É juiz do Trabalho, doutorando em economia, mestre em Processo, especialista em Direito do Trabalho e economista. Professor de graduação e pós-graduação da FDV. Neste espaço, busca fazer uma análise moderna, crítica e atual do mercado e do Direito do Trabalho

Licença-paternidade: avanço civilizatório ou placebo de igualdade?

Ao contrário do que se imagina à primeira vista, o aumento da licença-paternidade não visa melhorar as condições de trabalho do homem. É o oposto

Publicado em 11/11/2025 às 04h45

Na última semana, a Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que amplia de cinco para vinte dias a licença-paternidade. Segundo o texto, o período será implementado de forma progressiva, começando com dez dias e chegando ao máximo em quatro anos. Isso porque a proposta não apenas aumenta o gasto do erário com trabalhadores celetistas, mas, principalmente, transfere à Previdência o custo do afastamento do empregado da iniciativa privada.

Mas será que essa norma atende, de fato, à finalidade para a qual foi proposta? Sei não.

Ao contrário do que se imagina à primeira vista, o aumento da licença-paternidade não visa melhorar as condições de trabalho do homem. É o oposto, o problema é mais profundo: busca-se equalizar as oportunidades de trabalho entre homens e mulheres, já que estas sofrem o que se chama de “penalidade da maternidade”.

Com efeito, não basta que a Constituição Federal (e a legislação extravagante) proíba diferenças salariais entre homens e mulheres na mesma função. Isso apenas evita que os empregadores contratem apenas mulheres — como ocorreu, ironicamente, nos primórdios da Revolução Industrial. O mercado feminino ainda carrega o peso de uma cultura que atribui exclusivamente à mãe as responsabilidades pelos cuidados com os filhos, enquanto o homem desfruta das “vantagens” de continuar trabalhando — e ascendendo na carreira — mesmo quando recém-pai.

Já a mulher, obrigada a interromper sua trajetória profissional por meses, perde oportunidades, retarda a ascensão e, não raro, vê enfraquecer suas redes de contato e influência.

É evidente que os cuidados com o bebê devem ser prioridade, e por isso a licença-maternidade tem natureza cogente e irrenunciável. Contudo, sobrecarregar a mãe não apenas traz efeitos deletérios à constituição familiar — que não é o foco aqui — como também catapulta o pai profissionalmente, gerando uma concorrência desleal de gênero.

Portanto, a ideia de uma licença-paternidade mais longa não é oferecer ao genitor alguns dias de descanso para “curtir o momento”, distribuir charutos aos amigos ou, quando muito, sair para comprar fraldas nos primeiros dias de indisponibilidade da progenitora (e pagar de pai presente nas redes sociais).

Pai; bebê; licença-paternidade
Licença-paternidade. Crédito: Freepik

A proposta tem outro alcance: criar uma equiparação — ou, em outras palavras, fazer com que a “penalidade” recaia igualmente sobre ambos, mulher e homem. Com licenças equiparadas, os benefícios seriam gigantescos. Primeiro, a pausa deixaria de ser uma penalidade, tornando-se uma condição natural da vida e da renovação geracional. Segundo, as empresas deixariam de se sentir desestimuladas a contratar mulheres, já que o afastamento temporário não recairia apenas sobre elas. E, por fim, haveria um redesenho evolutivo da própria família, com pais mais presentes desde o início da vida dos filhos — por vontade e por dever.

Diante disso, repergunto: esses vinte dias efetivamente equiparam homens e mulheres? Elevam o senso de responsabilidade parental? Protegem a ascensão profissional feminina?

Evidentemente que não. A nova lei apenas reforça a lógica de sempre. Ampliar de cinco para vinte dias é, no máximo, um gesto de boa vontade — insuficiente para romper a assimetria histórica. O pai continuará crescendo profissionalmente enquanto a mãe segue arcando com o ônus da maternidade. E com o agravante de gerar mais despesas à já sufocada Previdência Social.

As estatísticas permanecerão quase inalteradas: os cargos de chefia e os salários mais altos continuarão, em sua maioria, nas mãos dos homens, enquanto as batalhadoras mamães continuarão com as sobras.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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