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Maradona: metade gênio, a outra metade do lado certo da história

Mesmo com a fama mundial, o jogador não se esqueceu de onde veio: sempre esteve comprometido com as causas populares, defendeu a soberania latino-americana e denunciou as falcatruas da cartolagem futebolística

  • Francisco Fernandes Ladeira
Publicado em 26/11/2020 às 13h00
Maradona conduziu a Argentina ao título da Copa do Mundo de 1986
Maradona conduziu a Argentina ao título da Copa do Mundo de 1986. Crédito: REUTERS/Gary Hershorn

Em 2012, o então articulista da revista Veja, Reinado Azevedo, no auge de seu conservadorismo, escreveu um artigo com um dos títulos mais desrespeitosos do jornalismo brasileiro. Em “Morre Oscar Niemeyer, metade gênio e metade idiota”, Azevedo apontava que (segundo sua equivocada concepção) o centenário arquiteto era genial em sua atividade profissional, mas politicamente idiotizado.

A notícia do falecimento de Diego Armando Maradona suscitou reações semelhante as de Azevedo oito anos atrás. Na impossibilidade de questionar Maradona como jogador, setores reacionários o atacaram a partir de argumentos moralistas e pela posição política. Pois bem, se nos gramados Maradona foi genial; sua outra metade, o ser humano, esteve do lado certo da história.

De família proletária, Maradona, mesmo com a fama mundial, não se esqueceu de onde veio: sempre esteve comprometido com as causas populares. Defendeu a soberania latino-americana, criticou o imperialismo estadunidense, denunciou as falcatruas da cartolagem futebolística, apoiou governos progressistas e se opôs a políticos comprometidos com interesses alheios ao povo. Por ser uma voz engajada, em um meio geralmente alienado, foi odiado pelos poderosos do planeta.

Em campo, ele foi protagonista daquela que é considerada por muitos como a maior vitória da seleção argentina. O resultado positivo contra a Inglaterra, na Copa de 86, não foi uma mera partida de futebol. Pelo menos no plano simbólico, de alguma forma, lavou a alma dos portenhos, apenas quatro depois de serem derrotados pelos britânicos na Guerra das Malvinas.

No mundial seguinte, quando Itália e Argentina se enfrentariam na cidade de Nápoles, Maradona, então jogador do principal clube local, solicitou aos torcedores napolitanos que apoiassem a seleção platina contra a Azzurra como forma de protesto pelo histórico preconceito sofrido pelos italianos meridionais por parte de seus compatriotas do norte.

Além do Napoli, Maradona é ídolo de outro clube de massa: o Boca Juniors. Isso não é por acaso, os torcedores sabem que o ex-camisa 10 também é como eles: é o Maradona do povo. A identificação vai além dos gramados. Morre o homem, fica a lenda.

Nas redes sociais, não faltam referências negativas a Maradona, acusado de “mal exemplo”, “drogado”, “populista” e “apoiador de ditadores”. Já era esperado. Esse tipo de postura é típico dos chamados “haters”, que, parafraseando o infeliz artigo de Reinado Azevedo, são metade idiotas, e a outra metade também.

O autor é escritor, mestre em Geografia e articulista do Observatório da Imprensa

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