O ciclismo salvou Jones Antônio Garcia da depressão. No período agudo da doença, a psiquiatra recomendou que ele fizesse uma atividade física que desse prazer. O esporte só trouxe benefícios, já que também serviu de alerta para a hérnia umbilical - e outras quatro hérnias - que ele teve na região da barriga durante alguns anos. Por conta das dores da segunda doença ele não conseguia pedalar.
"Foi o andar de bicicleta que melhorou minha depressão e a minha saúde. Mas chegou um momento que, por conta da hérnia umbilical, eu precisava fazer muito esforço. Não doía, mas só conseguia pedalar se estivesse com duas cintas extremamente apertadas".
O comerciante conta que o simples fato de fazer um esforço acabava estufando as hérnias. Hábitos, como ir ao banheiro, começaram a incomodá-lo. "Para ir no banheiro defecar eu tinha que ter uma cinta enorme. Porque qualquer esforço de pressão interna, ela estufava. Tudo atrapalhava o fluxo normal do meu processo digestivo e o que ocorria no meu corpo, e isso me causava muita diarreia. Cheguei num período que não comia, só usava cinta e não podia pegar peso", lembra.
Assim como Jones, a servidora pública Priscilla Margon e o influenciador André Martinelli também tiveram hérnia umbilical. Eles contam as suas histórias nessa matéria especial. Durante quase dois meses, ouvimos médicos especialistas que explicam o que é a doença e a importância do diagnóstico precoce, evitando complicações mais graves. Eles alertam que reconhecer os sinais e agir rápido é fundamental.
A hérnia umbilical é uma condição em que parte do conteúdo abdominal (normalmente gordura ou até mesmo um pedaço do intestino) protrai através da parede abdominal na região do umbigo, formando uma saliência visível ou palpável. "Isso acontece devido a uma fraqueza ou defeito natural nos músculos ou tecidos que, normalmente, mantêm os órgãos abdominais no lugar", explica José Alberto Correia, cirurgião do aparelho digestivo do Hospital Santa Rita.
O médico conta que o processo desse tipo de hérnia é desencadeado por um aumento da pressão dentro do abdômen ou enfraquecimento dos músculos da parede abdominal ao redor do umbigo. "Fatores como excesso de peso, gestação, esforço físico intenso, tosse crônica, constipação com força para evacuar ou até mesmo cirurgias prévias podem favorecer o aparecimento da hérnia, especialmente em quem já tem uma predisposição genética ou anatômica", diz José Alberto Correia.
HÉRNIAS ABDOMINAIS
A hérnia umbilical é um tipo de hérnia abdominal. As hérnias abdominais são mais comuns do que parecem, e afetam entre 20% e 25% da população adulta no Brasil. A hérnia umbilical atinge 8% da população, entre crianças e adultos.
28 MILHÕES
de adultos sofrem de hérnias abdominais no Brasil
"As hérnias abdominais são uma abertura na musculatura do abdome que permitem a passagem de um conteúdo de dentro da barriga para fora, podendo ser gordura ou parte de um órgão. Dor durante a prática de atividades físicas e o abaulamento (bolinha) no local são os principais sintomas da doença", explica Gustavo Soares, cirurgião e presidente da Sociedade Brasileira de Hérnia e Parede Abdominal (SBH).
O médico explica que, geralmente, a hérnia já existe devido ao defeito na parede abdominal, mas ela só se torna perceptível em momentos de esforço físico, como durante exercícios ou ao levantar peso. Esse esforço aumenta a pressão dentro do abdômen, fazendo com que o conteúdo interno se projete pelo defeito, revelando a hérnia.
As hérnias podem ser pequenininhas, mas no caso do Jones elas eram de tamanho mediano. "Eram cinco hérnias, uma no umbigo e outras quatro na parede do abdômen, sendo uma bem elevada. Pegava desde o umbigo até um pouco abaixo do peito", conta. Em julho de 2024 ele operou. A cirurgia foi feita com tela, um procedimento que visa reparar a fraqueza na parede abdominal na região do umbigo, utilizando uma tela de reforço. A tela ajuda a evitar que a hérnia retorne após a cirurgia.
André Camatta de Assis, cirurgião do aparelho digestivo no Hospital Estadual Dr. Dório Silva, diz que segundo a SBH, existe uma tendência de recomendar a colocação de tela na maioria das cirurgias, sempre que possível, incluindo o uso profilático. "Para reduzir o risco de recorrência, diminuir o tempo de hospitalização, a dor pós-operatório e também acelerar a recuperação do paciente".
"Hoje me sinto bem mais à vontade. Nos últimos 10 anos, quando elas estavam maiores, eu não tirava a camisa na praia de jeito nenhum, eu tinha muita vergonha das hérnias e das cicatrizes", conta. Recuperado, ele voltou a praticar o esporte que tanto gosta. Jones faz longas pedaladas, chegando a distâncias de cem quilômetros num único dia. "Voltei a ter a minha vida normal, a praticar o meu ciclismo e as minhas atividades físicas".
DADOS DA DOENÇA
Existem diferentes tipos de hérnias abdominais, entre elas a inguinal, a umbilical, a epigástrica e a incisional. André Camatta de Assis diz que as mais comuns são as hérnias inguinais que acometem a região da virilha e as hérnias umbilicais. "São caracterizadas pela protuberância ou abaulamento nessas regiões citadas".
