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Publicado em 17 de dezembro de 2021 às 10:50
A abertura do processo de impeachment do prefeito Daniel Santana Barbosa, conhecido como Daniel da Açaí, (sem partido) gerou questionamentos a respeito da condução política de São Mateus, no Norte do Espírito Santo. Especialistas ouvidos por A Gazeta afirmam que o processo pode durar até 90 dias e, caso o prefeito seja cassado, não haveria uma nova eleição na cidade. >
Daniel da Açaí já está afastado do cargo por determinação do Tribunal Regional Eleitoral da 2ª Região (TRF-2). A medida foi tomada após o prefeito ser preso na Operação Minucius, da Polícia Federal, suspeito de chefiar um esquema criminoso de desvio de recursos da prefeitura, alguns deles federais, enviados para o combate à pandemia de Covid-19. Com o afastamento, o vice-prefeito Ailton Caffeu (Cidadania) tomou posse na Câmara Municipal e assumiu o cargo interinamente.>
A Casa acatou o pedido para abertura de processo de impeachment contra Barbosa no dia 26 de outubro. Foram duas denúncias feitas por cidadãos do município. O presidente da Câmara, Paulo Fundão (PP), entendeu que ambas possuíam o mesmo conteúdo. A primeira foi acatada e a segunda foi enviada para posicionamento da Procuradoria.>
Com a admissão e o processo aberto, foi definida a Comissão Processante, composta pelos vereadores escolhidos por sorteio Carlinho Simião (Podemos), presidente; Cristiano Balanga (Pros), relator; e Gilton Gomes (PSDB), membro. >
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Nesta sexta-feira, dia 17 de dezembro, a Comissão Processante decide pelo prosseguimento ou arquivamento do processo de impeachment contra o prefeito Daniel Santana. O relator do caso, Cristiano Balanga (Pros), teve prazo de cinco dias a partir do dia 8 de dezembro para concluir o relatório com o parecer das denúncias e apresentá-lo para a Comissão que vota o seguimento do inquérito.>
Segundo o Presidente da Comissão Processante, Carlinho Simeão (Podemos), o prefeito já apresentou a sua defesa, e agora, com o fim do prazo de cinco dias para a conclusão do relatório, o Legislativo decide se aprova o prosseguimento do processo. Após isso, o impeachment ainda vai para votação no Plenário, que dará a palavra final.>
O advogado eleitoralista Hélio Maldonado, mestre em Direito Constitucional, explica que o impeachment municipal tem uma regulamentação feita pelo Decreto Lei nº 201, de 1967. Nele, há a previsão das infrações político-administrativas, que seriam uma espécie de crimes funcionais praticados no exercício do mandato e que podem ocasionar sanção política de perda de mandato.>
"Esse decreto também estabelece o procedimento. Uma vez apresentada a denúncia, que tem de ser formalizada por um cidadão, ela é lida na sessão. Uma vez recebida, é instalada uma Comissão Processante composta por três vereadores respeitando a proporcionalidade partidária; não pode ter só um partido. Na sequência, o prefeito é citado para se defender em 10 dias, com a apresentação de provas ou produção de provas testemunhal", evidencia Maldonado.>
O advogado especialista em direito público, Sandro Câmara, salienta que, ao aceitar o processo de impeachment, o prefeito é retirado automaticamente das funções, respondendo às denúncias fora do cargo. No caso de Daniel da Açaí, isso não ocorre, pois já havia sido afastado pelo TRF-2, e o vice Caffeu assumiu o município interinamente. >
Nesse período de dez dias para se defender, o prefeito tem de apresentar, por escrito, sua defesa, indicando as provas e escolhendo as testemunhas. Após esse procedimento, a comissão tem cinco dias para emitir um parecer, decidindo pelo prosseguimento ou arquivamento da denúncia. >
"Suponhamos que essa denúncia prossiga, o processo toma uma nova fase. O presidente da comissão designa uma audiência para ouvir as testemunhas e o próprio denunciado que, a rigor, falará por último", afirma o especialista.>
