Publicado em 12 de junho de 2025 às 05:39
Uma morte escura, fria e um tanto tediosa. Um desenlace drástico, violento e com pitadas de drama. Ou um final que mais se parece com o começo de tudo.>
Essas são três das possibilidades mais estudadas atualmente sobre como será o fim do universo.>
Não há dúvidas de que essa é uma das questões mais intrigantes e misteriosas da Ciência — e mesmo os especialistas no assunto admitem que existem mais perguntas que respostas neste debate.>
Mas, para entender como o universo vai acabar, é preciso antes saber como ele começou.>
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A cosmologia é o ramo da Física que estuda esse assunto e faz estudos para desvendar como o universo funciona.>
"As ideias sobre esse fim vêm dos modelos cosmológicos, que tentam descrever o universo como um todo, sem prestar atenção em detalhes menores", explica o físico Alexandre Zabot, professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).>
"Nosso trabalho é como observar o comportamento e o fluxo de um rio inteiro, sem avaliar a fundo todas as moléculas de água que passam por ali", compara ele.>
E os modelos cosmológicos atuais se baseiam em duas palavrinhas que você provavelmente já ouviu: Big Bang.>
Há pelo menos 13,8 bilhões de anos, todas as partículas que compõem o universo estavam acumuladas, com uma temperatura e uma densidade extremamente altas.>
A partir do Big Bang, esse material começou a se expandir e a formar as estruturas que conhecemos, como as galáxias, as estrelas, os planetas…>
E é importante saber que essa expansão continua a acontecer até hoje — inclusive, ela parece estar se acelerando, como revelam as observações e os cálculos mais recentes.>
Mas será que um dia desses tudo isso terá um ponto final?>
A primeira teoria que busca desvendar o epílogo do universo tem como base justamente a continuidade desse processo expansionista.>
A ideia aqui é que todas as estruturas e as partículas ficarão cada vez mais distantes entre si.>
Em algum momento, até mesmo os gases necessários para a formação de novas estrelas estarão esparsos demais.>
Essa baixa densidade dos gases, pelo distanciamento entre as partículas, impedirá a formação desses corpos celestes, responsáveis por prover luz e calor.>
E, com o passar do tempo, as estrelas já formadas passarão por todas as fases de desenvolvimento — até finalmente morrerem.>
"Tudo indica que o universo vai ficar cada vez mais vazio, mais frio e mais distante", observa o pesquisador Raul Abramo, do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP).>
"As galáxias vão se afastar cada vez mais, as estrelas vão envelhecer e morrer… Trata-se de um estado final onde o universo será essencialmente um cemitério", caracteriza ele.>
A segunda possibilidade aventada pelos cientistas é um tanto mais drástica.>
Aqui entram em cena dois elementos fundamentais para entender a dinâmica do universo.>
A primeira é a gravidade, a força que atrai todos os corpos. É ela que mantém a coesão entre galáxias próximas e os sistemas planetários.>
É graças à gravidade que Mercúrio, Vênus, Terra, Marte e os outros planetas orbitam ao redor do Sol, por exemplo.>
O segundo elemento é um tanto mais misterioso: a energia escura.>
"Ainda não sabemos do que ela é feita, mas sabe-se que provoca uma repulsão, quase como se fosse uma antigravidade", ensina Zabot, que também é coautor do livro Introdução à Cosmologia Moderna (Editora Livraria da Física).>
Ou seja: tudo indica que a energia escura parece ter um efeito oposto ao da gravidade. Em vez de gerar atração, é como se ela repelisse, afastasse.>
Pelo que se sabe até o momento, a energia escura só tem influência nas grandes escalas cosmológicas, ou na dinâmica de superaglomerados de galáxias, que estão se afastando uns dos outros.>
No entanto, em escalas "menores", como na relação entre galáxias próximas ou dentro de sistemas planetários, a força da gravidade parece ganhar essa disputa.>
Mas, à medida que o universo se expande, será que a energia escura vai ter mais influência também nas escalas menores?>
"Quanto mais o universo cresce e ganha volume, maior fica a força de repulsão ligada à energia escura", raciocina Zabot.>
"Pode ser que, à medida que o universo aumenta de tamanho, mais relevante fica a energia escura em escalas menores", complementa ele.>
Seguindo essa linha de raciocínio, quando os grandes aglomerados de galáxias estiverem completamente rompidos, pode ser que a energia escura comece a afetar a dinâmica entre galáxias que estão mais próximas umas das outras.>
Depois, as estrelas que hoje em dia pertencem a uma mesma galáxia se distanciariam. Elas passariam a viajar soltas pelo universo.>
E isso desorganizaria completamente os sistemas planetários.>
Os planetas também passariam a vagar, fora de qualquer órbita.>
É possível que a energia escura chegue a causar problemas até na escala dos átomos, das forças nucleares e eletromagnéticas.>
E, eventualmente, até rompa a estrutura mais básica do universo: o espaço-tempo.>
"É por isso que o nome em inglês dessa teoria tem um duplo sentido. Ela é chamada de big rip, que significa uma grande ruptura, rasgo, interrupção, esgarçamento", diz Zabot.>
"Mas rip também é uma sigla para rest in peace, ou descanse em paz", acrescenta o físico.>
Abramo defende que a terceira teoria tem um grau de incerteza ainda maior do que as duas anteriores.>
A ideia aqui é que a força da gravidade vai botar um freio naquele processo de expansão do universo.>
Vai chegar um momento em que esse ritmo vai desacelerar, até paralisar completamente.>
Depois, pode ser que se inicie o processo contrário. É como se o universo decidisse engatar uma marcha-ré e entrasse num ritmo de contração.>
Com isso, todas as partículas passariam a ficar cada vez mais próximas, com uma elevação progressiva da densidade e do calor.>
Até chegar cada vez mais próximo daquele momento de singularidade, em que estava tudo bem comprimido, num estágio como aquele que, lá atrás, deu origem ao Big Bang.>
Alguns especialistas especulam que o universo vive nessa dinâmica de aceleração e desaceleração, como se a matéria e a energia se reciclassem em eras cósmicas que duram trilhões e trilhões de anos.>
Ou seja, o universo acabaria — só pra recomeçar de novo depois.>
"Mas esse é um modelo completamente exótico, para o qual não temos dados ou evidências", pondera o professor da USP.>
Mas será que é possível estimar quando o universo chegará ao fim?>
"Não, não temos nenhuma indicação de que vai acontecer uma grande ruptura ou um grande colapso em algum futuro", responde Abramo.>
"Algumas estimativas sobre esse fim falam em trilhões de anos, enquanto outras apostam em espaços de tempo ainda maiores", acrescenta Zabot.>
E vamos fazer uma conta simples aqui: se o universo tem pelo menos 13,8 bilhões de anos, ainda faltam 986,2 bilhões de anos para ele completar o seu primeiro trilionésimo aniversário.>
Um estudo recente feito na Universidade Radboud, na Holanda, sinalizou que esse fim pode estar um pouco mais próximo do que parecia — embora ainda esteja muito, mas muito, distante.>
Os novos cálculos pontuam que os últimos remanescentes estelares vão levar 10^78 anos (o numeral 1 seguido de 78 zeros) para perecer completamente.>
Anteriormente, acreditava-se que essa taxa era de 10^1100 (o numeral 1 seguido de 1.100 zeros).>
"Então o fim definitivo do universo chegará muito mais cedo do que o esperado, mas felizmente ainda levará muito tempo para acontecer", pontuou o radioastrônomo Heino Falcke, um dos autores do trabalho, em comunicado à imprensa.>
A questão é que (provavelmente) nossa espécie não estará aqui para testemunhar esse desenlace: o planeta Terra vai sumir do mapa muito antes disso, quando o Sol se transformar numa estrela vermelha gigante, daqui a uns 5 bilhões de anos.>
"A verdade é que a gente ainda sabe muito pouco em cosmologia", admite Abramo.>
O físico pontua que existe uma grande dificuldade em medir o universo com precisão apenas com as ferramentas disponíveis hoje.>
E isso abre a possibilidade de apostar em teorias ainda mais hipotéticas além das três citadas anteriormente: alguns especialistas, por exemplo, exploram o multiverso, ou a ideia de que há vários universos que surgiram em diferentes regiões do espaço e do tempo.>
Mas esse cenário está em constante transformação: as informações captadas por telescópios avançados, como o James Webb, permitem encaixar novas peças nesse quebra-cabeças.>
Outro avanço significativo é a capacidade de medir as ondas gravitacionais.>
As ferramentas capazes de fazer esse tipo de medição foram desenvolvidas pelos cientistas nos últimos anos.>
"E isso certamente vai trazer grandes revoluções para a cosmologia nos próximos anos", conclui Zabot.>
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