> >
Usar a camisa canarinho vira dilema após protestos

Usar a camisa canarinho vira dilema após protestos

Em plena Copa, torcedores hesitam em usar a camisa do Brasil para não serem associados aos protestos contra Dilma

Publicado em 16 de junho de 2018 às 00:17

Ícone - Tempo de Leitura 0min de leitura
Mirella Müller, 25 anos, geógrafa, prefere não usar camisa do Brasil na Copa. (Marcelo Prest)

Com o uso em massa do verde e amarelo durante os protestos pelo impeachment da presidente Dilma em 2015 e 2016, a camisa da Seleção Brasileira ganhou uma forte carga política, sendo tida, a partir de então, como um dos principais símbolos de um dos espectros políticos.

Agora, com o início da Copa do Mundo, torcedores que não eram favoráveis à saída da petista ainda hesitam em vestir a tradicional camisa da CBF, ou passaram a buscar alternativas para torcer.

A geógrafa Mirella Müller, de 25 anos, é uma das que diz não se sentir mais à vontade para vestir as cores da Seleção. Contrária à saída da presidente, ela considera que o ícone ficou muito atrelado à direita, inclusive por setores que defendem a intervenção militar.

"A camisa verde e amarela ainda carrega esta história com ela. E ainda há o símbolo da CBF, também marcada por vários escândalos de corrupção, assim como a nossa política. Não faço questão de usar as cores do Brasil, e também não vou participar das festividades. Ainda me sinto muito desesperançosa com o que temos visto no país", afirmou.

Com o uso político dado à amarelinha, já surgiram iniciativas em todo país, por pessoas mais identificadas com a esquerda, de lançar uma versão vermelha da camisa do Brasil. A CBF chegou a fazer uma notificação extrajudicial para que sua logomarca não fosse colocada na peça. Por isso, os militantes fizeram uma estampa com a CBD, que era a Confederação Brasileira de Desportos, anterior à CBF.

Pessoas que se identificam com a esquerda confeccionaram versão vermelha da camisa da seleção brasileira. (Marcelo Pereira)

Andressa Dalla Bernardina, dona de uma estamparia do Estado, já foi procurada para confeccionar mais de 20 camisas, vendidas a R$ 35 cada.

O jornalista Marcelo Pereira, de 41 anos, foi um dos que optou por essa nova versão. "Gosto da Seleção, curto futebol. Achava contraditórias as manifestações contra a corrupção com a camisa da CBF, uma organização que, depois, se provou cheia de escândalos. Por isso, personalizamos nossa camisa para não deixar de torcer", conta.

SIMBOLOGIA

Para o professor da USP Ary José Rocco Júnior, que estuda a relação entre Comunicação e Esporte, é preciso admitir que a camisa tenha perdido um pouco de sua identidade graças à política, mas historicamente a Seleção tem a capacidade de unir as pessoas.

"Como o país está rachado, pessoas passaram a ter uma implicância maior com as cores do Brasil. Quando o time entrar em campo, e se tiver resultados positivos, o clima da Copa se instalará mais, e pode voltar a aflorar um pouco o sentimento nacionalista", comenta.

Ele destaca que a maioria das outras Copas do Mundo também estiveram sob influência da atividade política. Na Copa de 1970, muita gente envolvida na luta contra a ditadura disse que não iria acompanhar a Copa porque a Seleção era usada pelo regime. "Já em 1982, as cores do Brasil tinham um caráter de reconciliação nacional, da transição da ditadura para a democracia", lembra.

Atual opção, vendas da camisa azul crescem

Adriano Figueiredo, de 39 anos, contador, acredita que questões políticas devem ser deixadas de lado na Copa. (Marcelo Prest)

Enquanto alguns torcedores vão evitar usar as cores da Seleção Brasileira por motivos políticos, há outra parcela de pessoas que defendem que este deve ser um momento de “trégua” e que é necessário relevar o fato do verde e amarelo ter sido associado a um “lado político”.

O contador Adriano Figueiredo é um dos que não costuma usar a camisa da CBF, mas faz questão de usar as cores da bandeira.

"Você pode não gostar da camisa da Seleção porque tem o escudo da CBF, que é corrupta, mas as cores dela são de todos nós. É um torneio mundial, e temos que manifestar nossa cultura", disse.

A camisa amarela não foi totalmente descartada, mas sua conotação política pode ser uma das explicações para que mais gente esteja preferindo comprar a versão azul da camisa. De acordo com a revista Exame, o uniforme azul representa até o momento cerca de 30% do total vendido pela loja virtual Netshoes. Em 2014, a parcela era de apenas 10%.

Os debates sobre o uso do verde e amarelo para torcer pelo Brasil também fizeram com que dois pré-candidatos à Presidência, que são do campo da esquerda, saíssem em defesa do uniforme da Seleção.

Ciro Gomes (PDT) falou no assunto em seu Twitter: "Tudo bem, usaram a camisa da nossa Seleção para coisa muito desonesta. Vamos torcer! Futebol é futebol, política é política. Quem mistura é que está errado".

Este vídeo pode te interessar

Manuela D’Ávila (PCdoB) também se manifestou. "Não vamos deixar que a elite destrua tudo o que o povo gosta. Futebol é a cara do nosso povo", afirmou.

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais