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É PhD em Management Engineering pela Technical University of Denmark (DTU) e pós-doutora em Administração pela Fucape Business School, consultora de negócios e especialista em empreendedorismo internacional e inovação

Lições do conceito do mercado de luxo para o empreendedorismo brasileiro

Mais do que ostentação, o luxo ensina sobre valor, atenção aos detalhes, construção de marca e relacionamento com clientes — princípios que podem transformar qualquer negócio

  • Sarah Venturim Lasso É PhD em Management Engineering pela Technical University of Denmark (DTU) e pós-doutora em Administração pela Fucape Business School, consultora de negócios e especialista em empreendedorismo internacional e inovação
Publicado em 06/11/2025 às 11h46

Falar em mercado de luxo, no Brasil, ainda provoca reações divididas. Para alguns, é sinônimo de ostentação e exclusividade inacessível. Para outros, representa excelência, desejo e diferenciação. Mas além das aparências, o universo do luxo carrega uma série de lições valiosas, inclusive para empreendedores que atuam fora dele. E talvez seja hora de olhar com mais atenção para o que esse mercado faz de forma tão estratégica.

O luxo não vende apenas produtos. Vende experiências, narrativas e sensações. Ele não compete por preço, mas por valor percebido. Enquanto muitos negócios brigam para oferecer mais por menos, o luxo aposta em oferecer menos com mais significado, qualidade e cuidado. E aí está a primeira lição: valor não é sinônimo de volume. É possível crescer sem escalar demais, lucrar sem massificar, fidelizar sem depender de descontos.

Luxo: calçado, perfume e joias
Luxo: calçado, perfume e joias. Crédito: Pixabay

Empreendedores que observam o mercado de luxo aprendem que detalhes importam. No atendimento, na embalagem, na forma de comunicar e até no silêncio. Marcas de luxo não gritam, não fazem promessas vazias. Elas constroem uma identidade sólida, coerente e refinada ao longo do tempo. Isso exige paciência, visão e consistência, três virtudes que o empreendedorismo brasileiro nem sempre cultiva, num ambiente onde tudo precisa ser imediato.

Um dos pilares silenciosos do mercado de luxo é o craftsmanship: a maestria na execução. Por trás de cada peça de alta costura, joia, perfume ou móvel de luxo, há horas de trabalho minucioso, técnicas refinadas e, muitas vezes, gerações de conhecimento acumulado. O luxo valoriza o tempo: o tempo que se leva para fazer bem-feito, o tempo que uma peça dura, o tempo da tradição. Ele resgata a ideia de que excelência não é fruto da pressa, mas da precisão. Essa atenção quase obsessiva aos detalhes não é sobre perfeccionismo vazio, mas sobre respeito: pelo produto, pelo cliente e pelo legado da marca. E aqui está uma lição poderosa para empreendedores de qualquer segmento, em tempos de velocidade, eficiência e produção em escala, oferecer algo feito com profundidade e intenção pode ser, paradoxalmente, o diferencial mais inovador.

O luxo, afinal, é sustentado por características muito além do preço. Ele se apoia na raridade, na exclusividade, na autenticidade e no tempo, tanto no que se leva para criar quanto no que se deseja durar. Carrega uma aura simbólica, que transcende a função prática do produto. Uma bolsa de luxo não é apenas um acessório; ela comunica status, história, pertencimento a um determinado imaginário cultural. O luxo não precisa explicar seu valor, ele o encarna. E compreender isso é fundamental para empreendedores que buscam construir marcas com alma, que resistam à pressa do mercado e deixem marcas que não se apagam com a próxima tendência.

Outro ensinamento vem da construção de marca. No luxo, branding não é apenas um logotipo bonito. É reputação, história, valor simbólico. Marcas de luxo são desejadas porque contam bem sua origem, sabem quem são, para quem falam e o que representam. Esse senso de clareza pode, e deve, ser absorvido por qualquer negócio, mesmo os mais populares. Afinal, ter uma marca com identidade forte é o que permite resistir às crises e às modas passageiras.

O mercado de luxo também ensina sobre relacionamento. Enquanto o varejo tradicional encara o cliente como transação, o luxo trata como vínculo. O cliente é ouvido, lembrado, encantado. Essa atenção personalizada não exige investimentos milionários, exige postura. E qualquer empreendedor, independentemente do porte, pode se perguntar: estou tratando meus clientes como únicos ou como números?

Claro que o luxo tem suas limitações. É um mercado que, por definição, opera com exclusão. Nem tudo o que ele pratica pode ou deve ser replicado em modelos democráticos. Mas há algo na sua lógica que precisa ser resgatado: a valorização do tempo, do cuidado, da profundidade. Em um mundo acelerado, onde tudo parece descartável, oferecer algo bem-feito, com intenção e permanência, pode ser o maior diferencial competitivo.

No fim, não se trata de tornar seu negócio “luxuoso”. Trata-se de aprender com quem trabalha com excelência há séculos. De buscar mais propósito e menos volume. Mais identidade e menos barulho. Mais profundidade e menos urgência. Porque o verdadeiro luxo, hoje, pode ser justamente isso: fazer com calma, com alma e com valor.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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