Publicado em 11 de junho de 2025 às 05:39
Em abril de 2010, Cathy Terkanian recebeu uma carta que mudou sua vida.>
Era do Departamento de Serviços Sociais da Virgínia (Estados Unidos), e ela, uma enfermeira aposentada que mora na Flórida, também nos EUA, estava esperando há muito tempo que eles entrassem em contato.>
"Fiquei atônita.">
Provavelmente era sobre a filha que ela havia entregado para adoção 36 anos antes, uma bebê que ela havia batizado de Alexis, e na qual nunca havia parado de pensar.>
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"Deixei todas as informações para entrar em contato comigo, e eles colocaram no arquivo fechado. Eu disse a eles: se minha filha aparecer procurando por mim, entreguem isso a ela.">
"Então, quando vi a carta, pensei imediatamente que iria encontrá-la.">
"Abri a carta, com todas as minhas esperanças e sonhos, e li que havia surgido um assunto muito importante, e que eles precisavam que eu ligasse para eles.">
"Liguei para eles imediatamente. Uma mulher me disse que um detetive havia aparecido no escritório deles, e queria meu DNA porque minha filha estava desaparecida, e um corpo havia sido encontrado em Racine, em Wisconsin, que era possivelmente o dela.">
Ela ficou abalada com a notícia.>
Cathy precisava saber mais, e não ia ficar de braços cruzados.>
Ela havia recebido pouquíssimas informações, a não ser que a filha havia desaparecido do lar adotivo em Michigan quando tinha 14 anos.>
Ela procurou informações na internet sobre meninas desaparecidas na região, e logo encontrou uma da cidade de Holland, cuja data de nascimento e descrição física correspondiam às de Alexis.>
"Seu nome adotivo era Aundria Michelle Bowman".>
A foto era de uma adolescente, difícil de reconhecer: "A última vez que a vi, ela era um bebê de 9 meses.">
"Levei horas para processar, e ver que se parecia comigo. Parecia comigo.">
"Foi um turbilhão de recordações".>
Recordações que a levaram ao início desta história, marcada por algumas coincidências: assim como a filha, Cathy também havia fugido de casa quando tinha 14 anos.>
"Sou fruto de um lar desfeito, e de todas as coisas ruins que o acompanham. Uma mãe que esteve em estado de bipolaridade durante toda a vida. Irmãos nascendo a torto e a direito: tenho sete meios-irmãos. Isso é o suficiente para te deixar louco.">
"Além disso, minha mãe foi abandonada com quatro filhos, e eu não soube disso até os 18 anos, mas o motivo foi porque ela disse àquele homem que eu era filha dele, e ele descobriu o contrário. Na cabeça dela, eu era a culpada.">
"Então fui embora. Pedi carona, e fui parar em Nova Orleans".>
Em meio ao movimento de contracultura da década de 1970, Cathy não era a única adolescente fugitiva no berço do jazz.>
Ela conheceu uma rede de jovens que se ajudavam mutuamente e, neste grupo, seu futuro parceiro: Randy Badger.>
Eles viviam e trabalhavam juntos em um espetáculo de circo.>
"Eu era a garota gorila.">
"Anos atrás, havia parques itinerantes, e alguém precisava de uma jovem que se transformasse em gorila e viajasse com o circo, então eu fiz isso.">
"É uma ilusão de ótica feita com vidro e luzes em uma caixa preta.">
"Era divertido, e o pai de Alexis estava comigo: ele era o gorila.">
"Paramos de fazer isso porque era um trabalho muito duro, e não pagavam quase nada, mas eu viajei por todo o sul e me diverti muito.">
Cathy e Randy se casaram com a permissão dos pais dela, já que era menor de idade, e alguns meses depois descobriram que estavam esperando um filho.>
"Então, lá estava eu, grávida aos 15 anos.">
"Ele não tinha interesse em ser pai — tinha apenas 19 anos. Não o forcei, mas ele estava casado comigo, e me amava.">
Em junho de 1974, Cathy deu à luz Alexis.>
O relacionamento com Randy logo se deteriorou, e Cathy não teve outra opção a não ser voltar para Virgínia.>
Após sua experiência como uma garota independente longe de casa, Cathy tinha certeza de que, com um pouco de apoio, poderia dar à filha uma vida melhor do que a que teve.>
Mas essa esperança ruiu assim que viu o desdém com que sua mãe a recebeu.>
"Quando entreguei minha bebê a ela, ela a pegou como se fosse roupa suja, e a inspecionou, em vez de abraçá-la.">
Cathy descobriu coisas que não sabia.>
"Eu não sabia que ela havia sido diagnosticada com câncer de mama, e que haviam dado a ela, no máximo, cinco anos de vida.">
