> >
Relatório da CPI alivia para Guedes, Braga Netto e autoridades do AM

Relatório da CPI alivia para Guedes, Braga Netto e autoridades do AM

Parecer propõe indiciamento do atual ministro da Defesa, mas é econômico ao descrever suas ações e o cita apenas oito vezes

Publicado em 21 de outubro de 2021 às 17:34

Ícone - Tempo de Leitura min de leitura
Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia (CPIPANDEMIA) realiza oitiva de empresário apontado como financiador de disseminação de notícias falsas.
Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia (CPIPANDEMIA) realiza oitiva de empresário apontado como financiador de disseminação de notícias falsas. (Leopoldo Silva/Agência Senado)

O relatório final da CPI da Covid elaborado pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL) surpreendeu por não apresentar nomes citados em descobertas da comissão ao longo de seis meses de investigação. Embora lembradas por senadores durante as sessões, algumas autoridades foram poupadas no documento.

O ministro Paulo Guedes (Economia) e autoridades do Amazonas investigadas pela crise de oxigênio, por exemplo, foram eximidos de culpa em atos relacionados à pandemia.

O relatório também deixou de sugerir qualquer crime a peças-chave na resposta do governo à pandemia em comunidades indígenas, como o presidente da Funai, Marcelo Xavier da Silva, e o secretário da Sesai (Saúde Indígena), Robson Santos da Silva.

Renan chegou a propor o indiciamento de ambos por genocídio, em versão prévia do parecer, mas as tipificações foram derrubadas após o relator decidir livrar também o presidente Jair Bolsonaro desse mesmo crime.

O relator ainda é econômico ao citar as ações do ministro da Defesa, Braga Netto, mas sugere indiciar o general pelo crime de epidemia com resultado morte.

A CPI instalada pelo Senado para investigar as ações e omissões da gestão Bolsonaro na pandemia chegou à reta final com a proposta de punição do presidente por nove crimes.

O relatório apresentado nesta quarta-feira (20) por Renan sugere que Bolsonaro seja indiciado sob as acusações, dentre outras, de prevaricação, charlatanismo, crimes contra a humanidade e de responsabilidade.

A votação do documento na comissão –composta por 11 titulares, dos quais 7 formaram um grupo que atuou em conjunto para chegar ao texto final– deve ocorrer no próximo dia 26. Até lá, o texto pode ser modificado.

Poupada pelo relator, a pasta de Guedes foi citada nos depoimentos e documentos da CPI por apostar em medidas contrárias ao distanciamento social, para destravar a economia.

Documentos também apontam que sua equipe chegou a se opor a mudanças na legislação para destravar a compra da vacina da Pfizer, como mostrou o jornal Folha de S.Paulo.

Outra acusação relacionada à Economia foi feita pela advogada Bruna Morato, que representa médicos que denunciaram irregularidades da Prevent Senior.

Em seu depoimento à CPI, Morato disse que havia um "pacto" entre a operadora e o chamado gabinete paralelo, composto por médicos que aconselhavam o presidente Bolsonaro e incentivavam o uso do "kit Covid".

Um dos objetivos deste alinhamento, segundo ela, era elaborar estratégia para evitar o fechamento da economia durante a pandemia, usando o tratamento precoce como "esperança" para a população.

Em uma fala que chamou a atenção dos senadores, a advogada mencionou que o gabinete paralelo atuava em consonância com o Ministério da Economia, que defendia a mesma estratégia.

Membros da cúpula da Economia ainda minimizaram risco de nova alta de casos e mortes na pandemia, meses antes do colapso sanitário no Amazonas. O time de Guedes também apostou em "imunidade de rebanho" sem ouvir a Saúde.

Apesar disso, o nome de Guedes só foi citado quatro vezes no documento, em passagens de pouca importância, como ao mencionar que a pasta recebeu proposta por vacinas da Pfizer.

O vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), chegou a defender que Guedes e o secretário nacional de política econômica, Adolfo Sachsida, fossem incluídos na lista de pedidos de indiciamento.

Na semana passada, Renan também disse que concordava, mas que aguardaria aval da maioria do G7, como é chamado o grupo majoritário da comissão.

A inclusão de Guedes na lista foi um dos temas de reunião dos membros da CPI na casa do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), na noite anterior à apresentação do relatório.

No entanto, uma parte do grupo, incluindo o presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM), considerou que pedir o indiciamento do ministro poderia afetar ainda mais a situação econômica do país.

O texto de Renan ainda poupa autoridades estaduais e municipais do Amazonas que são investigadas pela crise do oxigênio de janeiro. Ainda assim, a comissão do Senado ouviu o relator da CPI da Assembleia Legislativa local, Fausto Vieira dos Santos Junior (MDB), e o ex-secretário Marcellus Campêlo.