"Concluída a fase de instrução, de ouvir as testemunhas e o próprio denunciado, não havendo mais provas a serem produzidas, o denunciado terá o prazo de cinco dias para apresentar suas alegações finais, antes que vá para julgamento. Feito isso, vai a plenário, para que os vereadores se manifestem, principalmente o denunciado, inclusive através de advogado, em um prazo de até duas horas, para produzir sua defesa oral", completa.>
Caso dois terços da Câmara proclame o impeachment, Daniel Santana Barbosa perde o cargo e o vice assume como prefeito definitivamente. O especialista em direito eleitoral, professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral Político (Abradep), Marcelo Weick Pogliese, entende que os munícipes não voltariam às urnas ao fim do processo, que pode durar até 90 dias.>
"Se houver a cassação dele, em definitivo, na prática esse pedido de afastamento judicial de forma cautelar, é uma provisória, perde o objeto, então não tem mais razão de existir, aí o vice é empossado em definitivo, vai virar o prefeito", explica. >
"A decisão do juiz que afasta é cautelar, é provisória. Quando houver, lá na frente, a cassação, em definitivo, ele perde o mandado, está fora", completa.>
Para Pogliese, caso a cassação seja aprovada na Câmara, não haveria razão para o pedido de afastamento feito pelo tribunal continuar tramitando. Na avaliação de Sandro Câmara, o vice tomaria posse, seguindo as orientações da Constituição Federal. Já Hélio Maldonado evidencia que a Lei Orgânica de São Mateus prevê o mesmo e não uma nova eleição.>
Os especialistas ainda sustentam que, com a cassação, o prefeito também pode perder os direitos políticos. Sandro Câmara entende que há essa previsão imposta em decorrência da cassação na Câmara.>
"O processo de cassação da Câmara impõe a ele a suspensão dos direitos políticos pelo prazo de cinco anos, para o exercício de qualquer função pública, inclusive tornando-o inelegível nesse período. Isso está no decreto nº 201, que regulamenta os crimes de responsabilidade aplicáveis ao prefeito", explica. >
Na mesma linha, Hélio Maldonado afirma que a consequência imediata da cassação pela Câmara é a sanção política de perda do mandato. "De maneira reflexa, ele fica inelegível por oito anos após isso, segundo a previsão da Lei da Ficha Limpa", frisa.>
Já Marcelo Weick Pogliese relembra o impeachment da ex-presidente Dilma Roussef (PT), quando o ministro Ricardo Lewandowski desmembrou o processo e fez duas votações, uma para o afastamento definitivo e a outra para aplicar ou não aplicar a inelegibilidade de oito anos.>
"Na prática, se a gente for seguir a orientação que foi dada do Supremo Tribunal Federal (STF), isso também teria que acontecer no âmbito da Câmara dos Vereadores, ou seja, duas votações", aponta. Pogliese afirma que, se a Casa decidir por uma única votação, tem que deixar claro que são necessários dois terços para aplicar tanto o afastamento quanto a inelegibilidade. >
Além da perda dos direitos políticos, Daniel Santana Barbosa ainda pode ver sua situação mudar na Justiça: "Ele deixa de ter o foro privilegiado como prefeito, de ser julgado pelo TRF e não pelo juiz de primeiro grau, em caso de crime. O que pode ocorrer é o processo do TRF descer para a Justiça Federal, porque ele perde o foro em razão da sua cassação", explica Sandro Câmara. >
Maldonado ratifica que, após Daniel perder o mandato, também deixa de ter prerrogativa na ação penal no TRF-2, assim como Pogliese, que finaliza: "Não continua no TRF porque, quando se perde o mandato, o processo desce para a primeira instância. Se houver um recurso, ele tem de recorrer ao tribunal ao qual está vinculado o juiz federal.">
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