Publicado em 17 de fevereiro de 2019 às 15:37
Há um mês, o Aeroporto de Congonhas, na zona sul de São Paulo, ficou fechado por 20 minutos. Aviões não pousavam nem decolavam e 16 voos acabaram atrasados, causando prejuízos. Não era problema na pista nem mau tempo. O motivo da confusão: um drone que invadiu o espaço aéreo. Casos como esse acontecem com mais frequência e preocupam aeroportos no mundo todo. No Brasil, os terminais e as autoridades estão criando estratégias para fechar o cerco a esses equipamentos, que, segundo especialistas, podem até derrubar um avião.>
Drones que voam perto dos dois aeroportos mais movimentados do Brasl já não passam no anonimato. Um sistema, em teste em Congonhas e implementado neste ano no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, detecta a aproximação desses equipamentos e envia a localização do objeto ao centro de controle de voos. Na tela de computador dos controladores, um símbolo vermelho indica um foco de alerta.>
"Toda vez que o drone adentra o raio de 7 quilômetros, uma tela ligada 24 horas alarma o funcionário (do centro de controle operacional)", explica o comandante Miguel Dau, diretor de operações do GRU Airport, concessionária que administra Guarulhos. E mesmo quem não está na sala no momento recebe o alerta, que também chega por e-mail e mensagem de celular.>
"Instalamos pequenas antenas (ao redor do aeroporto) que captam todos os sinais transmitidos, como os de Wi-Fi e de rádio, misturados. A inteligência é pegá-los e entender quais são de drones", diz Eduardo Neger, diretor de Engenharia da Neger Telecom, empresa que deu origem à Drone Control. A tecnologia surgiu após pesquisas em parceria com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Segundo Neger, como há comunicação entre o controle remoto e o drone, é possível saber onde ambos estão. "Quem dá a informação é o próprio equipamento.">
>
Se o drone se aproxima da chamada "zona vermelha" do aeroporto, a 3 km, a preocupação aumenta. Nesses casos, explica Dau, o terminal em Guarulhos identifica a localização do controlador do drone e aciona autoridades para encontrá-lo.>
Embora seja possível do ponto de vista técnico, não há autorização para abater o drone. Desde que foi ligado pela primeira vez em Cumbica, há um ano, o sistema identificou mais de 500 desses objetos zanzando pelas redondezas.>
Todo o esforço para mirar os drones não é excesso de zelo. Se acerta superfícies de uma aeronave, como partes das asas ou da cauda, um drone pode derrubá-la. E, de dentro do avião, dificilmente um piloto consegue avistá-lo e desviar. O problema também aflige helicópteros.>
"Um drone pequeno, de até 1 quilo, equivale ao impacto de um pássaro, que pode causar danos à turbina, com prejuízo. Mas um maior pode causar acidente", diz Jorge Eduardo Leal Medeiros, professor de Transporte Aéreo e Aeroportos da Universidade de São Paulo (USP).>
Não há registro de colisões em terminais brasileiros, mas as operações tiveram de ser suspensas cinco vezes - três delas em Congonhas desde 2017. Prejuízos ao aeroporto fizeram acender o sinal amarelo. Segundo a Infraero, que administra Congonhas, testes com a tecnologia antidrone começaram em novembro de 2018. No Aeroporto Internacional Tom Jobim, no Rio, a concessionária RIOGaleão também deve contratar o sistema nos próximos meses.>
O Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea), da Aeronáutica, também estuda medidas do tipo. Ainda não há detalhes, mas o órgão espera colocá-las em prática este ano. "Buscamos formas de fazer a detecção, o monitoramento e a neutralização dos drones", diz o coronel aviador Jorge Humberto Vargas, chefe da divisão de coordenação e controle do Decea.>
Não é brinquedo>
A um clique na internet e disponível até em lojas de departamento, comprar um drone é fácil, mas levantar voo requer cuidados. É preciso registrá-lo em três órgãos: o Decea, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e a de Telecomunicações (Anatel). Só na Anac, o número de equipamentos registrados chegou a 59,5 mil em dezembro - quase o dobro do registrado um ano antes.>
Drones usados para recreação não podem levantar voo a 9 km de distância da pista, pelas regras do Decea. Quem desrespeita as normas está sujeito a multas e até prisão de até cinco anos. Equipamentos mais modernos já têm tecnologia interna que impede a decolagem em área irregular.>