O tema é caro ao grupo majoritário, uma vez que dois membros são do estado do Amazonas. Ambos, Omar Aziz (PSD-AM) e Eduardo Braga (MDB-AM), são favoráveis à inclusão do governador Wilson Lima e de Campêlo nas propostas de indiciamentos.

No entanto a maior parte dos membros do grupo majoritário considera que seria apenas para atender questões políticas locais, uma vez que os dois já são réus em processos no Amazonas.

Algumas das lacunas do texto são criticadas pelos membros da comissão, que articulam mudanças antes da votação do parecer da CPI da Covid, marcada para o próximo dia 26.

Seis dos nomes da lista de investigados da comissão não estão entre os alvos de pedidos de indiciamento de Renan, como Marcellus Campêlo, o militar da reserva Helcio Bruno, que participou de negociações da Davati por vacinas, e Emanuel Catori, diretor do laboratório Belcher.

Catori chegou a aparecer no relatório preliminar de Renan, mas foi excluído, assim como o pastor Silas Malafaia, o presidente da Funai e o secretário da Sesai.

Apesar do pedido de indicamento, Braga Netto aparece apenas oito vezes no relatório de 1.065 páginas. Já o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), é mencionado mais de 80 vezes.

O senador afirma que o general tem responsabilidade por falhas na resposta do governo da pandemia, pois comandava o órgão responsável por articular as ações interministeriais, no período em que era chefe da Casa Civil.

Cita ainda que o militar estava presente na discussão sobre mudar a bula da hidroxicloroquina por decreto.

O relatório, porém, não menciona interferências diretas do militar na estratégia de combate do Ministério da Saúde na crise sanitária. Um destes gestos, como mostrou a Folha de S.Paulo, foi determinar que as declarações sobre a pandemia deveriam ser feitas dentro do Palácio do Planalto e limitar a participação da Saúde.

Braga Netto nem sequer foi chamado a depor na CPI da Covid, por falta de acordo e receio de criar crise institucional com as Forças Armadas.

Ainda no relatório, Renan foca no caso da Davati a análise sobre as negociações do governo com vendedores que não tinham nenhum aval das farmacêuticas.

O relatório ignora que o ministro Eduardo Pazuello chegou a se comprometer, em vídeo, com a compra da Coronavac pelo triplo do preço com empresários sem as credenciais da Sinovac.

A equipe do relator aponta que não havia provas para sustentar o pedido de indiciamento de algumas pessoas que chegaram a ser mencionadas no texto. Em alguns casos, a equipe de Renan recomenda abertura de ação civil para reparação de dano à saúde e moral coletivo.

Apesar de poupar o presidente da Funai e o chefe da pasta que cuida da saúde indígena, o relatório dedica uma seção inteira a avaliar as ações do governo Bolsonaro nestas comunidades.

O texto aponta negligência, cita a entrega de medicamentos sem eficácia aos indígenas e diz que a campanha de fake news promovida por Bolsonaro sobre a vacina teve impacto também nas aldeias. Ainda afirma que o governo, em alguns casos, só agiu quando foi cobrado pelo Judiciário.

O relatório também poupa militares que participaram da gestão de Eduardo Pazuello na Saúde. Entre eles, o tenente-coronel da reserva Jorge Luiz Kormann, ex-assessor de Pazuello, um dos responsáveis por tentar alterar a forma de divulgação dos dados da pandemia.

Há expectativa entre parte dos membros da CPI de Renan incluir na sua lista pelo menos o reverendo Amilton Gomes de Paula, presidente da ONG Senah; o secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégico do Ministério da Saúde, Hélio Angotti Neto; e a servidora Regina Célia Silva de Oliveira (fiscal de contrato na pasta na compra da vacina indiana Covaxin).

Angotti Neto ocupa cargo estratégico na Saúde, com controle sobre áreas que tratam da pesquisa e produção de medicamentos.

Ele é defensor do uso do chamado "kit Covid" e chegou a mobilizar sua equipe para tentar inserir no rol de produtos ofertados pelo programa Farmácia Popular a hidroxicloroquina, entre outras drogas sem eficácia para a Covid-19.

O secretário também acompanhou comitiva do governo brasileiro a Israel para conhecer o spray nasal contra a Covid, que nunca saiu do papel. Ainda apoiou estudos com a proxalutamida. A Conep (Comissão Nacional de Ética e Pesquisa) pede investigação da PGR sobre a morte de 200 pessoas que participaram deste experimento.

Este vídeo pode te interessar

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais