Crítico de cinema e apaixonado por cultura pop, Rafael Braz é Jornalista de A Gazeta desde 2008. Além disso é colunista de cultura, comentarista da Rádio CBN Vitória e comanda semanalmente o quadro Em Cartaz

"Esticando a Festa", da Netflix, é apenas um filme confortável

"Esticando a Festa" é uma comédia adolescente travestida de temas adultos, um filme sobre segunda chances e amizade, mas com um roteiro que nunca engrena

Vitória
Publicado em 03/09/2021 às 01h20
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Filme "Esticando a Festa", da Netflix. Crédito: GRAHAM BARTHOLOMEW/NETFLIX

Como escrevi no texto de “Ele é Demais”, há algo encantador nas fórmulas clássicas e nas diversas maneiras como elas são adaptadas para os tempos de suas respectivas releituras. “Esticando a Festa”, que chegou nesta quinta (2) à Netflix, usa várias delas, mas se aproxima mesmo é dos derivados de “Um Conto de Natal”, livro de Charlie Dickens, e do clássico “O Céu Pode Esperar” (1978), de Warren Beaty e Buck Henry.

O filme dirigido por Stephen Herek (“Meu Adorável Professor”) é a história de Cassie (Victoria Justice), uma jovem festeira às vésperas de completar 25 anos com uma grande festa. Cassie vive com Lisa (Midori Francis), sua melhor amiga desde a infância e uma pessoa de personalidade completamente diferente da sua. Cassie vive para festas, trabalha como planejadora de festas e adora uma balada, já Lisa é paleontóloga, tímida e gosta de ficar em casa.

Após uma balada, no entanto, Lisa bate a cabeça e apaga. Ela acorda em um lugar estranho sendo recepcionada por Val (Robyn Scott), uma espécie de anjo designado para orientar Lisa a resolver conflitos que deixou na Terra após sua passagem. A entrada de Lisa no céu ou sua ida ao inferno depende desses acertos de contas. Assim, a jovem “volta” ao plano dos vivos, um ano depois de sua morte, e tem que dar um jeito de se reconectar com as pessoas que lhe eram importantes.

“Esticando a Festa”, principalmente quando Val entra em cena, lembra muito a ótima “The Good Place”, criando um outro plano como uma repartição pública cheia de hierarquia e burocracia. No resto do tempo, porém, usa a fórmula de maneira correta, mas sem nunca se aprofundar e nada. A “presença” de Cassie entre os vivos oferece algumas situações de humor, mas nada extraordinário.

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Filme "Esticando a Festa", da Netflix. Crédito: GRAHAM BARTHOLOMEW/NETFLIX

Todos os problemas da protagonista parecem superestimados, mas a verdade é que sentimos isso devido ao texto não criar personagens interessantes além de Cassie e Lisa. O roteiro nunca deixa clara a gravidade da situação - o que representaria, afinal, ir para o inferno? Dessa forma, a personagem tampouco parece se importar com essa possibilidade durante a maior parte do tempo.

O filme oferece, obviamente, uma jornada de autocrítica, autoconhecimento e descobertas. Cassie é daquelas pessoas extremamente positivas e mimadas, que fazem cara feia quando as coisas não acontecem da maneira como ela quer. Quando precisa rever como seu comportamento em vida afetou algumas pessoas queridas, ela passa por um amadurecimento forçado - isso fica registrado nas roupas que ela magicamente escolhe diariamente ao longo do filme.

Há arcos no filme que não funcionam como deveriam. O do cantor pop Koop (Spencer Sutherland), por exemplo, apenas oferece elementos para movimentar uma outra história e para oferecer um afago nos momentos finais. Há, porém, uma sub-explorada comédia romântica entre Lisa e o vizinho bonitão Max (Timothy Renouf), um arco que oferece ao texto mais possibilidades, com os dois atores funcionando bem no pouco tempo que têm juntos.

“Esticando a Festa” é uma história sobre segundas chances, amizade e família, um conto sobre perdoar e ser perdoado. Justamente por ter temas tão afetuosos, o filme peca ao não trazer destaque aos conflitos e manter o espectador relativamente afastado dos personagens até o último momento. No finalzinho de seu terceiro ato, o texto parece querer corrigir esse distanciamento e oferece um abraço em uma cena que emociona de forma simples.

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Filme "Esticando a Festa", da Netflix. Crédito: GRAHAM BARTHOLOMEW/NETFLIX

É irônico, assim, que o filme não termine quando encontra seu tom ideal. Após o clímax e a emoção que ele traz, “Esticando a Festa” tenta equivocadamente elevar o astral do texto com uma novidade que não faz sentido algum - e que ainda piora se a analisarmos com calma tudo o que envolve essa cena.

“Esticando a Festa” é um filme feito e pensado para ser confortável, com uma trama adolescente levada a aos primeiros passos da maturidade, uma tentativa de cativar o público de Victoria Justice, que até se esforça. O problema é ser confortável até demais ao oferecer ao espectador uma jornada tranquila e superficial ao pós-vida. Se você vai tratar da morte, é bom ao menos acertar o peso do tema.

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