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Covid-19: terapia on-line dispara; ES tem atendimentos gratuitos

Covid-19: terapia on-line dispara; ES tem atendimentos gratuitos

Com o distanciamento social e o medo de contágio, a procura por atendimento de saúde mental via internet tornou-se uma opção para muita gente, e o número de novos cadastros de profissionais no e-Psi saltou 447%

Publicado em 27 de setembro de 2021 às 13:15

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Terapia on-line cresceu após início da pandemia por Covid-19
Terapia on-line cresceu após início da pandemia por Covid-19. (Freepik)

A terapia on-line ganhou um empurrão no Brasil com a pandemia de Covid-19. Com o distanciamento social e o medo de contágio, a procura por atendimento de saúde mental via internet tornou-se uma opção para muita gente, e o número de novos cadastros de profissionais no e-Psi saltou 447%. Para tentar minimizar os efeitos colaterais da doença até em quem não foi infectado, psicólogos do Espírito Santo se juntam para oferecer atendimento gratuito.

A iniciativa, coordenada pelo Instituto Acalanto, reúne profissionais em um projeto voluntário de suporte emocional para as pessoas angustiadas com o distanciamento social e toda a crise decorrente da Covid-19. Para buscar apoio, basta entrar em contato pelo número (27) 99858-8280 ou (27) 99902-8018, das 9 horas à meia-noite. Não há agendamento e, no primeiro contato, o atendimento já é realizado por telefone.

Além do suporte psicológico, a equipe de voluntários ainda orienta sobre onde buscar determinados serviços de saúde, como hospital de referência para atendimento psiquiátrico, que estão em funcionamento. O projeto recebeu o aval do Conselho Regional de Psicologia (CRP-ES).

Vale lembrar que não se trata de um atendimento psicoterápico para questões que não estejam relacionadas à Covid-19. "O apoio é para as pessoas que estão ansiosas, angustiadas, tristes, com sintomas físicos sem saber onde buscar ajuda, ou que tiveram um tratamento psicológico interrompido, tudo isso em função da pandemia. Elas nos passam informações que vamos ajudar a construir saídas para este momento de crise", ressalta a psicóloga Daniela Reis, em entrevista ao portal A Gazeta, em abril de 2020.

STARTUP DE PSICOLOGIA NO ESPÍRITO SANTO

Em agosto deste ano, uma startup de psicologia foi lançada no Espírito Santo. O professor e psicólogo Elizeu Borloti da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), diretor técnico da startup, escolheu como foco de trabalho a psicoterapia breve, para resolver sofrimentos emocionais, como os trazidos pela pandemia. O atendimento não é totalmente gratuito.

Os atendimentos são agendados no site da startup: www.psylink.com.br, e os pacientes são atendidos em até 14 sessões pelo mesmo psicoterapeuta qualificado na aplicação de protocolos de psicoterapias breves. A estruturação e a quantidade das sessões garante uma boa relação custo-benefício, o que interessa também ao setor de saúde complementar e suplementar.

Nesse tipo de tratamento psicológico, o foco e o tempo são determinados a partir de uma queixa específica do paciente. “Nessa pandemia da Covid 19, muitas pessoas estão se queixando de ansiedade, estresse, síndromes diversas, como a síndrome do pânico, e uma infinidade de problemas de ordem psicológica, como os conflitos conjugais, que demandam apoio. Diante da crise sanitária e econômica, e da necessidade de isolamento social, a PsyLink revela-se um importante solução na minimização do sofrimento mental”, explica Elizeu.

Nas primeiras consultas, são delineadas as motivações do paciente, as estratégias para solução de seus problemas e o tempo necessário para tanto, o que dá previsibilidade ao tratamento psicológico, tornando eficiente a relação tempo-resultado. Nessa modalidade, o atendimento é focal: profissional e paciente atuam juntos na resolução do desconforto emocional.

As marcações de atendimento são on-line e já podem ser agendadas por empresas ou pessoa física. O sistema fará conexão paciente-profissional, potencializando o sucesso do tratamento.

CONSELHO EXIGE CADASTRO EM PLATAFORMA PARA ATENDIMENTO ON-LINE

A plataforma E-Psi entrou no ar em novembro de 2018, e o registro no site é uma exigência do Conselho Federal de Psicologia para a atuação on-line. Da estreia até fevereiro de 2020, cerca de 31 mil profissionais fizeram o cadastro. De março do ano passado, quando começou a pandemia, até agosto deste ano, outros 137 mil aderiram.

Ao todo, são 168 mil psicólogos habilitados a fazer o atendimento on-line, cerca de 40% dos 408.789 cadastrados no conselho federal.

COSTUME

Os encontros on-line com o psicólogo não foram uma novidade para Fabiana Léo, de 37 anos, que faz terapia desde outubro de 2014. Nestes quase sete anos, a historiadora chegou a ter sessões virtuais com um profissional enquanto ele estudava no exterior, mesmo antes do coronavírus. A pandemia fez com que eles retomassem o recurso.

Moradora de Belo Horizonte, ela começou as sessões quando travou na produção de seu projeto de mestrado. "Em maio eu estava na página 18 e, em outubro, ainda estava na página 18, sendo que eu trabalhava todo dia útil na dissertação", relembra. Após indicações, ela procurou um especialista em escrita e, em um ano, finalizou o trabalho, com 142 páginas.

Dando aulas virtuais durante o isolamento, ela pretende manter também as sessões no mundo on-line, ou então adotar uma forma híbrida. "Gostei da praticidade. Tiro 5 minutinhos para entrar na sessão, e depois 5 minutos para sair, continuar com meu cotidiano", diz.

A previsão é que a terapia on-line continue como uma alternativa viável mesmo após a diminuição das restrições pandêmicas, mas numa intensidade menor, avalia Maycoln Teodoro, diretor da Sociedade Brasileira de Psicologia e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG ). Para ele, muitos profissionais que nunca pensaram nessa opção foram impelidos ao mundo digital, o que fez diminuir o preconceito.

VANTAGENS

O atendimento on-line, naturalmente, tem suas desvantagens. "O psicólogo perde dicas corporais, muitas vezes está olhando para a pessoa e, como a câmera está em outra posição, parece estar olhando para outro lugar", explica. Em contrapartida, ele aponta que os futuros profissionais já estão treinando na prática durante a graduação.

A pandemia acabou impulsionando algumas áreas que não seriam exploradas tão cedo. Teodoro cita o trabalho de uma doutoranda sobre meditação on-line em grupo e os bons resultados em relação à ansiedade e à depressão. De acordo com ele, a pesquisa seria presencial, mas acabou mudando por causa da Covid-19.

Livros e estudos envolvendo a modalidade digital, independentemente da abordagem, foram publicados recentemente, como "Terapia on-line", do próprio Teodoro com Katie Moraes de Almondes, e "Clínica Psicanalítica On-line", de Fábio Belo.

Uma pesquisa publicada no E-Clinical Medicine, pertencente ao grupo The Lancet, em julho de 2020, indica que a sessão on-line é tão efetiva quanto um encontro presencial em casos de depressão, na TCC (terapia cognitivo comportamental). Nessa abordagem, o profissional trabalha como o paciente interpreta os acontecimentos e, após identificar padrões de comportamento e pensamento, sugere técnicas para mudar esses hábitos.

Conduzida por pesquisadores da Universidade McMaster, do Canadá, a meta-análise avaliou 17 estudos que levaram em conta videoconferência, email e mensagens de texto. Entre as vantagens apontadas, o relatório cita a diminuição de barreiras físicas, já que o paciente não precisa se deslocar, e a versatilidade em relação ao tempo dedicado à conversa com o profissional. Em outras palavras, incentivo para ficar em casa, como no período pandêmico.

Não são todos, porém, que conseguiram manter a privacidade para a terapia on-line nos últimos meses. A psicóloga Marcelli Rodrigues diz que muitos não se sentem seguros em fazer uma sessão em casa, já que outros moradores podem escutar a conversa. Há, por exemplo, pessoas que se trancam no carro para não ter a intimidade violada.

