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Lula diz que vetará projeto de redução de penas que beneficia Bolsonaro: 'Cometeram um crime contra a democracia'

Lula diz que vetará projeto de redução de penas que beneficia Bolsonaro: 'Cometeram um crime contra a democracia'

Presidente diz a jornalistas que vetará o projeto de lei, aprovado pelo Senado, que reduz penas de condenados pelo 8 de janeiro, incluindo Bolsonaro.

Publicado em 18 de dezembro de 2025 às 12:44

Imagem BBC Brasil
null Crédito: Getty Images

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse nesta quinta-feira (18/12) que vetará o PL da dosimetria, aprovado na quarta-feira pelo Senado.

"Com todo o respeito que eu tenho ao Congresso Nacional, a hora que chegar na minha mesa, eu vetarei", afirmou o presidente durante um café da manhã com jornalistas.

O projeto, aprovado por 48 votos a favor e 25 contra, reduz a pena de condenados pelos crimes relacionados aos atos de 8 de janeiro, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

"As pessoas que cometeram um crime contra a democracia brasileira terão que pagar pelos atos cometidos contra este país."

Se de fato for vetado, o Congresso ainda pode derrubar o veto de Lula depois.

"O Congresso tem o direito de fazer as coisas, eu tenho o direito de vetar, eles têm o direito de derrubar o meu veto", afirmou Lula.

Se for à frente, o projeto pode beneficiar Bolsonaro e outros condenados por tentativa de golpe de Estado e crimes ligados a ameaças ao Estado Democrático de Direito.

Bolsonaro foi condenado em setembro pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a 27 anos e três meses de prisão pelos crimes de organização criminosa, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.

Agora, Bolsonaro pode ver cair o tempo de cumprimento da pena em regime fechado: dos atuais 6 a 8 anos para algo entre 2 anos e 4 meses e 4 anos e 2 meses, dependendo da interpretação, calcula o jornal Folha de S. Paulo.

O projeto prevê o fim da soma das penas pelos crimes de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito, priorizando a aplicação da pena mais grave — com possível acréscimo de um percentual da pena do outro crime, a depender do caso.

Permite ainda uma progressão de regime mais rápida, ou seja, passar da cadeia para um regime semiaberto ou domiciliar a partir do cumprimento de um sexto da pena nos casos que não envolvam crimes contra a vida.

Além disso, autoriza a redução de um terço a dois terços das penas quando os crimes forem cometidos em contexto de multidão — regra que não se aplicaria a Bolsonaro, condenado por ser líder da tentativa de golpe.

Uma pesquisa Quaest divulgada nesta quarta-feira mostrou que 47% dos brasileiros desaprovam o projeto de lei, 24% são favoráveis ao texto e 19% gostariam de penas ainda menores que as previstas na proposta.

Para 58% dos entrevistados, o projeto teria como objetivo reduzir a pena de Bolsonaro; para 30%, o objetivo seria reduzir a pena de todos os condenados por atos golpistas.

Imagem BBC Brasil
Para mais da metade dos brasileiros, objetivo do projeto de lei seria reduzir pena de Bolsonaro, segundo pesquisa Quaest Crédito: Reuters

Entre aqueles que se declaram como bolsonaristas, 53% apoiam reduções nas penas ainda maiores; 32% apoiam a proposta atual; e 10% são contra o projeto.

Entre os que se consideram lulistas, 77% são contrários ao projeto, 10% são favoráveis e apenas 4% apoiam reduções nas penas ainda maiores.

O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT), afirmou na rede social X que "o PL da Dosimetria é um convite para o retrocesso" e que "não há espaço para relativizar ataques à democracia".

Já o líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias, disse na rede social que "o presidente Lula vai barrar" o projeto.

Filho do ex-presidente Jair Bolsonaro e escolhido pelo pai para ser candidato à presidência pelo PL em 2026, o senador Flávio Bolsonaro comemorou a aprovação do projeto — embora tenha dito que o texto não "era exatamente o que a gente queria", indicando que desejaria a anulação dos processos que levaram às condenações, e não apenas a redução das penas.

"O Brasil tem uma chance de ser pacificado e de retomar a normalidade da democracia", escreveu Flávio Bolsonaro no X.

"Jair Bolsonaro se sacrificou para que a dosimetria fosse aprovada e para que centenas de injustiçados do 8 de janeiro pudessem retomar suas vidas."

Imagem BBC Brasil
Proposta aprovada no Congresso autoriza a redução de penas quando os crimes forem cometidos em contexto de multidão Crédito: JOEDSON ALVES/ANADOLU AGENCY VIA GETTY IMAGES

'Benevolência do Legislativo é de ocasião'

Para Luisa Ferreira, professora de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV), o problema central do PL da Dosimetria não está, em si, na flexibilização das regras de progressão de regime, mas no contexto político em que a proposta foi construída.

"Não acho que é um problema flexibilizar regras de progressão de regime considerando a situação prisional no Brasil. Pelo contrário, deveríamos discutir isso para mais crimes", afirma a professora da FGV, em referência à superlotação dos presídios.

"O problema é o Congresso só se mobilizar quando o destinatário da norma tem nome e sobrenome, e sem um estudo sério sobre isso", afirma Ferreira, destacando o interesse dos parlamentares em beneficiar Jair Bolsonaro.

Na avaliação da especialista, o projeto segue uma lógica oposta à que historicamente orientou o Congresso em matéria de lei penal.

Ela lembra do pacote anticrime proposto pelo então ministro da Justiça e hoje senador Sergio Moro (União-PR), durante o governo de Jair Bolsonaro.

O pacote endureceu penas para diversos crimes e teve amplo apoio no Congresso.

Para o advogado criminalista Guilherme Furniel, o PL da Dosimetria evidencia uma "benevolência legislativa de ocasião", que não está preocupada em repensar o sistema carcerário ou a progressão de penas para a população em geral.

"O que a gente sempre viu foi o endurecimento penal, a criação de mais crimes, mais penas, sem um estudo sério do reflexo e resultado disso", diz o criminalista.

"Esse projeto de lei vai na contramão do que o Congresso faz há décadas, para tentar amenizar a situação jurídica de uma parcela específica de pessoas condenadas."

*Com reportagem de Iara Diniz e Mariana Alvim

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