Publicado em 9 de agosto de 2025 às 09:25
O icônico jogo Pac-Man nasceu no fim do anos 1970, quando Toru Iwatani comia uma pizza de salame. Após tirar a primeira fatia, o designer de jogos japonês se assustou ao ver uma forma circular que parecia lhe encarar. >
"Se você pega uma pizza e tira um pedaço, o que sobra parece uma boca", disse Iwatani à Wired em 2010, confirmando a veracidade dessa lenda urbana.>
Observando seu prato engordurado, Iwatani certamente percebeu que estava diante do personagem perfeito para um videogame — uma máquina de comer incansável. E assim nasceu Pac-Man, que este ano comemora 45 anos desde seu lançamento original nos fliperamas.>
No Pac-Man, o jogador controla uma bola amarela gulosa que precisa percorrer labirintos escuros e em constante mudança, comendo o máximo de moedas possível — tudo isso enquanto foge da Gangue dos Fantasmas, formada por Blinky (vermelho), Pinky (rosa), Inky (azul) e Clyde (laranja).>
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"Pac-Man [o personagem] foi criado para representar o conceito central do jogo, que é comer, da forma mais simples possível", explica Michiko Kumagai, gerente de licenciamento do personagem na Bandai Namco, editora do jogo. >
"Assim como os arcos do McDonald's, ele se tornou um símbolo reconhecido internacionalmente. Só de olhar uma vez, todos entendem instintivamente o que o Pac-Man significa, e é por isso que que ele alcançou um público tão amplo.">
Originalmente chamado de PuckMan no Japão, uma referência à frase "paku paku taberu", que significa fazer som ao mastigar enquanto come algo, Pac-Man é, segundo o Guinness Book (livro dos recordes), o jogo de fliperama com ficha mais bem-sucedido de todos os tempos. >
O personagem continua sendo um símbolo duradouro até hoje, com a franquia gerando uma receita estimada de US$ 14 bilhões (R$ 76 bilhões), tanto em máquinas de fliperama quanto em dezenas de relançamentos para consoles domésticos. Os jogos já passaram por plataformas que vão do clássico Nintendo até o Xbox. >
Nos últimos anos, Pac-Man também conquistou novos públicos com aparições especiais em animações de grande orçamento, incluindo Detona Ralph (2012) e Pixels (2015). Além disso, no mês passado, a Bandai Namco lançou o Shadow Labyrinth, um jogo que traz uma nova abordagem à clássica jogabilidade de Pac-Man. >
"Pac-Man é um dos símbolos do nascimento dos videogames para o público em geral", afirma Peter Etchells, professor de Comunicação Científica da Bath Spa University, no Reino Unido. >
"Havia uma elegância na simplicidade desse jogo e no design que, eu acredito, capturou a imaginação de muitos jogadores.">
Você não precisa ser um jogador muito dedicado para apreciar o objetivo principal do personagem, que é comer estrategicamente. A jogabilidade do Pac-Man é, ao mesmo tempo, incrivelmente simples e, no fim das contas, difícil de dominar.>
Na versão original, os jogadores podiam correr freneticamente pelo labirinto sem pensar muito ou seguir o caminho feito pela maioria das pessoas na década de 1980: ler o manual Como vencer no Pac-Man, que ensinava a memorizar centenas de padrões complexos dos labirintos e rotas ideais. >
Esse tipo de preparação tática deixava o jogador pronto para competir nos campeonatos de Pac-Man — milhares foram realizados ao redor do mundo. >
Etchells destaca que a proposta de Pac-Man era bem menos movida à "testosterona" do que a de muitos outros jogos, e esse foi um dos grandes motivos para o sucesso.>
"O criador do Pac-Man, Toru Iwatani, disse explicitamente que tinha a intenção de criar um jogo para todo mundo se divertir, principalmente as mulheres", afirma. >
"Por isso, Pac-Man e suas coloridas sequências, como no Ms. Pac-Man, de 1982, se destacaram dos jogos daquela época, predominantemente voltados ao público masculino e baseados em tiros, como Asteroides e Invasores do Espaço, porque seu foco era um público muito mais amplo.">
Em entrevista ao Washington Post em 2020, Iwatani disse que o jogo também tinha ligações mais profundas com a cultura japonesa do que se podia imaginar.>
"Eu criei os fantasmas para serem simples e fofos. Isso remete à antiga apreciação japonesa pelo wabi-sabi, em que as pessoas encontram beleza passageira e profundidade na simplicidade. Eu acho que o fato do mundo aceitar cada vez mais essa estética japonesa também fez com que mais pessoas gostassem do Pac-Man.">
Além de seu design único e de conquistar públicos variados, tanto jogadores homens quanto mulheres, Pac-Man também deixou uma marca no mundo da ciência. O jogo, assim como Tetris, tem se mostrado uma ferramenta útil para pesquisadores entenderem as limitações de resolução de problemas em cérebros humanos, e até mesmo em chimpanzés. >
Um estudo, realizado em 2007 por Dean Mobbs e colegas do Instituto de Tecnologia da Califórnia, submeteu jogadores de Pac-Man a choques elétricos sempre que eles eram pegos por um fantasma. >
"Esse estudo usou imagens de ressonância magnética para ver se a atividade cerebral mudava quando os fantasmas chegavam muito perto. E mudava", afirma Tom Garner, professor de tecnologias interativas na Sheffield Hallam University, no Reino Unido. >
