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Kelder é padre, coordenador do Vicariato para Ação Social, Política e Ecumênica da Arquidiocese de Vitória. Joana é professora da rede pública da Serra (ES), doutora em Letras (Ufes)

Escola sem partido atenta contra o papel da escola e do professor

Por meio de uma linguagem e argumentos simplórios, movimento promove polarizações do campo político, avançando para o campo educacional, sob o pretexto de que as escolas e os professores doutrinariam os estudantes

  • Kelder Brandão e Joana d’Arc B. Herkenhoff Kelder é padre, coordenador do Vicariato para Ação Social, Política e Ecumênica da Arquidiocese de Vitória. Joana é professora da rede pública da Serra (ES), doutora em Letras (Ufes)
Publicado em 27/03/2022 às 02h00
Escola de Linhares deve indenizar aluno impedido de entrar em sala de aula.
Escola de Linhares deve indenizar aluno impedido de entrar em sala de aula. Crédito: Divulgação | TJES

O texto do “Manifesto em defesa da educação com fraternidade”, lançado neste mês de março pela Arquidiocese de Vitória, foi produzido a partir da escuta realizada no encontro de formação e nos diálogos preparativos para a abertura da Campanha da Fraternidade 2022, reunindo anseios e reivindicações na defesa de pontos que fazem parte da luta histórica por educação de qualidade no país.

Um dos pontos defendidos a partir dessa escuta é a liberdade de cátedra, ou seja, a defesa da autonomia do professor para exercer a sua docência, respeitadas as diretrizes educacionais e documentos oficiais, que regem a educação no país, a começar pela Constituição e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação.

Assim, o documento menciona projetos, ações e políticas que se pautam no controle curricular e, geralmente, estão também associados a interesses econômicos de grupos privados que exploram a educação. O Escola Sem Partido, citado no manifesto é, segundo as professoras da Unicamp Dirce Zan e Débora Mazza, “o pano de fundo para a implementação deste conjunto orquestrado de políticas que sinalizam para uma sociedade menos democrática e mais autoritária”.

O movimento Escola Sem Partido apresenta um discurso que vem sendo compartilhado desde 2004. Por meio de uma linguagem e argumentos simplórios promove polarizações do campo político, avançando para o campo educacional, sob o pretexto de que as escolas e os professores doutrinariam os estudantes. Angariam a simpatia de famílias ao defender que as escolas não podem abordar questões como sexualidade, religião ou aspectos políticos, cabendo esses temas à família, de acordo com suas convicções.

Porém, privar as crianças e adolescentes do acesso à educação sexual, por exemplo, em vez de protegê-las, pode vulnerabilizá-las ainda mais aos riscos do abuso sexual que ocorre, na maior parte das vezes, dentro de casa ou na de parentes.

Pela Constituição, a educação é “direito de todos e dever do Estado e da família, promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (Artigo 205º. Constituição de 1988).

Os princípios que regem a educação escolar se pautam na igualdade de condições de acesso e permanência; liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento a arte e o saber; no pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas” (Artigo 206º. da Constituição Federal, 1988).

As tentativas de implementar projetos dessa natureza em nível nacional têm sido derrubadas por meio de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) no Supremo Tribunal Federal (STF). Além do mais, há legislações específicas para proteger crianças e adolescentes de conteúdos inadequados, como o Código Penal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Ecriad).

Em âmbito municipal, já houve mobilização contra projetos de lei dessa natureza, filiados ao ideário da Escola Sem Partido, que atentam contra a autonomia docente. Nossas Casas de Lei precisam deixar de ser palco da discórdia e do ódio para se tornarem espaços democráticos de debates sobre questões pertinentes e relevantes para a comunidade, propondo políticas que efetivamente contribuam para assegurar as condições necessárias para que professores possam exercer a sua função de educar.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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