Publicado em 11 de dezembro de 2024 às 20:31
Conteúdo analisado: Publicação com imagem de uma agência dos Correios ao lado da logo do site de vendas AliExpress. Na legenda, está o texto: “EXTRA!: Correios têm prejuízo de R$ 2 bilhões com queda nas importações. A “taxa da blusinha” reduziu compras em sites internacionais, impactando a receita dos Correios e agravando seus desafios financeiros. VAI DAR CERTO ‘ÇIM’…”. O conteúdo foi repostado como print em um vídeo. No fundo, há um personagem de série de comédia que ri e diz “era disso que eu estava falando”. >
Onde foi publicado: X e TikTok.>
Contextualizando: A agência estatal Correios registrou um déficit de mais de R$ 2 bilhões nos nove primeiros meses deste ano. Publicações na internet associam a queda no faturamento à “taxa das blusinhas”, nome popular para o fim da isenção do imposto de importação de compras em sites internacionais no valor de até US$ 50.>
Após a associação entre a queda no faturamento dos Correios e a “taxa das blusinhas”, conteúdos que apontam o impacto da nova legislação passaram a circular nas redes sociais. É o caso de uma peça que afirma que o imposto “reduziu compras em sites internacionais, impactando a receita dos Correios e agravando seus desafios financeiros”, o que motivou este Contextualizando.>
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O Comprova contatou as assessorias de imprensa da Receita Federal, da Shein, da Shopee e da AliExpress, gigantes do varejo internacional, para verificar uma suposta queda nas compras de importação após a implementação da “taxa das blusinhas”. A Receita e a AliExpress não responderam até a publicação desta checagem, e a Shein informou que não irá se manifestar. A Shopee relatou que, como o foco do comércio é local, a medida não afetou o negócio.>
Para a economista e professora de MBAs da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro (FGV-RJ), Carla Beni, os R$ 2 bilhões de resultado negativo dos Correios não estariam relacionados exclusivamente com a “taxa das blusinhas”, visto que o imposto passou a ser cobrado em 1º de agosto, e o levantamento da estatal se refere aos nove primeiros meses do ano.>
“Então, a taxa das blusinhas, sim, faz parte do processo, mas jamais, por uma questão cronológica, é a responsável por essa questão dos R$ 2 bilhões”, afirmou a economista.>
Segundo Carla, a dívida de R$ 7,6 bilhões relacionada ao Postalis representa uma grande parcela sobre o déficit da estatal. A especialista apontou que o prejuízo causado pelo fundo de pensão é resultado de anos de má gestão e falta de novas adesões desde 2008.>
Fabio Gallo Garcia, professor da FGV-SP, reforça que apenas a “taxa das blusinhas” não explica todo o prejuízo da agência postal. “Os Correios têm problemas muito antigos, administrações complicadíssimas do ponto de vista de gestão mesmo”, afirmou. Segundo ele, esse cenário é consequência de vários governos, inclusive do atual.>
De acordo com o docente, a estrutura ineficiente dos Correios, sem modernização, além do acúmulo das demandas dos próprios funcionários ao longo dos anos, contribuem para o problema financeiro da estatal.>
“Os problemas dos Correios, como eu disse, são vários. Isso levou a uma ineficiência, levou uma empresa com literalmente um perfil de déficit, portanto, de prejuízo, e que agora tem que se resolver. O problema da ‘taxa das blusinhas’ só agravou essa situação. Diga-se que o Correio já devia ter planejado isso, já devia ter considerado isso na sua gestão”, destacou Gallo.>
Por meio de nota, os Correios afirmaram ao Comprova que as principais causas do resultado acumulado de 2024 vão além da queda nas importações.>
De acordo com a agência, as principais razões para o déficit são o recebimento, pela atual gestão, de um prejuízo de cerca de R$ 1 bilhão herdado do governo anterior, a queda de receita devido à falta de reajuste tarifário nos últimos cinco anos e a redução do volume de encomendas internacionais pela entrada em vigor do Programa Remessa Conforme — “que trouxe mais transparência, controle e agilidade para a entrada de encomendas importadas, mas, por outro lado, causou uma queda no fluxo de importações”, informou a estatal.>
