cliques, no sofá de casa ou pela tela do celular, é um filme razoável e que não chega a ser uma decepção.

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John David Washington em "Beckett", filme da Netflix. Crédito: Yannis Drakoulidis/Divulgação

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