Publicado em 13 de abril de 2020 às 06:00
A restrição à aglomeração e à circulação de pessoas, medida necessária para conter o avanço do novo coronavírus, tem efeito colateral sobre a economia e, principalmente, os trabalhadores informais. Um pipoqueiro, por exemplo, conta com o vaivém de possíveis clientes para garantir as vendas. >
O auxílio emergencial de R$ 600 fornecido pelo governo federal está em vigor, com foco justamente nos informais. "Antes tarde do que nunca", frisa Naercio Menezes Filho, professor titular da Cátedra Ruth Cardoso no Insper e professor associado da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP).>
Defensor de medidas como essa, que possam impedir uma tragédia social, o economista é a favor do distanciamento social.>
"Essas medidas de distanciamento são necessárias no momento, se não as mortes vão aumentar e isso também vai ser ruim para a economia", destaca.>
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Ele prevê que, sem medidas adequadas, o número de desempregados no país seria de cerca de 25 milhões. Em dezembro de 2019 eram 11,6 milhões os brasileiros sem emprego.>
"Essa estimativa eu fiz antes da adoção de medidas como a possibilidade de suspensão do contrato de trabalho, a redução dos salários e o aumento do custo de demissão no setor formal. A projeção era se nada disso acontecesse. Agora vai ter aumento de desemprego, mas não vai chegar a 25% da população economicamente ativa", avalia.>
É a taxa de desemprego projetada se medidas não fossem adotadas
A economia está parcialmente parada em vários Estados. No Espírito Santo o comércio, com exceção de supermercados, lojas de chocolate, de materiais de construção, concessionárias, restaurantes e farmácias, estão fechados. É possível projetar o quanto se perde com isso? Se durar três meses, por exemplo? >
Há especulações. Tem uma grande parcela de trabalhadores que não têm carteira assinada, trabalham por conta própria e dependem da movimentação de pessoas na rua e da venda de serviços. Lojas, bares. Essas medidas de distanciamento são necessárias no momento senão as mortes vão aumentar e isso também vai ser ruim para a economia. >
Pequenos negócios e trabalhadores informais não têm poupança, não têm como se sustentar se não venderem seus produtos. Se se prolongar por três meses, o desemprego poderia chegar a 25 milhões. Se não houvesse medidas como a de ontem (anunciada nesta terça-feira) de transferência de renda, haveria um caos social, não teriam como comprar alimentos e material de higiene. O auxílio de 600 ajuda. >
Naercio Menezes Filho
Professor titular da Cátedra Ruth Cardoso no InsperO auxílio emergencial, de R$ 600, com cadastro via aplicativo e site, será pago, inicialmente, durante três meses. Será suficiente esse período?>
Depende de quanto tempo o distanciamento social vai durar. Mas ajuda. Mesmo quem está no Bolsa Família vai poder receber, vão poder comprar coisas, sustenta um pouco dos empregos.>
Todo mundo que está no CadÚnico vai poder receber. Quase metade da população vai receber esse beneficio, o que vai ajudar a frear até a recessão.>
O governo demorou a adotar essa medida? Essa é uma crítica que tem sido feita.>
Demorou, ainda não chegou às pessoas, que estão no limite.>
As pessoas já estão relatando problemas com alimentação. As escolas estão fechadas, as crianças se alimentavam nas creches e pré-escolas isso é um peso a mais para as famílias.>
Deveriam ter soltado logo pelo menos para as pessoas do Bolsa Família, que já são cadastradas. A crise já está aí há um mês, poderiam ter tomado medidas antes, mas antes tarde do que nunca.>
Naercio Menezes Filho
Professor titular da Cátedra Ruth Cardoso no InsperE a forma de disponibilizar o auxílio, via cadastro por meio de aplicativo e site, foi a mais adequada? >
A mais adequada. Não se podeira pedir para as pessoas irem aos CRAS (Centros de Referência de Assistência Social) por causa do contágio. Tem que evitar que elas se aglomerem.>
Com o aplicativo vai ter problema, pessoas que não sabem usar vão ter que pedir ajuda, mas elas vão conseguir alguém para ajudá-las. Só têm que tomar cuidado com aplicativos falsos, golpes. E o governo também, para evitar fraudes, com cadastramento de dados de pessoas mortas, por exemplo. Mas foi a melhor maneira.>
Que comparativo podemos fazer com a greve dos caminhoneiros? >
Durou dez dias e o PIB tem estimativas de que diminuiu um ponto percentual. Uma crise que pode durar três meses vai ter impacto forte. Queda de 5% por cento ou mais no PIB. Vai até o fim do ano. A situação é muito crítica e precisamos de toda a ajuda.>
A Câmara deve votar em breve o Plano Mansueto, possivelmente com alterações. A ideia original era ajudar os Estados, mas agora os Estados pedem uma ajuda redobrada. Até que ponto isso pode ser realmente bom? Nem todos os problemas econômicos surgiram com a pandemia.>
Os Estados vão gastar com assistência social, saúde, hospitais e precisam de ajuda para cuidar dos doentes.>
Mas não se pode emprestar dinheiro aos Estados a torto e a direito, tem que manter separado o orçamento para combater a pandemia, mas não se pode revogar toda a legislação que garante sustentabilidade às finanças estaduais.>
Ou vai ter crises nos Estados daqui para frente. Tem-se que evitar contratação excessiva de servidores aproveitando o momento.>
E o que os Estados podem fazer para estimular a economia? Há alguma margem para agir? No Espírito Santo, o governo oferece empréstimos a juros baixos ou zero e suspendeu alguns pagamentos para pequenas empresas, como a parte do Simples que cabe ao Estado.>
Essas medidas são bem-vindas porque a situação vai ficar muito difícil para todos. Empresas não têm caixa para sobreviver um mês pagando todos os impostos, taxas etc.>
Essas empresas têm capital investido, têm negócios novos ou têm um papel social e devem ser preservadas.>
É um choque externo, não é devido a má gestão dos empresários. O governo deve realmente ajudar as pessoas em momento difícil.>
Mas não pode haver brecha para aumentar salários, começar a contratar várias pessoas, isso não pode. Manter o quadro atual e usar o dinheiro vai para ajudar quem precisa.>
Falamos aqui do papel do governo federal e dos Estados, mas tem também os municípios.>
São bastante afetados. ISS, IPTU. Grande parte das pessoas não vai conseguir pagar e vai ter impacto. Novamente vão precisar de ajuda do governo federal para manter serviços em educação e saúde.>
Vai ter que ter um pacote de ajuda para os municípios específico para a crise e com cuidado, digo mais uma vez, para que o dinheiro não seja desviado para outras rubricas ainda mais em ano eleitoral, em que os municípios estão loucos para fazer obras que às vezes nem têm finalidade prioritária.>
O dinheiro é necessário, mas tem que ser usado onde precisa.>
Naercio Menezes Filho
Professor titular da Cátedra Ruth Cardoso no InsperA arrecadação federal também deve diminuir com tudo isso. De onde o governo vai tirar dinheiro para ajudar empresas, informais, Estados, municípios?>
O governo federal vai ter que emitir dívida ou imprimir dinheiro. É melhor a dívida. Mas no futuro alguém vai ter que pagar essa conta.>
Deve-se aumentar impostos sobre os mais ricos. Uma alíquota de Imposto de Renda adicional para as pessoas mais ricas, por exemplo, taxar dividendos. Os Estados podem aumentar o imposto sobre herança. Ajudaria no longo prazo a pagar essa dívida.>
As classes mais privilegiadas é que vão ter que pagar a maior parte.>
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