O urbanismo do improviso não surge por acaso. É um espelho das nossas escolhas políticas e prioridades de gestão, que desnuda a omissão estatal e a desigualdade profunda no tecido urbano. Como Raquel Rolnik argumenta em "Guerra dos Lugares" (2023), a informalidade urbana é "informalidade planejada por omissão" – uma ferramenta de exclusão social e segregação socioespacial.
Os dados são alarmantes. Levantamentos de 2024 do MapBiomas com LEHG/Unicamp mostram que ocupações em encostas no Brasil cresceram 3,3% ao ano nos últimos 38 anos. Essas áreas são intrinsecamente vulneráveis a eventos extremos. No Espírito Santo, a urgência é visceral: Cariacica possui significativa população em risco geológico, e Vitória enfrenta projeções de aumento substancial de habitantes em áreas vulneráveis se o modelo atual não mudar radicalmente.
Esse crescimento caótico gera um ciclo perverso. A falta de planejamento empurra comunidades para periferias desamparadas, sem infraestrutura básica nem transporte público eficiente. Diante desse abandono, o automóvel individual emerge como "necessidade", não luxo. Mas essa solução agrava o problema coletivo: congestionamentos, poluição e crise climática amplificada.
Os impactos ambientais são severos. Ocupações irregulares em encostas e margens de rios provocam erosão, deslizamentos, enchentes e alteram o ciclo hidrológico, comprometendo a biodiversidade e recursos hídricos. A vulnerabilidade climática dessas comunidades é amplificada ao extremo.
O urbanismo do improviso revela uma verdade fundamental: planejamento urbano é ato político. Sua ausência não é neutra – é escolha consciente com consequências devastadoras.
Para o Espírito Santo, a hora é agora, precisamos de ações imediatas:
1. Planejamento Integrado e Participativo: planos diretores, de mobilidade, adaptação climática e habitação coesos, construídos com escuta ativa da sociedade civil.
2. Infraestrutura Verde e Social: soluções baseadas na natureza, moradia digna, transporte público de qualidade e acesso equitativo a equipamentos essenciais.
3. Fiscalização e Monitoramento: Mecanismos robustos de implementação efetiva das políticas, com transparência e responsabilidade públicas.
Como presidente do CAU-ES, reafirmo nosso compromisso com cidades mais justas, resilientes e sustentáveis, onde o improviso ceda lugar a um planejamento que valoriza intrinsecamente a vida humana e nosso meio ambiente.
Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.