"Seu marido estava no mar, e ela tinha três filhos em casa, todos com menos de 15 anos.">
"E minha irmã mais nova, que tem epilepsia crônica, estava em um lar para crianças que precisam de cuidados especiais, minha mãe simplesmente não tinha condições de oferecer isso a ela.">
"Então ela estava no limite.">
"Se eu soubesse, teria ficado em Nova Orleans.">
E não para por aí.>
"Eu não sabia que ela tinha ido a instituições de caridade católicas e tido uma longa conversa sobre como me separar da minha filha".>
Era o que Cathy menos queria, mas "desestruturar uma garota de 16 anos traumatizada é muito fácil".>
"Eles me diziam que eu não sabia o que estava fazendo, que não podia cuidar da minha bebê.">
"No final, escutei os adultos. Não deveria ter feito isso.">
Ela concordou em dar a bebê para adoção, e sua mãe cuidou da logística.>
"Nunca disse 'adeus' a ela. Foi como deixar que outra pessoa cuidasse dela por um tempo. Você nunca se separa dos filhos. Talvez fisicamente, mas psicologicamente, nunca me separei.">
Cathy saiu de casa logo depois. Mais tarde, estudou enfermagem e conheceu seu atual marido.>
Ela nunca mais teve filhos, nunca mais ouviu falar de Alexis, mas a imaginava "feliz, uma linda garotinha que se destacava em tudo o que queria fazer porque tinha bons pais que a apoiavam".>
Até que aquela carta chegou.>
Ela enviou sua amostra de DNA para análise, mas em vez de esperar pelos resultados, decidiu descobrir tudo o que podia sobre o que havia acontecido com a filha.>
"Descobri que Dennis e Brenda Bowman a adotaram quando ela tinha 16 meses, o que teria sido em 1975.">
Desesperada para saber mais, ela criou uma página no Facebook, assim como uma conta no Classmates.com em nome de Aundria, na esperança de encontrar amigas antigas da filha.>
Foi assim que ela conheceu Carl Koppelman, um contador que também é um detetive amador que trabalha como voluntário online e coopera com as autoridades.>
Ele analisa bancos de dados de pessoas desaparecidas e corpos não identificados, em busca de qualquer semelhança que possa servir de pista para a polícia em casos não resolvidos.>
"Ele foi o catalisador que deu início a todo o caso.">
"Foi ele quem desenvolveu a teoria de que o corpo encontrado em Racine poderia ser da minha filha, com base em uma foto do necrotério e várias outras coincidências.">
Juntos, eles investigaram todas as frentes: queriam saber não apenas se Alexis estava viva ou morta, mas também o que havia acontecido com ela.>
As amigas de escola que finalmente criaram coragem para conversar com eles, disseram que ela era "engraçada, doce, curiosa e brilhante", mas que em algum momento ela "se tornou obscura e cada vez menos visível na escola".>
Cathy também ficou sabendo de coisas sobre o pai adotivo da filha — coisas muito preocupantes.>
Dennis Bowman tinha antecedentes criminais.>
"Em 1980, ele atacou uma adolescente que estava de bicicleta. Ele a fechou com sua motocicleta, e ordenou que ela fosse para a floresta.">
"Ela não o obedeceu, ele sacou uma arma e começou a atirar nela.">
"A menina aproveitou a passagem de um caminhão para escapar e, ao chegar em casa, "chamaram a polícia. E o pegaram.">
Bowman foi condenado por agressão com intenção de cometer crime sexual, e recebeu uma pena de cinco a dez anos de prisão.>
Ele cumpriu a pena mínima, sendo solto quando Alexis tinha 11 anos.>
Em 1989, logo após o desaparecimento de Alexis, os Bowman se mudaram para uma cidade chamada Hamilton, em Michigan.>
Foi lá que Bowman cometeu o segundo crime registrado que Cathy encontrou.>
"Em 1998, ele invadiu a casa de uma colega de trabalho, foi preso por roubo e condenado a um ano de prisão.">
O advogado de Bowman apresentou cartas de apoio, incluindo uma dele na qual reconhecia "ter cometido erros no passado" e dizia ter duas filhas: uma de 11 anos e outra de 25.>
"Ele não mencionou nesta carta ao juiz que a menina estava desaparecida há mais de uma década.">
Quanto mais ela descobria, mais alarmada ficava.>
"Entrei em pânico: era grave, e não havia muito que eu pudesse fazer. A polícia não ia me ouvir. Eu não era a mãe dela. Não podia ligar para eles e dizer: 'Façam alguma coisa!'">
Desesperada, Cathy contratou um detetive particular que obteve o boletim de ocorrência de 11 de março de 1989, quando Dennis Bowman denunciou que a filha de 14 anos havia fugido.>
