Além do QR Code: restaurantes do ES devem ser obrigados a oferecer cardápio físico?

Projeto (PL 44/2023) que tramita na Assembleia quer que cardápios físicos sejam obrigatoriamente disponibilizados para os clientes em bares, restaurantes, lanchonetes e similares no Estado

Publicado em 05/03/2023 às 00h05
Pagamento por QR Code
Acesso por QR Code. Crédito: Pixabay

Cardápio físico é sinônimo de acessibilidade

Dary Pagung
É deputado estadual e autor do PL 44/2023. Líder do governo na Assembleia e Presidente da Comissão de Educação

As novas tecnologias chegaram. É fato. E vieram para ficar, para tornar as coisas mais fáceis, velozes e assertivas. É preciso que nos adaptemos a elas, não há outra saída. Mas utilizar algumas ferramentas em um aparelho celular, por exemplo, já é bem mais fácil para uma criança menor de 10 anos do que para muitos dos que leem este artigo neste momento. Todo esse avanço tem sido muito rápido. Os recursos disponíveis atualmente eram impensados na década passada.

Se para nós já é difícil acompanhar tantas mudanças, imagine para os nossos pais, avós e todos aqueles que pertencem a essa outra geração? A simples tarefa de escolher a refeição em um restaurante pode se tornar um constrangimento desnecessário. Uma pessoa com idade avançada, que faz uso trivial de um aparelho celular, não saberá como ler um QR Code para acessar e fazer seus pedidos em um cardápio digital. O mesmo se passará a uma pessoa mais humilde ou com algum aparelho obsoleto.

Mesmo os mais antenados, com smartphone de ponta, podem passar por aquele sufoco de ver sua bateria o deixar na mão bem na hora do almoço. O Projeto de Lei 44/2023, que segue em tramitação na Assembleia Legislativa, estabelece “a obrigatoriedade de bares, restaurantes, lanchonetes e similares disponibilizar cardápio físico para os consumidores no âmbito do Estado do Espírito Santo”. O objetivo é sanar uma dificuldade recorrente dos consumidores ao serem atendidos em locais que disponham apenas da forma virtual do cardápio.

Ainda assim, isso não inviabiliza a utilização de formas mais modernas. Diz o artigo 2º do mesmo PL: “é permitido o uso do cardápio em QR Code, devendo o estabelecimento manter nas suas dependências ao menos um cardápio físico como opção para o cliente que assim desejar utilizar deste formato”. É um direito básico do consumidor “a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços (...)” (Inciso III do Art. 6ª do CDC).

Muitos defendem a economia para optarem exclusivamente pela versão digital dos cardápios, mas esta não pode se sobressair ao bem-estar do consumidor final. Ressaltando ainda que a determinação de quantia ínfima de exemplares à disposição nos estabelecimentos torna irrisório o custo de impressão. É uma questão que vai ao encontro do que rege o Código de Defesa do Consumidor e as boas práticas que garantem a todos, sem distinção, a acessibilidade.

O freguês tem sempre razão!

Rodrigo Vervloet
É presidente do Sindicato dos Restaurantes, Bares e Similares do Estado do Espírito Santo (SindBares) e da Abrasel no ES

Nos últimos dias, nos deparamos com projeto de lei oriundo da Assembleia Legislativa do Espírito Santo, o qual busca determinar a obrigatoriedade de bares e restaurantes oferecerem a seus clientes pelo menos um cardápio físico sob pena de multa, isso em razão da proliferação dos já conhecidos cardápios em QR Code. Entre as justificativas do projeto, estão algumas situações, tais como o celular do cliente não ter mais carga de bateria ou ausência de pacote de dados etc. O que nos chama atenção, contudo, é um já habitual costume do legislador brasileiro, qual seja, a intromissão em todas as esferas privadas, legislando os comportamentos mais comezinhos e íntimos.

A própria Constituição Federal de 88, ao prever o sistema legislativo brasileiro, impôs-lhe diversas restrições, talvez já prevendo a histórica sanha legislativa de tratar o cidadão como um real dependente do Estado, devendo este portanto legislar e decidir tudo, desde hábitos alimentares até, como vemos agora, sobre seu comportamento ao frequentar bares e restaurantes. Nessa linha, o constituinte então trouxe normas limitadoras desse poder legislativo, dentre os quais aqui chamamos atenção para o Princípio da Liberdade Econômica. Apenas sob o prisma de tal limitação, a lei sob comento já está em diametral confronto com nosso sistema legislativo. Mas não queremos aqui nos apegar apenas à inadequação formal da norma. Então vejamos.

A modernidade tem mudado drasticamente o comportamento do cidadão, e isto não é diferente no setor de alimentação fora do lar. Desde o período de enfrentamento da Covid 19, os estabelecimentos se modernizaram de forma exponencial, não somente adequando suas plataformas e cardápios, mas todo o processo interno, desde a produção até a entrega em casa. Mas uma coisa deve ser compreendida de uma forma inquestionável - toda essa evolução veio com o intuito máximo de atingir a figura principal de toda essa operação, qual seja, O CLIENTE!

É natural que o estabelecimento busque, de todas as formas, resolver quaisquer contratempos que o cliente tenha para, não apenas fazer o pedido, mas qualquer outro, no intuito de dar-lhe sempre a melhor experiência, sob pena de sofrer a pior de todas as multas, a rejeição de sua clientela.

O que é certo portanto, é que contratempos eventuais, como os que são tratados no projeto de lei, não justificam a intromissão do poder público na operação do restaurante, e pior, cometer essa intromissão sem sequer escutar o setor competente, que é quem sabe sobre dia a dia da operação. Se tivessem nos consultado, saberiam que já somos guiados por uma máxima, que nos é muito mais valiosa do que qualquer lei, que é a de que o freguês tem sempre razão!

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