"Os macacos também têm jogado Pac-Man nos últimos anos. Um estudo de 2024, conduzido por Z. Lin e colegas da Universidade de Cornel, descobriu uma ligação entre certos padrões no movimento dos olhos dos macacos e suas decisões no jogo, enquanto a Biblioteca Nacional de Medicina usou Pac-Man para revelar que macacos-prego pode usar um sistema hierárquico de tomada de decisão com base em estratégias, algo que antes se pensava estar além da capacidade cognitiva de animais.">
"Videogames como Pac-Man têm causado um impacto significativo no campo da pesquisa científica. Pac-Man é uma boa forma de ajudar a entender melhor como os seres humanos pensam, sentem e se comportam.">
De acordo com Garner, a razão pela qual Pac-Man foi — e ainda é — tão amado pelas tantas pessoas está ligado à forma como o jogo utiliza a chamada "teoria da corporificação ou incorporação". >
"Em videogames, a ideia de corporificação descreve uma sensação de conexão entre o jogador e o personagem, que confunde os limites entre o mundo dos jogos e o mundo real", explica. >
"Pac-Man foi um dos primeiros videogames a colocar o jogador no papel de um personagem em vez de um veículo. Pac-Man era representado como um ser vivo, capaz até de comunicar dor, por meio sons, sempre que os fantasmas o alcançavam. Tudo isso resultou em uma conexão única com o jogador.">
Mais de 45 anos depois de seu lançamento, a Namco Bandai espera aumentar a popularidade de Pac-Man entre as gerações mais jovens com o recém-lançado Shadow Labyrinth. >
O novo jogo se passa em um labirinto gigantesco que mistura ficção-científica e elementos medievais. Nele, uma misteriosa figura chamada Swordman No. 8 é guiada por um orbe conhecido como Puck — uma espécie de versão gótica e ciborgue do design original de Pac-Man. >
A dupla ainda pode se transformar, por um tempo limitado, em um guerreiro robô no estilo Transformers, chamado GAIA, o que permite aos jogadores resolver enigmas que seriam impossíveis de outra forma. >
O produtor de Shadow Labyrinth, Seigo Aizawa, era fã de Pac-Man na infância e acredita que o novo jogo carrega algumas das peculiaridades que tornaram o original tão marcante. >
"Acho que uma das grandes razões para o mundo ter se apaixonado por Pac-Man foi o fato de ter sido um dos primeiros jogos a dar personalidade real aos seus personagens", afirma. >
"Cada fantasma tinha um comportamento distinto. Blinky, por exemplo, era o fantasma vermelho implacável que persegue Pac-Man diretamente. Já, Pinky, prefere emboscá-lo pela frente. Essas características não estavam apenas escritas na máquina do fliperama, elas estavam integradas no jogo por meio de inteligência artificial e dos padrões únicos de movimento.">
Graças a uma reviravolta engenhosa no jogo, Pac-Man também pode lutar contra esses predadores fantasmas. Ao comer uma "pastilha de poder", o caçador se torna a caça, e Pac-Man finalmente consegue devorar os fantasmas que o perseguiam.>
"Não há nada mais satisfatório do que ser perseguido por fantasmas, pegar um poder e virar o jogo", afirma Aizawa. >
Aizawa revela que a Bandai Namco já considera lançar a sequência de Shadow Labyrinth. >
Contudo, Nao Udagawa, presidente e CEO da Bandai Namco, admite que o fato de Pac-Man ser um personagem mudo e não-humano, cuja jogabilidade é baseada em ações simples, torna mais desafiador manter a marcar sempre nova, ao contrário de outros personagens com personalidades marcantes como o Sonic, da Sega, ou Mario, da Nintendo.>
"É verdade que, como uma propriedade intelectual, o Pac-Man tem menos personagens e histórias a contar comparado com outros personagens de videogame, como o Sonic", afirma. >
"Ainda assim, para nós, é a simplicidade que faz Pac-Man ser um personagem amplamente conhecido pela Geração Z e gerações mais jovens, mesmo que elas nunca tenham jogado o jogo.">
Graças a parcerias recentes com marcas como a Krispy Kreme e a Little Lion Entertainment (uma empresa de experiências que está criando uma atração imersiva de Pac-Man, no estilo de escape room, em cidades incluindo Manchester e Dubai), Udagawa está confiante que o personagem pode durar por mais 45 anos. >
Ela não confirma nem nega se Pac-Man terá seus próprios filmes — como teve Sonic e Mario. Mas a CEO admite que há planos para continuar expandindo Pac-Man para outras áreas além dos jogos. >
"Como uma propriedade intelectual, continuaremos a provar que Pac-Man vai além dos jogos e alcançou esse status de ícone cultural.">
Apesar de todos os planos para manter Pac-Man relevante, Etchells acredita que é o fator nostalgia que sustenta sua popularidade. Mais especificamente a nostalgia por uma era dos jogos que não existe mais da mesma forma: a cultura dos fliperamas. >
"É uma lembrança dos dias de infância passados jogando com amigos e rivais e meio ao barulho e às luzes de neon dos fliperamas", diz. >
Seja qual for a razão por trás desse sucesso tão duradouro, Pac-Man continua sendo um ícone da cultura pop, além de uma prova definitiva de que só podemos encontrar o sucesso quando paramos de fugir dos nossos fantasmas e começamos a encará-los sem medo. >
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