As mais comuns em crianças são as hérnias umbilicais e inguinais. As umbilicais são possíveis de observar até os quatro anos de idade, se forem pequenas. Já as inguinais necessitam de cirurgia devido o risco de encarceramento. O médico conta que a dor é localizada, inicialmente, no local do abaulamento. "No entanto, pode progredir para todo o abdome causando distensão abdominal, vômitos e parada de eliminação de gases e fezes", diz André Camatta de Assis.
No Espírito Santo, em 2024 foram 7.288 cirurgias de hérnias abdominais realizadas nos hospitais estaduais. A hernioplastia inguinal foi a com maior demanda, com 3.491 cirurgias, seguida da hernioplastia umbilical com 2.513 casos. Em 2025, até o dia 30 de abril, foram 1.954 cirurgias de hérnias abdominais, segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde (Sesa).
De acordo com levantamento realizado pela SBH, foram realizadas, no Brasil, 349.968 cirurgias de hérnia da parede abdominal, em 2024, através do Sistema Único de Saúde (SUS). Do total, 38.665 (11%) foram de urgência e 311.300 cirurgias eletivas.
349.968
cirurgias de hérnia da parede abdominal no Brasil em 2024
SEM DORES
A servidora pública Priscilla Margon sempre praticou esportes. Corrida, beach tênis e academia fazem parte da sua rotina de atividades físicas para manter o corpo ativo. E durante 10 anos ela conviveu com a hérnia umbilical. "Já tinha percebido a hérnia umbilical e como não causava dores, e para evitar a cirurgia, fui deixando".
Foi durante a aula de agachamento que ela percebeu um caroço maior na barriga. Ao procurar o médico também descobriu que tinha uma hérnia epigástrica, condição onde a parede abdominal se enfraquece na região entre o umbigo e o tórax, permitindo que tecidos internos, como gordura ou partes do intestino, projetem-se através de uma abertura, formando uma protuberância visível. "Não doía, e mesmo com a hérnia epigástrica continuei correndo e fazendo os exercícios aeróbicos. Só parei com os de força".
Priscilla foi orientada a fazer a cirurgia, que aconteceu em dezembro de 2024. "Foi muito tranquila. O médico fez um corte muito pequeno no umbigo. No dia seguinte já estava em casa", conta. Dez dias depois já estava na rua caminhando e, com dois meses, já frequentava a academia. "A corrida não podia porque realmente forçava o abdômen".
Morando em Guarapari, Priscilla voltou a ter uma vida normal. "Vou para academia, corro e faço as minhas atividades físicas, mas agora com um pouco mais de cuidado, porque tem o risco da recidiva da hérnia", conta.
FAMOSOS TIVERAM HÉRNIAS ABDOMINAIS
Viviane Araújo, Rafa Brites, Aline Campos e William Bonner são alguns exemplos de pessoas famosas que já compartilharam informações sobre a condição nas redes sociais ou em entrevistas. Em fevereiro deste ano, a atriz Viviane Araújo foi alvo de polêmica por ter uma hérnia abdominal visível em vídeo postado nas redes sociais, durante um ensaio na Marquês de Sapucaí, no Rio de Janeiro.
“Postei o vídeo e algumas pessoas só sabiam reparar e comentar sobre a hérnia. Não apreciavam mais nada, só falavam dela”, afirmou. Viviane explicou que lida com essa hérnia, que já foi tratada com três cirurgias, e revelou que pretende realizar um quarto procedimento para amenizar a aparência da região.
Já Willian Bonner passou por um procedimento de laparoscopia pra eliminar hérnias inguinais. No caso de Bonner, ela ficava na virilha (entre a coxa e a parte inferior do abdome).
Quem vê o influenciador André Martinelli praticando longas corridas, treinos pesados e pulando corda, não imagina que ele também sofreu com a hérnia umbilical. O capixaba sempre praticou atividades físicas e treinava sem limitações. "O problema começou a me incomodar quando sentia dor. Ela aparecia mais branda e nas piores horas ficava uma dor muito forte, que não passava".
Ele contou que começaram a aparecer algumas inflamações e depois uma hérnia umbilical. Começou sem dores, mas ele notou que aquela saliência não estava ali antes, mesmo sem sentir dor. "Depois de alguns meses treinando forte e sendo bem ativo em alguns esportes, comecei a sentir dores em alguns treinos e teve um dia que senti uma dor muito forte no final do dia. Procurei o médico e ele me disse que estava bem no começo, mas era algo progressivo”, contou.
A condição começou a atrapalhar os treinos diários, que forçava a região. Por isso, ele passou a usar menos pesos e também a ter limitações de movimentos. "Até tinha que parar de treinar algumas vezes", lembra.
André Martinelli
Influenciador
O dia que senti mais dor foi durante um show. Fiquei muito tempo falando alto e de alguma forma forçou meu abdômen. Tive uma dor muito forte e fiquei a noite inteira sem conseguir dormir
Em 2023 o ex-BBB foi submetido a uma cirurgia para remover a hérnia. "Eu decidi pela cirurgia porque a doença é progressiva. Fiz numa fase inicial para resolver o problema". André contou que o processo de reabilitação envolveu muito alongamento de fortalecimento. "Teve que ser bem devagar". Dois anos depois ele voltou a praticar os esportes que tanto ama.
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