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É educador e diretor-executivo da Escola Americana de Vitória

A escolha da escola para os filhos e os saberes para a educação do futuro

Ao escolher uma escola para um filho, os pais podem se orientar por esses sete saberes que, mesmo concebidos há mais de um quarto de século, continuam profundamente atuais

  • Cristiano Carvalho É educador e diretor-executivo da Escola Americana de Vitória
Publicado em 23/12/2025 às 14h00

Escolher uma escola para matricular um filho é, talvez, uma das decisões mais desafiadoras que os pais enfrentam. Diferentemente de outras escolhas de risco, esse “investimento no futuro” envolve aquilo que temos de mais precioso. E, ao contrário de retornos financeiros, o impacto de uma boa decisão educacional só se revela plenamente ao longo dos anos.

A pergunta que nos guia, portanto, não é sobre valores monetários, mas sobre valores formativos: o que espero da educação do meu filho? Que mundo o aguarda e como a escola pode prepará-lo para ele?

Para iluminar essa reflexão, recorro ao pensamento de um dos grandes nomes da educação contemporânea: Edgar Morin. No final dos anos 1990, ele apresentou à Unesco o que chamou de Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro. Passadas mais de duas décadas, o futuro bateu à nossa porta — e continua batendo todos os dias. Revisitar esses saberes nos ajuda a escolher escolas que dialoguem com a complexidade do presente e com as responsabilidades do amanhã.

1. As cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão

Morin nos lembra que o conhecimento humano é vulnerável a equívocos, ilusões e percepções limitadas. Educar para o futuro significa ensinar a reconhecer, questionar e aprender com os erros — e não a temê-los.

Ao buscar uma escola, vale observar:

Ela incentiva o pensamento crítico ou apenas a repetição de conteúdos?

Os erros são tratados como parte natural do processo de aprendizagem ou como falhas a serem punidas?

Ambientes que legitimam a dúvida e valorizam o processo — e não apenas o resultado — formam jovens mais lúcidos e confiantes.

2. O conhecimento pertinente

O conhecimento fragmentado já não dá conta da realidade. Morin defende uma compreensão contextualizada, multidimensional e sistêmica — capaz de conectar saberes.

Currículos investigativos, experiências culturais e artísticas amplas, metodologias ativas e diálogo com a comunidade permitem que o aluno compreenda o mundo como um todo e não como gavetas isoladas. O conhecimento deixa de ser uma ilha para se transformar em um arquipélago interligado.

3. Ensinar a condição humana

Educar também é ajudar o estudante a compreender a si mesmo — biologicamente, emocionalmente, socialmente e espiritualmente. O bem-estar passa a ser um eixo estruturante da formação.

Escolas que cultivam relações saudáveis, ambientes colaborativos e espaços para o letramento emocional reconhecem que aprender passa, antes de tudo, por ser. Assim como ensinamos idiomas, precisamos ensinar a nomear emoções, compreender limites e desenvolver empatia.

4. Ensinar a identidade terrena

Morin lembra que somos habitantes de um mesmo planeta e corresponsáveis por ele. Uma escola que prepara para o século XXI integra ao currículo temas como sustentabilidade, ciência climática, economia circular, responsabilidade social e consciência planetária.

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Sala de aula. Crédito: iStockphoto

Mais que aulas, trata-se de promover vivências: contato com espaços verdes, experiências de cuidado ambiental e oportunidades para que o estudante conecte olhar global com ações locais — o movimento “glocal” que forma cidadãos conscientes e atuantes.

5. Enfrentar as incertezas

Vivemos um tempo de transições aceleradas: inteligência artificial, novas profissões, realidades híbridas, desafios imprevisíveis. Morin nos convida a educar para a coragem diante do desconhecido — não para a ilusão do controle.

Escolas que cultivam criatividade, resolução de problemas complexos, antifragilidade e pensamento crítico preparam os jovens não para decorar respostas, mas para formular perguntas melhores. Como lembra Morin, “o conhecimento é a navegação em um oceano de incertezas entre arquipélagos de certezas”.

Pais devem observar se a escola oferece desafios reais, variedade de experiências e situações que desenvolvam autonomia. Espaços excessivamente previsíveis não dialogam com o mundo que já vivemos.

6. Ensinar a compreensão

Compreender, para Morin, é mais do que interpretar textos: é exercitar empatia, diálogo e convivência com a diversidade.

Escolas que valorizam múltiplas vozes, culturas e identidades contribuem para formar jovens mais tolerantes, curiosos e resilientes. A aprendizagem de idiomas e a convivência com diferentes perspectivas ampliam horizontes e fortalecem habilidades socioemocionais.

Clubs, conselhos estudantis e metodologias que favorecem o trabalho em grupo ensinam compreensão na prática — e não apenas por meio de discursos.

7. A ética do gênero humano

Morin afirma que indivíduo, sociedade e espécie são inseparáveis e se coproduzem mutuamente. Escolas que incorporam essa visão reconhecem que aprender é sempre um ato coletivo, tecido entre alunos, educadores, famílias e comunidade.

Projetos sociais, cultura inclusiva, participação ativa das famílias e protagonismo estudantil ajudam a construir essa ética. Nela, a formação acadêmica nunca está dissociada da responsabilidade social e da cidadania global.

Ao escolher uma escola para um filho, os pais podem se orientar por esses sete saberes que, mesmo concebidos há mais de um quarto de século, continuam profundamente atuais. Afinal, tratam daquilo que permanece: a complexidade do ser humano, a beleza do conhecimento e a responsabilidade de preparar jovens para viver com lucidez, coragem e encantamento em um mundo em permanente transformação.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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