
Aos olhos da população, a figura do médico sempre foi equiparada a de um super-herói. Cobertos por um jaleco branco e empoderados pelo saber técnico-científico, eles têm a difícil e nobre missão de trabalhar em prol da cura do paciente, sempre que possível.
Pelo tamanho da responsabilidade (cuidar de vidas humanas), pensa-se que não pode haver margem para erros. E isso se aprende desde a faculdade. “Vigilância constante”, eles diriam!
Então, um dia o estudante cresce e se torna médico. No primeiro mês de trabalho, vem o primeiro erro. Na correria habitual do pronto-socorro em que fora contratado, ministra dipirona a um paciente sem antes tê-lo perguntado sobre seu histórico alérgico. Trinta minutos depois, o paciente sofre uma reação alérgica. Então, surge o primeiro autoquestionamento: “Será que eu sirvo para isso?”.
Após três anos, esse médico, agora mais experiente, entra na residência e, de novo, mais um erro: ao examinar a garganta de um paciente, imaginou que seria apenas uma leve infecção, prescreveu alguns antibióticos e lhe deu alta sem sequer comunicar o preceptor, pois não quis incomodá-lo com algo, a princípio, “banal” e de rotina. Porém, o que parecia ser uma simples infecção, na realidade, era algo mais grave, e aquele paciente retornou ao hospital em condições críticas, dado o erro de diagnóstico.
Dez anos se passaram, o médico se tornou especialista e, para a surpresa de muitos, outro erro, e assim sucessivamente...
Qual é o ponto em que quero chegar? Que é um grande equívoco continuar tratando o erro médico como um tabu. Não que a preocupação com ele deva acabar. Não é isso. Mas acredito que tal preocupação está mal colocada e parte de uma falsa dicotomia: a de que médicos bons só acertam e médicos ruins erram. Esquece-se, todavia, que o erro médico, em última análise, nada mais é do que um erro humano. Portanto, enquanto continuarmos sendo atendidos por humanos, inevitavelmente o erro continuará fazendo parte da nossa realidade.
O que separa, então, um médico bom de outro ruim diz mais respeito ao que é feito com o erro cometido do que com o erro em si, ou seja, quais atitudes serão tomadas para evitar que aquele erro se repita?
A grande verdade é que médicos gostariam de falar sobre seus erros, mas sentem-se constrangidos pelo julgamento, especialmente de seus próprios pares, que também foram moldados a buscar a inatingível perfeição. Porém, deixar de falar sobre os erros não irá fazer com que eles acabem. Na realidade, mantê-los ocultos só impede que outros colegas aprendam valiosas lições com essas experiências. Perde a classe médica. Perdem, principalmente, os próprios pacientes.
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E quanto ao “médico que nunca errou”... sinto lhe dizer, mas ele, definitivamente, não existe!
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