Nessa coluna, Nanda Perim fala de sua experiência como psicóloga e educadora parental, dando seu parecer sobre questões atuais da educação infantil, trazendo dicas, humor e muita novidade boa!

A competitividade acaba com a infância

Já senta? Já engatinha? Já anda? Dorme a noite inteira? A competitividade começa tão cedo, que a criança mal consegue sentar e já está competindo com o vizinho da mesma idade que já engatinha

Publicado em 18/11/2020 às 15h49
Crianças recebendo um troféu
Essa mentalidade entra na vida dos pais e, quando menos percebem, estão colocando a criança em mil atividades para tentar vencer a competição com o tal vizinho superevoluído. Crédito: Shutterstock

Um dos conceitos que tento desconstruir no meu trabalho é o de constantemente colocar as crianças para competir entre elas. Esse é outro padrão cultural que é muito prejudicial à infância: estar sempre comparando crianças e estimulando a competição entre elas.

Vejo muitos pais e mães que acabam, sem perceber, criando um clima de rivalidade sem igual entre os pequenos. Aliás, muitas escolas também fazem isso, parabenizando os ‘bons alunos’ da sala, colocando os que não foram parabenizados em lugar de menos importantes, menos esforçados ou menos inteligentes.

Nanda Perim

Psicóloga

"É muito comum ver nas propagandas das escolas frases como: "torne seu filho o número um" ou “faça ele dominar o mundo”, como se o objetivo fosse que sua criança se tornasse a mais incrível da sala, a melhor, a que deixa todas as outras crianças no chinelo. Que triste pensar assim. E ficar lá em cima, no topo de tudo, também me parece muito solitário. É a mentalidade do ENEM tomando conta de nossas vidas desde que a criança é um bebê."

Já senta? Já engatinha? Já anda? Dorme a noite inteira? A competitividade começa tão cedo, que a criança mal consegue sentar e já está competindo com o vizinho da mesma idade que já engatinha, fala e anda de bicicleta. É bem impressionante o peso que colocam nos pais. E devagar, sem perceber, essa mentalidade entra na vida deles, e quando menos percebem estão colocando a criança em mil atividades para tentar vencer a competição com o tal vizinho superevoluído. Pra quê isso? Pra quê toda essa pressa?

Crianças têm habilidades diferentes, tempos diferentes, e precisamos entender que a competição só piora, porque coloca pressão sobre eles. E a competição não para por aí: muitos ficam fazendo competição entre os filhos para adiar a vida no dia a dia: quem vai comer mais rápido? Quem vai pro banho primeiro? Quem me ajuda mais e quem me ajuda menos? Quem é que me dá mais trabalho? É comum que esses padrões sejam estabelecidos cedo, e as crianças bem novas já tenham os rótulos de quem ganha ou perde cada competição da casa. O problema é que esse pensamento acaba atravessando uma outra questão muito importante, e também muito ignorada: a relação dos irmãos.

Nanda Perim

psicóloga

"Os pais e professores têm em mente tornar as crianças mais fáceis de lidar, ameaçando perder pontos, estrelas, lugar no pódium. Mas, para elas, essas pontuações significam ser ou não amadas, vistas e consideradas. E quando a criança começa a entender que precisa competir para ser amada e considerada, ela perde seu senso de valor incondicional. Ela apenas vale enquanto ela consegue conquistar aquelas metas ali. E isso é muito triste!"

Precisamos deixar claro para as crianças que suas conquistas precisam vir por interesse próprio. Toda criança tem vontade de evoluir e desenvolver quando ela está bem, nutrida emocionalmente e sem pendências. Se sua criança está tendo dificuldade em querer aprender, então provavelmente a questão não é falta de motivação por não ter prêmios suficientes, mas sim outro lado de si que está desanimado: baixa autoestima, estresse, cansaço, saudade. O desânimo vem de algum lugar, e precisamos buscar essa necessidade para suprir ela, ao invés de ficar tentando encher esse buraco de prêmios vazios que nunca vão satisfazer a necessidade real que ela tem.

E se a criança se torna o adulto que está sempre buscando os prêmios e metas da vida para preencher vazios, jamais conseguirá indentificá-los sozinha, podendo se tornar aqueles adultos que muito conquistam e pouco conseguem apreciar as conquistas que teve, porque o buraco, o vazio, continua lá.

Portanto, precisamos parar de criar essas competições entre as crianças e começar a, simplesmente, ouví-las mais. Ouvir o que pensam, o que precisam, o que sentem falta. Ouvir como pensam de si mesmas, o que têm vontade intrínseca de melhorar, o que têm de necessidade urgente para sanar. Ouvir a criança e fazê-la se sentir amada por quem ela é - e não pelos prêmios que conquistou -  pode ser o maior aprendizado da vida.

É importante permitir que ela ame quem é, para que consiga se motivar a buscar aprender, crescer e melhorar no que for - porque  ama e acredita em si mesma.

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