Além disso, a agência disse que sofre as consequências do “processo de sucateamento conduzido pela gestão anterior”, que estava privatizando a estatal, e que anunciou um resultado “positivo”. Em nota, os Correios atribuem esse saldo positivo do governo anterior a medidas de corte de gastos como fechamento de agências, suspensão de investimentos e retirada de direitos, entre outras.>
Chamada popularmente de “taxa das blusinhas”, a Lei 14.902/2024 estabelece a taxação de compras internacionais de até US$ 50. O objetivo da medida é aumentar a arrecadação do governo em um contexto de desequilíbrio das contas públicas. Uma matéria da CNN de setembro deste ano mostrou que o governo federal estima arrecadar R$ 700 milhões com “taxa das blusinhas” em 2024.>
A lei ganhou este nome porque afeta principalmente consumidores que costumam comprar produtos de até US$ 50 de lojas estrangeiras, como a Shein, que vende majoritariamente peças de vestuário. Com a legislação, compras realizadas em sites estrangeiros, que antes estavam isentas se o valor fosse de até 50 dólares, agora estarão sujeitas a uma nova tributação. Para compras acima de 50 dólares, a alíquota se mantém em 60% (com dedução de 20 dólares), informou a Receita Federal.>
Antes da taxa das blusinhas, a regra para tributação de produtos importados estava sob o regime de Remessa Conforme, introduzido em agosto de 2023. A medida isentava o imposto de importação para compras de até 50 dólares de empresas aderidas ao programa.>
Com a “taxa das blusinhas”, produtos de até US$ 50 dólares (com frete incluso) adquiridos de empresas aderidas ao Remessa Conforme agora passam a pagar uma alíquota de 20% de imposto de importação. Compras de medicamentos de até US$ 10 mil continuam isentas.>
Para empresas de comércio eletrônico não certificadas pela Receita Federal no Programa Remessa Conforme, ou compra por pessoa jurídica, o Imposto de Importação de 60% será cobrado independentemente do valor da compra, sobre a soma “valor do produto + valor do frete + valor do seguro”. Não há desconto, destacou a Receita.>
Além disso, o ICMS de 17%, que incide sobre todas as compras internacionais (após o imposto de importação) de varejo, também não sofreu alterações.>
Fontes consultadas: Correios, Lei 14.902/2024, Receita Federal e os economistas Carla Beni, professora de MBAs da FGV-RJ, e Fabio Gallo Garcia, professor da FGV-SP.>
Por que o Comprova contextualizou este assunto: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições. Quando detecta nesse monitoramento um tema que está sendo descontextualizado, o Comprova coloca o assunto em contexto. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.>
Para se aprofundar mais: O Comprova desmentiu anteriormente uma peça de desinformação envolvendo os Correios, revelando que a distribuição de material de campanha pela estatal é regular, ao contrário do que diz homem em vídeo. Sobre a cobrança de impostos, a iniciativa mostrou que a reforma tributária não prevê taxa de 25% em compra e venda de imóveis, diferentemente do que afirma post, e que o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), citou taxa para aterrar fios em 2023, e não em 2024.>
Investigação e verificação
Investigado por: Metrópoles
Texto verificado por: Folha, Estadão, A Gazeta e Terra
O Projeto Comprova é uma iniciativa colaborativa e sem fins lucrativos liderada e mantida pela Abraji – Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo e que reúne jornalistas de 42 veículos de comunicação brasileiros para descobrir, investigar e desmascarar conteúdos suspeitos sobre políticas públicas, eleições, saúde e mudanças climáticas que foram compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens. A Gazeta faz parte dessa aliança.
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