O registro dizia que ele voltou para casa do trabalho e descobriu que ela havia desaparecido, assim como alguns de seus pertences e US$ 100 do seu dinheiro.>
O boletim foi posteriormente atualizado para alterar o valor roubado para US$ 150, o suficiente para a polícia listar Bowman como vítima, e emitir um mandado de prisão para Alexis.>
Mas este não foi o primeiro registro nos arquivos da polícia.>
Quatro meses antes, a polícia havia investigado acusações de abuso na casa de Bowman.>
O relatório não incluía detalhes — a denúncia foi considerada falsa, e nenhuma ação adicional foi tomada.>
Para Cathy, isso disparou ainda mais o alerta.>
E então, três anos depois de ela ter enviado a amostra, os resultados do teste de DNA chegaram, dizendo que o corpo não era de Alexis.>
"Fiquei aliviada. Tinha esperança de encontrá-la.">
No entanto, Cathy sabia que, apesar das informações, tudo indicava que Alexis estava morta — e que seu pai adotivo a havia matado.>
Mas a polícia não podia ajudá-la.>
Ela decidiu então tomar uma atitude por conta própria, e comprou um espaço publicitário em um outdoor perto da casa de Bowman.>
"É uma área rural, então, ao passar de carro, ele, sua esposa, sua filha — quem quer que estivesse dirigindo na estrada — iria ver.">
"No outdoor, ofereci uma recompensa de US$ 11 mil por informações que levassem a uma prisão, porque eu estava convencida de que ele a havia matado.">
E apesar de todas as evidências que ela tinha serem, na melhor das hipóteses, circunstanciais, Cathy o acusou diretamente nas redes sociais de assassinar sua filha.>
"Nos EUA, eu posso te acusar de matar alguém, e você tem que provar que não foi você.">
"A maioria das pessoas procura um advogado para se defender contra difamação. Mas o acusado precisa prestar depoimento.">
"Eu estava pressionando porque ele nunca havia feito nenhuma declaração juridicamente vinculativa sobre o que aconteceu.">
Além de estar convencida da culpa de Bowman, Cathy tinha uma certeza inexplicável sobre a localização dos restos mortais da filha.>
Após anos analisando mapas do Google e imagens de satélite, ela localizou uma laje de concreto nos fundos da propriedade de Bowman, e tinha certeza de que ele havia enterrado Alexis ali.>
Era uma constatação estranha, visto que os Bowman não moravam lá quando ela desapareceu.>
"O que me deixou desconfiada foi ver, nas imagens do Google, mudanças no quintal daquela casa.">
É claro que sua conjectura não era suficiente para obter um mandado judicial.>
"Eu me sentia terrivelmente impotente.">
Ela havia passado nove anos em uma busca aparentemente infrutífera, mas continuava determinada a não deixar que fosse em vão.>
Em 2019, Bowman foi preso pelo estupro e assassinato de uma jovem chamada Kathleen Doyle em 1980.>
"Fiquei aliviada por ele não estar mais nas ruas. Fiquei triste por não ser minha filha, porque eu estava em busca da verdade, mas pelo menos a verdade sobre esse outro assassinato seria revelada.">
Três meses depois, chegou finalmente o momento que ela tanto esperava.>
Cathy diz que, como enfermeira, foi treinada para fazer estudos de caso e, depois de todos esses anos, uma coisa que ela sabia sobre Dennis e Brenda Bowman era que "o que eles mais queriam era ficar juntos".>
"Falei com a polícia, e eles disseram a Bowman que, se ele revelasse o que fez com Alexis, poderia ficar em Michigan.">
Funcionou: ele admitiu que a havia matado, e que o corpo dela estava enterrado nos fundos do quintal.>
Após 10 anos de busca pela verdade, Cathy conseguiu arrancar uma confissão, que infelizmente confirmou a morte de Alexis.>
No início de 2020, a polícia e uma equipe forense escavaram o quintal, encontraram restos mortais e novamente solicitaram o DNA de Cathy.>
"Desta vez, foi rápido. Em uma semana, soube que eram da minha filha.">
Bowman sempre negou ter assassinado Alexis.>
Ela alegou que foi um acidente, que ele deu um tapa nela e que, quando ela caiu, quebrou o pescoço.>
Ele explicou que desmembrou o corpo para colocá-lo em um contêiner e, quando mudou de casa, o levou e enterrou no quintal.>
Ele foi condenado a duas sentenças de prisão perpétua pelo assassinato de Kathleen Doyle. E recebeu uma pena adicional de 35 a 50 anos pelo que fez com Alexis.>
E o que ele fez foi roubar o futuro dela e condená-la ao esquecimento.>
Mas sua mãe sempre se lembrou dela e, desafiando todas as probabilidades, finalmente a encontrou.>
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