Doutor em Doenças Infecciosas pela Ufes e professor da Emescam. Neste espaço, faz reflexões sobre saúde e qualidade de vida

Por que a campanha de vacinação da gripe está sendo um fiasco?

É uma pena, mas 2024 será mais um ano de sofrível campanha de vacinação de gripe, não sei se pior que 2023, que também foi horrível

Publicado em 09/05/2024 às 02h00
Colatina amplia vacinação contra a gripe para toda população com seis meses de vida ou mais
Vacinação da gripe em Colatina. Crédito: Divulgação | Prefeitura de Colatina

Estamos no início de maio e o Ministério da Saúde decidiu estender a vacinação de gripe além dos grupos vulneráveis, liberando a vacina para toda a população. Quem quiser se vacinar para gripe agora basta ir ao posto. A explicação dada por algumas autoridades da saúde é que a disseminação da doença nas últimas semanas levou o ministério a tomar tal decisão. Realmente, os sistemas de sentinela da Fiocruz detectaram um grande aumento de circulação do vírus da gripe nas últimas semanas em todo o país.

Na verdade, a razão é outra. Completados quase dois meses de campanha (antecipada este ano) e após o dia D, dia 13 de abril, foram vacinados em todo o Brasil pífios 25% do público alvo. São gestantes que seguem expostas, apesar de conhecermos, desde a gripe suína de 2009, a mortalidade materna exagerada pela gripe.

São também pacientes com doenças crônicas várias que podem ser muito agravadas pela gripe. As pessoas com doença coronariana têm sete vezes mais risco de enfartar na semana em que estão gripadas. Os cardiologistas sabem da importância da vacina de gripe na prevenção do infarto do miocárdio.

 Várias doenças se agravam com a gripe, que tem no nariz entupido e no corpo ruim apenas a ponta de um iceberg que encobre um buraco sem fundo de intercorrências graves. Muitos idosos torcem o nariz para a vacina, supondo falsamente que ela pode provocar gripe. Algumas pacientes queridas me dizem: “doutor, eu tomo a vacina e gripo!” Sim, a vacina é menos eficaz no paciente mais velho, mas previne as complicações que matam, mesmo que venha uma gripe mais branda.

Há uma vacina de gripe mais eficaz para o idoso, de alta potência, mas só disponível nas clínicas privadas. Mas mesmo essa comum é valiosa para o idoso. Como os grupos mais vulneráveis não se vacinaram é melhor liberar a vacina para todos.

É uma pena, mas 2024 será mais um ano de sofrível campanha de vacinação de gripe, não sei se pior que 2023, que também foi horrível. Há relatos históricos que após a gripe espanhola em 1918 houve relaxamento de cuidados com a saúde, como um esgotamento. Parece que na ocasião aconteceu o maior carnaval do Rio em anos...

Penso também que toda a polêmica com as vacinas de Covid acabou afetando a confiança e aderência às outras vacinas. A polarização política acaba cobrando seu pedágio, infelizmente.

Mas acho também que existem outros fatores envolvidos nesse fracasso da campanha. Os serviços de vacina poderiam ser mais acessíveis em horários compatíveis com o mundo do trabalho, especialmente para as mulheres que são as pessoas que decidem as questões de saúde das famílias.

Exigir, por exemplo, que todas as vacinas sejam agendadas em sistemas “on-line” não ajuda a aumentar a cobertura. O município de São Paulo vacina quem comparece ao posto, agendando ou não. Enfim, vamos ter surtos de gripe... Temos um longo caminho adiante para retomar as coberturas que haviam tornado o Brasil um exemplo de prevenção.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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