Ela, que atua desde 2012 em João Pessoa (PB), viu aumentar a demanda com o início da pandemia. "As pessoas começaram a ficar num nível de ansiedade tão extremo que começaram a paralisar. Tem gente que precisou ser afastada do trabalho, da escola." Muitos psicólogos, inclusive, pausaram as atividades porque também não estavam bem emocionalmente.

Durante a pandemia, ela precisou adaptar estratégias para engajar as pessoas do outro lado da tela, e muitos se adequaram rapidamente aos encontros virtuais. Obviamente, a terapia on-line não foi unanimidade, principalmente entre os mais jovens. "Embora tenham sido desenvolvidas atividades pelo computador, nem toda criança tem notebook ou gosta de ficar com fone no ouvido na sessão."

HÁ QUEM AINDA PREFIRA O PRESENCIAL

Raíssa Toscano, de 26 anos, por exemplo, está no grupo que quer sessões presenciais quando a situação pandêmica permitir. "Você tem uma sensação de acolhimento, e isso dentro desse processo terapêutico é muito importante. Há a construção de um elo mais próximo com o terapeuta", afirma a dentista de Campina Grande (PB).

O início da pandemia coincidiu com o ingresso dela em um mestrado em outra cidade, o que fez surgir questionamentos pessoais e profissionais. Ela explica que, antes, exagerava seus problemas e, consequentemente, ficava com um sentimento mais negativo sobre si mesma. "Agora, consigo reorganizar os pensamentos, enxergar a realidade de forma real, consigo me colocar na situação de uma forma menos prejudicial pra mim mesma."

O atendimento virtual acabou ampliando as opções na hora de encontrar um psicólogo. Com problemas relacionados ao comportamento, como TOC (transtorno obsessivo-compulsivo), o morador de Limeira (SP) Rafhael Turati, de 32 anos, começou as sessões on-line com uma profissional de Araras, também no interior paulista, há três meses.

Mesmo preferindo encontros presenciais, como o processo de sair de casa e ir para a terapia, o engenheiro civil pretende continuar com a atual psicóloga, pela internet. "Eu sinto que vou ter coisas para continuar trabalhando com ela."

Já Isabel Alfieri, de 21 qnow, diz que só conseguiu fazer terapia por causa da opção digital. Moradora da zona norte de São Paulo, ela estuda na oeste e trabalha na leste, o que a obrigava ficar em constante movimento pela cidade antes da pandemia.

"No fim de semana, que era meu único momento de lazer, de colocar os assuntos da faculdade em dia, a última coisa que eu queria era gastar uma hora de consulta no sábado, mais o tempo de ir e de voltar", afirma

A universitária diz que há muito tempo tem crises de ansiedade, e que a quarentena em casa a fez pensar mais em sua vida e em seus relacionamentos. "Cheguei a um ponto em que eu sabia que precisava de terapia, não estava conseguindo lidar com meus problemas." Em fevereiro ela começou a ter encontros aos sábados com uma profissional, e pretende seguir neste modelo até quando for possível.

Outra opção envolvendo a internet são os aplicativos de celular. Uma pesquisa recente avaliou a efetividade da TCC focando a versão por escrito do tratamento, como por meio de apps. E, assim como o estudo canadense, também constatou que a modalidade pode ser tão eficaz quanto uma sessão presencial em casos leves e moderados de depressão.

Publicada na revista The Lancet Psychiatry, essa meta-análise avaliou 76 estudos para descobrir quais componentes podem ajudar ou prejudicar tratamentos de depressão, ansiedade e insônia, e os resultados são encorajadores.

Toshi Furukawa, professor da Universidade Kyoto que conduziu o estudo, salienta, porém, que há centenas de opções em lojas de aplicativos. "Não tem como todas serem eficazes, mas há mais do que alguns serviços comercialmente disponíveis, não apenas de TCC, mas que fornecem apoio ou conselhos de maneira profissional." De qualquer forma, o que importa é procurar ajuda quando precisar.

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