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Ascensão e queda de Sergio Moro: de super-herói a "juiz suspeito"

Ascensão e queda de Sergio Moro: de super-herói a "juiz suspeito"

O  ex-juiz, responsável por condenar diversos políticos e empresários na Lava Jato, chegou a ser cotado para uma vaga no Supremo, mas foi considerado parcial pelo próprio STF

Publicado em 10 de março de 2021 às 02:00- Atualizado há 3 anos

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Ex-ministro da Justiça Sergio Moro
O ex-juiz Sergio Moro enfrenta um momento crítico em sua trajetória. (Pedro Ladeira/Folhapress)
Autor - Iara Diniz
Iara Diniz
Repórter de Política / [email protected]

O ex-juiz Sergio Moro ganhou projeção nacional pela atuação exclusiva na Operação Lava Jato. À frente da 13ª Vara de Curitiba, foi responsável por condenar grandes empresários e políticos brasileiros envolvidos em escândalos de corrupção, entre eles o ex-presidente Lula. Moro se tornou uma espécie de herói nacional e a capital paranaense, de onde despachava decisões, foi apelidada de "República de Curitiba".

Gozando de alto capital político, Moro abandonou a magistratura em 2019 para se tornar ministro da Justiça de Jair Bolsonaro (então filiado ao PSL). A decisão levantou questionamentos sobre a imparcialidade do magistrado na condução da Lava Jato, já que inimigos políticos de Bolsonaro foram condenados.  

Mas o casamento com o governo não durou muito tempo. Após 16 meses como ministro, Moro pediu demissão do cargo, acusando o presidente de interferência na Polícia Federal. As denúncias levaram o STF a abrir um inquérito, mas não tiveram grande impacto no Palácio do Planalto. Na verdade, quem, desde então, tem sofrido um grande desgaste de imagem é Sergio Moro.

O ex-juiz, que um dia chegou a ser cotado para uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF), sofreu um revés na própria Corte. Nesta terça-feira (23), a Segunda Turma do STF retomou o julgamento do pedido de suspeição de Moro no processo em que o ex-presidente Lula (PT) foi condenado no caso do triplex do Guarujá (SP). Por três votos a 2, a Turma decidiu que o ex-juiz foi parcial, prejudicando o petista irregularmente.

Confira os principais momentos desde a ascensão à queda de Sergio Moro:

JUIZ DA LAVA JATO

Procurador Deltan Dallagnol e o ministro Sergio Moro
Deltan Dallagnol, procurador responsável pela força-tarefa, e o ex-juiz Sergio Moro. (Divulgação)

Sergio Moro começou a ser conhecido nacionalmente em 2014, com o início da Operação Lava Jato, que revelou um grande esquema de corrupção e lavagem de dinheiro entre empreiteiros, políticos e ex-dirigentes da Petrobras. À frente da 13ª Vara de Curitiba, foi o responsável pela condenação em primeira instância de nomes importantes, como os ex-ministros José Dirceu e Antônio Palocci e também o ex-presidente Lula. 

Com o desdobramento da Operação em várias fases, Moro passou a atuar exclusivamente nos casos da força-tarefa, ficando famoso como o "juiz da Lava Jato".

SUPER-MORO, HERÓI NACIONAL

Boneco inflável de Sergio Moro como super-herói ganhou as ruas durante manifestações
Boneco inflável de Sergio Moro como super-herói ganhou as ruas durante manifestações . (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

O protagonismo de Moro na Lava Jato deu a ele o status de um super-juiz. Não demorou muito para que a imagem do magistrado ganhasse as ruas em manifestações. Moro inspirou um boneco inflável vestido de super-herói, e virou símbolo dos protestos pelo Brasil contra a corrupção. 

O boneco foi usado em manifestações que pediam o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016, e também em manifestações a favor de Bolsonaro, em Brasília, quando o presidente e o ex-juiz ainda eram aliados. 

VAZAMENTO DO GRAMPO TELEFÔNICO DE LULA E DILMA

Em março de 2016, Moro quebrou o sigilo e divulgou uma ligação telefônica grampeada entre o ex-presidente Lula e a então presidente Dilma Rousseff. Na conversa, a chefe do Executivo federal sugeria uma manobra para tornar Lula ministro e evitar que ele fosse preso.

O vazamento do diálogo insuflou a população, que já realizava protestos contra o PT, e impactou a crise vivida pelo governo. Meses depois, Dilma sofreu impeachment.

Moro negou que tenha agido por motivação política, mas depois pediu desculpas ao Supremo. A legalidade do grampo das ligações foi questionada na época.

CONDENAÇÃO DE LULA

Moro em julgamento de Lula: condenação do ex-presidente contribuiu para eleição de Bolsonaro em 2018
Moro em julgamento de Lula: presidente foi condenado em 2017. (Reprodução)

Em julho de 2017, o juiz Sergio Moro condenou a nove anos e meio de prisão o ex-presidente Lula por corrupção passiva e lavagem de dinheiro pelo caso do triplex do Guarujá. Lula e a esposa, Marisa Letícia, teriam sido beneficiados com um apartamento para favorecer contratos da empreiteira OAS. 

A condenação de Lula foi confirmada em segunda instância e o ex-presidente foi preso em abril de 2018, após se entregar na sede da Polícia Federal em Curitiba. Por causa disso, ele não pôde concorrer às eleições para presidente daquele ano. Foi barrado pela Lei da Ficha Limpa.

Lula ficou preso por 580 dias e foi solto em novembro de 2019, após o STF autorizar presos condenados em segunda instância a recorrerem em liberdade.

DIVULGAÇÃO DA DELAÇÃO DE PALOCCI 

A menos de uma semana do primeiro turno das eleições de 2018, Sergio Moro divulgou trechos da delação premiada do ex-ministro do PT Antonio Palocci, feita em abril daquele ano. No depoimento, Palocci afirmava que Lula sabia de todo o esquema de corrupção na Petrobras, e denunciava um suposto esquema de arrecadação de propinas na construção de navios-sonda.

A divulgação da delação em um período tão próximo da eleição foi um revés na campanha de Fernando Haddad (PT), que concorria para presidente da República. A atitude de Moro foi criticada e o ex-juiz foi acusado pelo PT de agir com fins políticos. 

MINISTRO DE BOLSONARO

O ministro Sergio Moro e o presidente Jair Bolsonaro
O ministro Sergio Moro e o presidente Jair Bolsonaro . (Marcos Corrêa/PR)

Menos de um mês após Bolsonaro ser eleito presidente, Moro foi convidado para compor a equipe do governo e ser ministro da Justiça e Segurança Pública. O então juiz aceitou o convite, o que levantou questionamentos sobre os interesses políticos de Moro e a imparcialidade dele em decisões da Lava Jato, principalmente a que levou à prisão de Lula e o impediu de disputar as eleições.

Moro abandonou a magistratura e integrou a equipe de Bolsonaro com a perspectiva de implementar uma forte agenda de anticorrupção. Dentro do governo, chegou a ser cotado para assumir a vaga que seria deixada pelo ministro Celso de Mello no STF, mas rompeu com Bolsonaro antes que isso acontecesse.

CRISE NO GOVERNO

Apesar de Bolsonaro ter afirmado que Moro teria carta branca no governo, isso não aconteceu. Logo no início de 2019, o então ministro teve de recuar na nomeação da cientista política Ilona Szabó para o Conselho Nacional de Política Criminal Penitenciária. A cientista política era considerada "esquerdista demais" por Bolsonaro.

O projeto anticorrupção também ficou em segundo plano. O pacote anticrime, elaborado por Moro, por exemplo, despertou pouco interesse do presidente. A proposta foi aprovada na Câmara com modificações que não agradaram o ministro, como a implementação do juiz de garantias. Bolsonaro, contudo, sancionou o pacote sem veto.

A transferência do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) da guarda de Moro para o Banco Central também acirrou os conflitos, assim como os episódios que envolveram uma tentativa de troca do comando da Polícia Federal do Rio de Janeiro por parte de Bolsonaro, sem o apoio do ex-ministro. 

PEDIDO DE DEMISSÃO

O então ministro da Justiça, Sergio Moro, no dia em que anunciou sua demissão do governo Bolsonaro
O então ministro da Justiça, Sergio Moro, no dia em que anunciou sua demissão do governo Bolsonaro. (Marcello Casal JrAgência Brasil)

Em pronunciamento no dia 24 de abril, Sergio Moro informou que deixava o cargo de ministro da Justiça do governo Jair Bolsonaro. A decisão foi tomada, segundo o ex-juiz, após o presidente não fornecer uma justificativa para demitir o diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo.

Em seu discurso, Moro acusou Bolsonaro de tentar interferir no trabalho da PF e afirmou que o presidente queria ter uma pessoa para quem pudesse ligar para colher informações e relatórios de inteligência. Ele também acusou o chefe do Executivo de fraude, alegando que não assinou a exoneração de Valeixo.

As declarações, contudo, não causaram grande impacto no governo. Bolsonaro negou as acusações e disse que Moro era movido pelo ego. O STF abriu inquérito para investigar o caso, que tem como relator o ministro Alexandre de Moraes.

CANDIDATO À PRESIDÊNCIA

Outdoor no muro do estádio Kleber Andrade, em Cariacica, em apoio à Lava Jato estava na rota do ministro Sergio Moro
Outdoor no muro do estádio Kleber Andrade, em Cariacica, em apoio à Lava Jato estava na rota do ministro Sergio Moro. (Fernando Madeira)

Logo após a saída do governo, Moro recebeu sondagens de diversas legendas, como Podemos e Novo, para se filiar. Ainda gozando de capital político e tendo a imagem atrelada ao enfrentamento à corrupção, passou a ser apontado como um nome para fugir  dos extremos políticos nas próximas eleições. 

Os movimentos de Moro sinalizaram a possibilidade de uma candidatura. Ele se reuniu com o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), e o apresentador de TV Luciano Huck para tratar de uma aliança para fazer frente a Bolsonaro em 2022. Contudo, o nome de Moro vem perdendo força com as recentes derrotas da Lava Jato no STF e há dúvidas se ele conseguirá manter o capital político até o ano que vem. 

SUSPEIÇÃO - O JULGAMENTO NO STF

No dia 08 de março, o ministro Edson Fachin surpreendeu a todos ao dar uma decisão monocrática que anulou as condenações contra o ex-presidente Lula referentes ao triplex de Guarujá, ao sítio de Atibaia e duas ações a respeito do Instituto Lula. Fachin decidiu que a 13ª Vara Federal de Curitiba não tinha competência para julgar Lula e remeteu o caso para a Justiça do Distrito Federal.

A decisão devolveu os direitos políticos ao ex-presidente, que não pôde concorrer às eleições de 2018, e representou uma derrota para Sergio Moro. A atitude de Fachin, contudo, foi vista como uma forma de preservar a Lava Jato, já que, ao decidir pela anulação das condenações, o ministro declarou a perda de objeto do habeas corpus em que a defesa de Lula pedia a declaração de suspeição de Moro no caso do triplex do Guarujá. A ideia é que isso nem fosse a julgamento.

Mesmo assim, o presidente da Segunda Turma, Gilmar Mendes, pautou o habeas corpus.

Moro foi declarado suspeito, isso quer dizer que ele foi parcial como juiz, escolhendo previamente "um lado", no caso, o da acusação contra Lula. É uma derrota política para o ex-magistrado.

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