Publicado em 10 de julho de 2025 às 14:39
Nos últimos dias, Donald Trump havia dado uma série de declarações de apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e sinalizava o anúncio de uma taxa contra produtos exportados pelo Brasil.>
Embora especialistas nas relações Brasil-Estados Unidos já esperassem que as tarifas prometidas de fato viriam, muitos deles não imaginavam que a medida anunciada pelo presidente dos Estados Unidos na quarta-feira (9/7), que estipulou uma taxação de 50% sobre bens de nosso país, tivesse essa magnitude.>
Um dos analistas que se surpreendeu foi Christopher Garman, diretor-geral de Américas do Eurasia Group, uma consultoria e empresa de risco político.>
"A intensidade da tarifa causou surpresa", admite ele, em entrevista à BBC News Brasil.>
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"Embora o presidente Trump já estivesse ameaçando os membros do Brics com tarifas adicionais, o Brasil inicialmente estava na lista das nações que tiveram a taxa mínima, de 10%, e é um país que tem déficit na balança comercial com os Estados Unidos", lembra o pesquisador, que é um dos principais especialistas sobre os impactos políticos das decisões macroeconômicas.>
O Brics é o bloco inicialmente formado pelas economias emergentes de Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul e que foi ampliado a partir de 2024, com a entrada de seis países — Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Indonésia e Irã — e que acaba de realizar uma cúpula no Rio de Janeiro.>
Mas o que explica este anúncio de Trump?>
Para Garman, a grande motivação do presidente americano é política e ideológica.>
"A política brasileira é um espelho da política americana. Me parece que Trump se identifica com os desafios que Bolsonaro enfrenta no Brasil", avalia ele.>
"Ambos se veem como vítimas de um establishment progressista, que supostamente caminharia para um regime de censura por meio de ataques aos seus oponentes pelas vias judiciais.">
Seguindo esse raciocínio, Trump avaliaria que Bolsonaro passa por algo similiar ao que ele próprio viveu após perder as eleições de 2020, em que a Presidência dos EUA foi conquistada por Joe Biden.>
"Trump parece querer dar um sinal claro contra países que ele acredita não respeitarem a ordem democrática", avalia Garman.>
Para o analista, as taxas de 50% sobre o Brasil não têm qualquer justificativa comercial ou econômica.>
"Não se trata de um mecanismo para ajustar a relação bilateral, para barrar a entrada de produtos chineses ou para controlar a entrada de imigrantes nos EUA. É um instrumento político e ideológico.">
Do ponto de vista de Garman, o anúncio de Trump "enfraquece um governo que está no espectro ideológico oposto".>
"Essa também é uma maneira de tentar enfraquecer o próprio Brics, que o presidente dos EUA acredita ser um grupo que se opõe aos interesses americanos", diz ele. >
Do ponto de vista econômico, o diretor do Eurasia Group não vê ganhos claros para os Estados Unidos.>
"Existem alguns setores no qual a economia americana depende mais de produtos brasileiros. Mas o Brasil representa uma porcentagem pequena do total das importações americanas", pondera ele. >
Já para o Brasil, Garman entende que "vários setores serão negativamente impactados".>
"É o caso da mineração, da produção de aeronaves e do agro, especialmente os produtores de suco de laranja, café, madeira e celulose", lista ele.>
Mas o especialista entende que parte dessas exportações brasileiras que tinham os EUA como destino podem ser vendidas para outros mercados.>
"A tendência é que a taxação tenha um impacto modesto no crescimento do Brasil, mas, ainda assim, haverá um impacto", projeta ele. >
Na avaliação de Garman, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pode enxergar na taxação "uma grande oportunidade para as eleições de 2026".>
"O Palácio do Planalto pode entrar num embate com Trump, e passar a mensagem de que a família Bolsonaro faz alianças com um governo estrangeiro, que tira empregos dos brasileiros", antevê o especialista.>
"O presidente Lula pode se beneficiar de uma onda nacionalista, criada a partir de uma espécie de bullying internacional feito pelos Estados Unidos." >
Diante desse cenário, Garman entende que o presidente Lula tende a "inflar a retórica" contra a taxação — o que dificulta um caminho de negociação e acomodação dos interesses.>
"Pode até haver uma negociação específica entre algumas empresas e setores, com trocas e exceções às tarifas", acredita ele. >
Já para o ex-presidente Jair Bolsonaro, Garman avalia que será necessário observar se a taxação de Trump representa um fortalecimento do nome de Lula nas urnas. >
"Se isso se concretizar, ele pode tentar de alguma maneira pedir uma redução das tarifas americanas diretamente a Trump, para fazer um papel de intermediação", diz ele. >
Para Garman, a situação brasileira se difere um pouco do que aconteceu com Canadá, México e outros países, nos quais houve uma acomodação de interesses após o anúncio de tarifas por Trump.>
"O Brasil não tem uma economia tão integrada com os EUA, como Canadá e México. Além disso, não há um compartilhamento de raízes ou tradições, como acontece entre esses países", observa ele.>
"Embora o Brasil seja um país dividido e polarizado, acho razoável pressupor que Lula pode se beneficiar parcialmente dessa taxação", acredita o analista.>
Por fim, o diretor do Eurasia Group projeta que as tarifas de Trump podem enfraquecer os laços de Brasil e EUA, mas fortalecer a relação com outros atores internacionais.>
"Pode haver um fortalecimento da relação do Brasil com China, União Europeia e Oriente Médio", cita ele. >
"O Brasil vai buscar outros mercados e a tendência é que os laços institucionais com os Estados Unidos fiquem enfraquecidos.">
"Mesmo que um acordo parcial seja feito, ainda assim esse relacionamento vai sair arranhado", conclui ele.>
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