Em Campinas (SP), o Aeroporto de Viracopos aposta na parceria com quem vive ao redor. Dois drones foram vistos por perto - um este ano e outro em 2018. "Fazemos palestras nas escolas sobre perigo de balão, laser e descarte de lixo. Agora, incluímos o drone", disse Rosa Maria Brollo Fernandes, gerente de Segurança Operacional de Viracopos e vice-presidente do Grupo Brasileiro de Segurança Operacional de Infraestrutura Aeroportuária (Baist).>
No Baist, que reúne representantes dos principais aeroportos do País e órgãos do governo, as discussões estão em pauta e motivaram até a criação de uma equipe específica só para cuidar do assunto. "Virou uma preocupação da aviação", diz Rosa.>
Fiz uma manobra para me afastar >
Era verão e, de dentro do helicóptero, socorristas do Corpo de Bombeiros tentavam alertar um banhista que nadava em uma área de risco do mar do Guarujá (SP). Mas o perigo veio do céu. Quando olhou para o lado, o coronel Paulo Luiz Scachetti Júnior, que pilotava a aeronave, deu de cara com um drone. Comandante da Aviação da Polícia Militar paulista, ele estava a cerca de 30 metros de altura.>
"Olhei para a esquerda e consegui avistar o drone se aproximando. Quando chegou a uma faixa de uns 30 metros de mim, fiz a manobra para me afastar." Não houve acidente - e o dono do drone nunca foi encontrado. "Ele estava me vendo? Não sei. Não conheço as intenções. Se subo, ele pode subir comigo e, pronto: bate. Há um receio. Não é confortável.">
Além dos riscos a aviões, pilotos de helicópteros também sentem os impactos do céu salpicado pelos drones. São eles os que mais avistam os equipamentos porque voam em altura e velocidade mais baixas.>
"Temos recebido vários relatos de avistamento de drones tanto em aproximações para pouso quanto em voos de cruzeiro. Até com risco de colisão", diz o comandante Thales Pereira, presidente da Associação Brasileira de Pilotos de Helicópteros (Abraphe).>
Há pouco mais de um ano, ele próprio viu um, na região da Barra Funda, zona oeste paulistana. "Passei voando por ele. Estava a uma altura bem próxima à da minha aeronave e a uma distância de, no máximo, 60 metros", conta Pereira, que voava à noite. "Se estivesse na mesma rota e na mesma altitude, provavelmente teria uma colisão.">
Perigo>
O choque com um drone, em áreas sensíveis como o rotor e superfícies que dão sustentação ao helicóptero, pode causar a queda da aeronave, segundo especialistas. Na Abraphe, orientações sobre a presença dos equipamentos já foram incluídas no curso de jovens pilotos.>
"O piloto voava até um tempo atrás preocupado com urubus, fios, torres, pipas e outras aeronaves. Hoje voa preocupado com pássaros, fios, torres, mas também com drones", diz o tenente-coronel Renato Lima, comandante do grupamento aéreo da Polícia Militar da Bahia. O órgão também orienta seus pilotos e faz atividades com "droneiros" para que conheçam as regras.>
Pelo mundo>
Batidas>
Casos de colisão não são frequentes e até hoje não houve registro de vítimas. Na Argentina, em 2017, o choque de um drone com a parte dianteira de um Boeing que voava da Patagônia a Buenos Aires causou estragos.>
Prejuízos>
Os problemas mais comuns são o fechamento das pistas. Anteontem, o Aeroporto Internacional de Dubai, um dos mais movimentados do mundo, suspendeu pousos e decolagens por 30 minutos. Em Londres, há um mês, o Aeroporto de Heathrow ficou fechado por uma hora. No Brasil, houve cinco casos semelhantes. Quando isso ocorre, pode haver um efeito cascata, com atrasos em outros locais.>
Reações>
Vários países testam tecnologias para barrar esses equipamentos. As estratégias vão desde o "corte" de sinal até o treinamento de águias para capturá-los, como na Holanda. Na Europa e nos Estados Unidos, a preocupação maior é com equipamentos terroristas.>
Regras>
As normas sobre a aproximação de drones em aeroportos variam entre os países. Nos EUA, é necessário autorização e existem distâncias mínimas permitidas. Há nações que sequer têm lei sobre o tema e outras, como Irã e Cuba, baniram o equipamento. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.>
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta